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Informativo STJ 686 Comentado


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Sumário

Sumário.. 1

DIREITO ADMINISTRATIVO… 3

1.      (Im)Possibilidade de acordo de não persecução penal em fase recursal de ação de improbidade administrativa. 3

1.1.        Situação FÁTICA. 3

1.2.        Análise ESTRATÉGICA. 3

2.      (Im)Possibilidade do Procurador da Fazenda Nacional que emitiu a CDA atuar como representante da PFN na mesma execução.. 5

2.1.        Situação FÁTICA. 5

2.2.        Análise ESTRATÉGICA. 6

DIREITO CIVIL. 8

3.      (Im)Possibilidade de repasse dos custos dos boletos pelas distribuidoras às farmácias. 8

3.1.        Situação FÁTICA. 8

3.2.        Análise ESTRATÉGICA. 8

4.      Extinção contratual e opção pelo cumprimento forçado ou rompimento do contrato.. 10

4.1.        Situação FÁTICA. 10

4.2.        Análise ESTRATÉGICA. 11

DIREITO BANCÁRIO E CIVIL. 12

5.      Reconhecimento de anatocismo e impossibilidade da repetição de indébito.. 12

5.1.        Situação FÁTICA. 12

5.2.        Análise ESTRATÉGICA. 13

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. 14

6.      Necessidade da citação do cônjuge em anulação de partilha que resulte em perda de imóvel 14

6.1.        Situação FÁTICA. 15

6.2.        Análise ESTRATÉGICA. 15

7.      Remissão da execução: termo final e requisitos. 17

7.1.        Situação FÁTICA. 17

7.2.        Análise ESTRATÉGICA. 17

8.      Negócio jurídico-processual que afeta contraditório e necessidade de concordância do juízo. 19

8.1.        Situação FÁTICA. 20

8.2.        Análise ESTRATÉGICA. 20

9.      Natureza da participação processual do INPI quanto não for parte em ação de nulidade de marca. 21

9.1.        Situação FÁTICA. 22

9.2.        Análise ESTRATÉGICA. 22

DIREITO TRIBUTÁRIO… 24

10.         Inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes e aplicabilidade nas execuções fiscais. 24

10.1.     Situação FÁTICA. 24

10.2.     Análise ESTRATÉGICA. 25

DIREITO DO CONSUMIDOR.. 27

11.         Cumprimento forçado e obrigação consumerista e insuficiência do produto em estoque. 27

11.1.     Situação FÁTICA. 27

11.2.     Análise ESTRATÉGICA. 27

DIREITO EMPRESARIAL. 29

12.         Proibição do administrador aprovar suas próprias contas e sociedades de apenas dois sócios. 29

12.1.     Situação FÁTICA. 29

12.2.     Análise ESTRATÉGICA. 30

DIREITO PENAL. 31

13.         (I)Legalidade da sentença de pronúncia fundamenta exclusivamente em elementos colhidos no inquérito policial. 31

13.1.     Situação FÁTICA. 31

13.2.     Análise ESTRATÉGICA. 32

DIREITO PROCESSUAL PENAL. 34

14.         (Im)possibilidade da conversão de ofício da prisão em flagrante em preventiva e ausência da audiência de custódia. 34

14.1.     Situação FÁTICA. 34

14.2.      Análise ESTRATÉGICA. 35

PARA TESTAR SEU CONHECIMENTO… 37

15.        QUESTÕES. 37

15.1.     Questões objetivas: CERTO ou ERRADO. 37

15.2.     Gabarito. 37

DIREITO ADMINISTRATIVO

1.      (Im)Possibilidade de acordo de não persecução penal em fase recursal de ação de improbidade administrativa

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

É possível acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa em fase recursal.

AREsp 1.314.581/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021.(Info 686)

1.1. Situação FÁTICA.

Município Quebradeira foi condenado ao fornecimento de certo medicamento para tratamento de doença coronária a um idoso. Ocorre que o prefeito Cleisson não deu bola e tampouco o andamento necessário ao cumprimento da ordem judicial. Alguns dias depois o idoso veio a falecer em razão da doença.

Os netos do idoso então ajuizaram ação de indenização por danos morais contra o Município, que foi condenado a tal pagamento. Para piorar ainda mais a situação de Cleisson, o Ministério Público recorreu da decisão a fim de condenar o então prefeito pela prática do ato ímprobo, em razão da configuração da omissão caracterizada pelo agir negligente diante da ordem judicial que lhe fora emitida.

A questão finalmente chegou ao STJ e antes do julgamento do recurso especial, Cleisson e o Ministério Público celebraram acordo de não persecução cível.

1.2. Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei n. 8.429/1992:

Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

§ 1º As ações de que trata este artigo admitem a celebração de acordo de não persecução cível, nos termos desta Lei.

§ 10-A. Havendo a possibilidade de solução consensual, poderão as partes requerer ao juiz a interrupção do prazo para a contestação, por prazo não superior a 90 (noventa) dias.

1.2.2.     Possível a celebração do acordo?

R: SIM.

A Lei n. 13.964/2019, denominada “Pacote Anticrime”, alterou o § 1º do art. 17 da Lei n. 8.429/1992, o qual passou a dispor que: § 1º As ações de que trata este artigo admitem a celebração de acordo de não persecução cível, nos termos desta Lei.

A referida Lei também introduziu o § 10-A ao art. 17 da LIA, com a seguinte redação: Havendo a possibilidade de solução consensual, poderão as partes requerer ao juiz a interrupção do prazo para a contestação, por prazo não superior a 90 (noventa) dias. Com efeito, a aludida alteração trouxe a possibilidade de acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa.

A Segunda Turma do STJ, ao se pronunciar a respeito da delação premiada e do acordo de leniência, em sede de ação de improbidade administrativa, conferiu interpretação restritiva aos referidos institutos à esfera penal, nos termos do sobredito art. 17, § 1º, da LIA. Na oportunidade, o eminente Relator, Ministro Mauro Campbell Marques, consignou que “a transação e o acordo são expressamente vedados no âmbito da ação de improbidade administrativa (art. 17, § 1º, da Lei n. 8.429/1992), ainda que entenda oportuno o debate pelo Congresso Nacional sobre o referido dispositivo legal, a fim de analisar sua atualidade, pertinência e compatibilidade com normas sancionatórias que preveem a possibilidade de acordo de não-persecução penal.” (REsp 1.464.287/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 26/6/2020.)

A Primeira Turma do STJ, em julgamento realizado em 03/05/2016, antes, portanto, da alteração do art. 17, § 1º, da LIA, não conheceu do requerimento de homologação de acordo no âmbito de ação de improbidade administrativa. Na ocasião, o eminente Relator, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, ressalvou seu ponto de vista pela possibilidade de acordo, uma vez cumpridas pelas partes transigentes as obrigações do Termo de Ajustamento de Conduta, não se justificando a protelação da homologação do acordo.

O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) editou a Resolução n. 179, de 26 de julho de 2017, regulamentando o § 6º do art. 5º da Lei n. 7.347/1985, para disciplinar, no âmbito do Ministério Público, a tomada do compromisso de ajustamento de conduta.

Nessa linha, o Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo (CSMPSP) editou a Resolução n. 1.193, de 11 de março de 2020, a qual disciplina o acordo de não persecução cível no âmbito do MPSP, regulamentando o disposto no art. 17, § 1º, da LIA e no art. 7º, § 2º, da Resolução n. 179/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público.

No caso, o recorrente foi condenado por dano ao erário pela prática de conduta ímproba na modalidade culposa do art. 10 da LIA, decorrente da condenação por danos morais sofrida, nos autos de ação de indenização, em razão de conduta omissiva consubstanciada pelo não cumprimento de ordem judicial para que fornecesse medicamento a paciente, que acabou vindo a óbito. Dessa forma, tendo em vista a homologação do acordo pelo Conselho Superior do MPSP, a conduta culposa praticada pelo recorrente, bem como a reparação do dano ao Município, além da manifestação favorável do Ministério Público Federal ao acordo, tem-se que a transação deve ser homologada.

1.2.3.  Resultado final.

É possível acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa em fase recursal.

2.      (Im)Possibilidade do Procurador da Fazenda Nacional que emitiu a CDA atuar como representante da PFN na mesma execução

RECURSO ESPECIAL

Não é vedado, ao Procurador da Fazenda Nacional que emitiu a certidão de dívida ativa, atuar como representante judicial da Fazenda Nacional, na respectiva execução fiscal.

REsp 1.311.899-RS, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021.(Info 686)

2.1. Situação FÁTICA.

Em certa execução fiscal, Serjão opôs embargos à execução movida pela Fazenda Nacional. Em sua defesa, alega a impossibilidade de atuação do Procurador da Fazenda Nacional que emitiu a certidão de dívida ativa, como representante judicial da Fazenda Nacional, na respectiva execução fiscal.

2.2. Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei Complementar n. 73/1993:

Art. 12 – À Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, órgão administrativamente subordinado ao titular do Ministério da Fazenda, compete especialmente:

I – apurar a liquidez e certeza da dívida ativa da União de natureza tributária, inscrevendo-a para fins de cobrança, amigável ou judicial;

II – representar privativamente a União, na execução de sua dívida ativa de caráter tributário;

Art. 28. Além das proibições decorrentes do exercício de cargo público, aos membros efetivos da Advocacia-Geral da União é vedado:

I – exercer advocacia fora das atribuições institucionais;

II – contrariar súmula, parecer normativo ou orientação técnica adotada pelo Advogado-Geral da União;

II – manifestar-se, por qualquer meio de divulgação, sobre assunto pertinente às suas funções, salvo ordem, ou autorização expressa do Advogado-Geral da União.

Art. 29. É defeso aos membros efetivos da Advocacia-Geral da União exercer suas funções em processo judicial ou administrativo:

I – em que sejam parte;

II – em que hajam atuado como advogado de qualquer das partes;

III – em que seja interessado parente consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o segundo grau, bem como cônjuge ou companheiro;

V – nas hipóteses da legislação processual.

Art. 30. Os membros efetivos da Advocacia-Geral da União devem dar-se por impedidos:

I – quando hajam proferido parecer favorável à pretensão deduzida em juízo pela parte adversa;

I – nas hipóteses da legislação processual.

Parágrafo único. Nas situações previstas neste artigo, cumpre seja dada ciência, ao superior hierárquico imediato, em expediente reservado, dos motivos do impedimento, objetivando a designação de substituto.

Art. 31. Os membros efetivos da Advocacia-Geral da União não podem participar de comissão ou banca de concurso, intervir no seu julgamento e votar sobre organização de lista para promoção ou remoção, quando concorrer parente consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o segundo grau, bem como cônjuge ou companheiro.

Lei n. 6.830/1980:

Art. 2º – Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

§ 1º – Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o artigo 1º, será considerado Dívida Ativa da Fazenda Pública.

§ 2º – A Dívida Ativa da Fazenda Pública, compreendendo a tributária e a não tributária, abrange atualização monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato.

§ 3º – A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo.

§ 4º – A Dívida Ativa da União será apurada e inscrita na Procuradoria da Fazenda Nacional.

§ 5º – O Termo de Inscrição de Dívida Ativa deverá conter:

I – o nome do devedor, dos co-responsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros;

II – o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato;

III – a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida;

IV – a indicação, se for o caso, de estar a dívida sujeita à atualização monetária, bem como o respectivo fundamento legal e o termo inicial para o cálculo;

V – a data e o número da inscrição, no Registro de Dívida Ativa; e

VI – o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida.

§ 6º – A Certidão de Dívida Ativa conterá os mesmos elementos do Termo de Inscrição e será autenticada pela autoridade competente.

§ 7º – O Termo de Inscrição e a Certidão de Dívida Ativa poderão ser preparados e numerados por processo manual, mecânico ou eletrônico.

§ 8º – Até a decisão de primeira instância, a Certidão de Dívida Ativa poderá ser emendada ou substituída, assegurada ao executado a devolução do prazo para embargos.

§ 9º – O prazo para a cobrança das contribuições previdenciárias continua a ser o estabelecido no artigo 144 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960.

Lei n. 8.906/1994:

Art. 28. A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com as seguintes atividades:

III – ocupantes de cargos ou funções de direção em Órgãos da Administração Pública direta ou indireta, em suas fundações e em suas empresas controladas ou concessionárias de serviço público;

2.2.2.     Há incompatibilidade?

R: NÃO!

Nos termos do art. 12, I e II, da Lei Complementar n. 73/1993, à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional compete especialmente: (i) apurar a liquidez e certeza da dívida ativa da União de natureza tributária, inscrevendo-a para fins de cobrança, amigável ou judicial; e (ii) representar privativamente a União, na execução de sua dívida ativa de caráter tributário. Nada, no aludido dispositivo, sugere que as atividades devam necessariamente ser praticadas por membros diferentes da PGFN.

Por seu turno, na Lei n. 6.830/1980, especialmente em seu art. 2º, que trata, em pormenores, do ato de inscrição, não se encontra suporte para o impedimento de Procurador da Fazenda Nacional que emitiu a certidão de dívida ativa, atuar como representante judicial da Fazenda Nacional, na respectiva execução fiscal.

As vedações legais à atuação do Procurador da Fazenda Nacional são aquelas constantes dos arts. 28 a 31 da Lei Complementar n. 73/1993, entre as quais não se encontra albergada a hipótese analisada. Por fim, registre-se que a incompatibilidade prevista no art. 28, III, da Lei n. 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia), tampouco se aplica, obviamente, ao Procurador da Fazenda Nacional, atuando, em Juízo, na defesa da União.

2.2.3.  Resultado final.

Não é vedado, ao Procurador da Fazenda Nacional que emitiu a certidão de dívida ativa, atuar como representante judicial da Fazenda Nacional, na respectiva execução fiscal.

DIREITO CIVIL

3.      (Im)Possibilidade de repasse dos custos dos boletos pelas distribuidoras às farmácias

RECURSO ESPECIAL

É cabível o repasse da despesa relativa à tarifa de emissão de boletos bancários feito pela distribuidora de medicamentos às drogarias e farmácias.

REsp 1.580.446-RJ,Rel.Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, porunanimidade,julgado em 23/02/2021.(Info 686)

3.1. Situação FÁTICA.

O Sindicato do Comércio Farmacêutico de certo município ajuizou ação de obrigação de fazer em face de PercoNada Distribuidora de Medicamentos. O intento da ação era obrigar a distribuidora a deixar de realizar a cobrança ou repasse de despesa referente à tarifa de emissão de boleto bancário às drogarias e farmácias representadas.

Conforme o sindicato autor, não seria correto tal repasse de custos uma vez que as farmácias compradoras não têm nenhuma relação com o banco que presta serviço de emissão de boletos para a distribuidora.

3.2. Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.  Questão JURÍDICA.

Código Civil:

Art. 325. Presumem-se a cargo do devedor as despesas com o pagamento e a quitação; se ocorrer aumento por fato do credor, suportará este a despesa acrescida.

3.2.2.     Quem paga o pato, digo, pelo boleto?

R: AS FARMÁCIAS.

No comércio atacadista de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos – produtos sujeitos à vigilância sanitária, nos termos da Lei n. 6.360/1976 -, a atividade empresarial de distribuição apresenta certas peculiaridades, notadamente em razão da intensa regulação estatal incidente sobre tais produtos e os agentes do mercado que com eles operam.

Ademais, todos os agentes econômicos integrantes dessa relação comercial devem se submeter aos preços máximos de venda dos medicamentos – “preço fábrica” ou “preço máximo ao consumidor” -, o que implica a limitação do repasse de custos entre os participantes da cadeia de distribuição, assim como a redução das respectivas margens de lucro. Na cadeia de relações jurídicas que culminam com a cobrança e posterior repasse do pagamento de tarifa de emissão de boleto bancário, as distribuidoras (comerciantes atacadistas) adquirem os produtos da indústria farmacêutica (laboratórios e importadoras) e, posteriormente, atuam na logística de disponibilização – armazenagem, controle de estoque, organização e realização do fluxo de distribuição, transporte e venda – dos medicamentos para as farmácias e drogarias (comerciantes varejistas), que constituem o principal canal de acesso aos fármacos pela população brasileira.

Uma vez firmado o contrato de compra e venda mercantil – integrante da relação de distribuição de produtos farmacêuticos -, a obrigação essencial das atacadistas (vendedoras) consistirá na “entrega dos medicamentos” (transferência efetiva do domínio) em determinado prazo, ao passo que incumbirá às varejistas (compradoras) o pagamento do preço avençado.

Nos termos do artigo 325 do Código Civil, a obrigação das compradoras não se resume ao pagamento do preço, presumindo-se a sua responsabilidade pelas “despesas com o pagamento e a quitação”, salvo em se tratando de despesa excepcional decorrente de fato imputável ao credor.

À luz do Código Civil de 2002, a chamada tarifa de emissão de boleto bancário caracteriza despesa decorrente da oferta deste meio de pagamento às varejistas (compradoras), revelando-se RAZOÁVEL que lhes seja imputada.

Além disso, a vedação de cobrança de tarifa de emissão de boleto consubstancia comando dirigido unicamente às instituições financeiras, que não podem exigir de seus clientes (pessoas, físicas ou jurídicas, com as quais mantenha vínculo negocial não esporádico) a remuneração de serviço sem respaldo em prévia contratação nem obter valores, a esse título, diretamente do sacado.

Não há falar, contudo, em limitação à liberdade negocial de sociedades empresárias, que, no âmbito de relação mercantil, convencionem a transferência, para as adquirentes de produtos farmacêuticos (varejistas), do custo suportado pela vendedora (distribuidora) com a oferta de meio de pagamento favorável ao desenvolvimento eficiente das atividades das partes, ambas integrantes da cadeia de distribuição de medicamentos.

Nesse mesmo diapasão, destaca-se a tese firmada, à unanimidade, pela Terceira Turma do STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.515.640/SP, no sentido de que, seja à luz do artigo 325 do Código Civil, seja em face dos limites de atuação do Conselho Monetário Nacional, não caracteriza abuso do poder econômico, violação à boa-fé ou aos bons costumes o repasse, pelas distribuidoras de medicamentos (atacadistas), da tarifa de emissão de boletos bancários às drogarias e farmácias (varejistas).Por fim, registra-se que a criação do Pix revolucionou não apenas o mercado financeiro, mas também os usos e costumes próprios das relações jurídicas empresariais, que deverão se adequar ao novo cenário, modernizando-se e aprimorando-se com vista a otimizar a busca pelo lucro e pela acumulação de riquezas, finalidade principal do sistema econômico capitalista que ora vivenciamos.

3.2.3.  Resultado final.

É cabível o repasse da despesa relativa à tarifa de emissão de boletos bancários feito pela distribuidora de medicamentos às drogarias e farmácias.

4.      Extinção contratual e opção pelo cumprimento forçado ou rompimento do contrato

RECURSO ESPECIAL

Em ação de extinção contratual com cláusula resolutiva, é lícito à parte lesada optar entre o cumprimento forçado ou o rompimento do contrato, desde que antes da sentença.

REsp 1.907.653-RJ, Rel.Min.Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021;(Info 686)

4.1. Situação FÁTICA.

Tadeu vendeu suas cotas da empresa Expresso Forte a Juliano. Ocorre que Juliano, malandramente, deixou de pagar o valor combinado e ainda vendeu as mesmas cotas para terceiros.

Tadeu então ajuizou ação na qual requereu o pagamento do valor devido ou que fosse fixada indenização por perdas e danos e que as cotas retornassem à propriedade do autor.

Porém, antes da sentença, Tadeu peticionou e informou que não tinha mais interesse no cumprimento forçado, mas sim no rompimento do contrato e que as cotas lhe fossem devolvidas.

4.2.  Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.  Questão JURÍDICA.

Código Civil:

Art. 252. Nas obrigações alternativas, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não se estipulou.

§ 1 o Não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte em outra.

§ 2 o Quando a obrigação for de prestações periódicas, a faculdade de opção poderá ser exercida em cada período.

§ 3 o No caso de pluralidade de optantes, não havendo acordo unânime entre eles, decidirá o juiz, findo o prazo por este assinado para a deliberação.

§ 4 o Se o título deferir a opção a terceiro, e este não quiser, ou não puder exercê-la, caberá ao juiz a escolha se não houver acordo entre as partes.

Art. 253. Se uma das duas prestações não puder ser objeto de obrigação ou se tornada inexeqüível, subsistirá o débito quanto à outra.

Art. 254. Se, por culpa do devedor, não se puder cumprir nenhuma das prestações, não competindo ao credor a escolha, ficará aquele obrigado a pagar o valor da que por último se impossibilitou, mais as perdas e danos que o caso determinar.

Art. 255. Quando a escolha couber ao credor e uma das prestações tornar-se impossível por culpa do devedor, o credor terá direito de exigir a prestação subsistente ou o valor da outra, com perdas e danos; se, por culpa do devedor, ambas as prestações se tornarem inexeqüíveis, poderá o credor reclamar o valor de qualquer das duas, além da indenização por perdas e danos.

Art. 256. Se todas as prestações se tornarem impossíveis sem culpa do devedor, extinguir-se-á a obrigação.

Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.

4.2.2.     A opção de Tadeu é válida?

R: SIM, desde que antes da sentença!

Cinge-se a controvérsia sobre pedido formulado de forma alternativa, com fundamento na cláusula resolutiva tácita prevista no art. 475 do Código Civil e não, de obrigação pactuada com natureza alternativa, instituto tratado nos arts. 252 a 256 do mesmo Código.

É lícito à parte lesada optar pelo cumprimento forçado ou pelo rompimento do contrato, não lhe cabendo, todavia, o direito de exercer ambas a alternativas simultaneamente. A escolha, uma vez feita, pode variar, desde que antes da sentença.

Segundo a doutrina, a ação para a resolução do contrato pode ser exercida “em substituição da ação para cumprimento, ainda que esta já tenha sido intentada, desde que não haja sentença, porque só esta (e não o simples pedido judicial) é decisiva e extingue o direito de escolha que, entre os dois remédios, a lei concede”. Assim, julgado procedente o pedido de condenação do devedor ao cumprimento do contrato, não cabe deferir, simultaneamente, ao credor, a pretensão de resolução do pacto.

4.2.3.  Resultado final.

Em ação de extinção contratual com cláusula resolutiva, é lícito à parte lesada optar entre o cumprimento forçado ou o rompimento do contrato, desde que antes da sentença.

DIREITO BANCÁRIO E CIVIL

5.      Reconhecimento de anatocismo e impossibilidade da repetição de indébito

EMBARGOS EM RECURSO ESPECIAL

Nos contratos de mútuo imobiliário regidos pelo Plano de Equivalência Salarial – PES, segurados pelo Fundo de Compensação de Valorizações Salariais – FCVS, o reconhecimento de anatocismo não gera direito a repetição de indébito se tal procedimento impactou apenas no valor do saldo devedor do contrato.

EREsp 1.460.696/PR, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 24/02/2021.(Info 686)

5.1. Situação FÁTICA.

Vandeco comprou uma casa através de financiamento pelo Sistema Financeiro de Habitação, no qual ficou combinado que o valor financiado seria pago em parcelas mensais ao banco financiador. O contrato foi realizado e regido pelo Plano de Equivalência Salarial e pelo Fundo de Compensação de Valorizações Salariais.

Algum tempo depois e já com muitas parcelas pagas, Vandeco foi informado por um advogado conhecido que este tipo de contrato seria ilegal em razão da capitalização de juros sobre juros (anatocismo) e portanto, seria ilegal.

Revoltado, Vandeco ajuizou ação de repetição de indébito contra o banco financiador através da qual pretende reaver o valor que teria sido pago indevidamente.

5.2. Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei n. 8.004/1990:

Art. 23. As importâncias eventualmente cobradas a mais dos mutuários deverão ser ressarcidas devidamente corrigidas pelos índices de atualização dos depósitos de poupança, em espécie ou através de redução nas prestações vincendas imediatamente subseqüentes.

5.2.2.     Vandeco receberá as diferenças em dinheiro?

R: DEPENDE. Se o financiador teve que pagar parcelas maiores em razão do anatocismo, sim. Do contrário, o valor será reduzido do saldo devedor.

Cinge-se a controvérsia a analisar se uma vez reconhecida a prática de ilegal capitalização de juros nos contratos de mútuo imobiliário regidos pelo Plano de Equivalência Salarial – PES, segurados pelo Fundo de Compensação de Valorizações Salariais – FCVS, impõe-se que as diferenças apuradas sejam restituídas ao mutuário em pecúnia, ou se elas deveriam ser abatidas do saldo devedor, o qual será quitado com recursos do FCVS.

A ideia por trás do PES é assegurar ao mutuário que as prestações pagas para a obtenção da casa própria mantenham-se estáveis, seguindo sua evolução salarial. Já o saldo devedor, que deve ser amortizado a cada parcela paga, sofre o reajuste pelos índices da poupança, devendo, ao final do contrato, ser realizado o encontro de contas. Caso ainda exista algum valor residual, o FCVS entra como um seguro, quitando as diferenças.

No entanto, este descompasso de reajustes acaba determinando a seguinte anomalia: a parcela é insuficiente para amortizar os juros e o saldo devedor, gerando uma diferença que é reincorporada ao principal. Como consequência, ao fim do contrato, apesar da adimplência do mutuário, ele se depara com o fato de que o saldo residual alcança valor maior que o principal contratado, ou mesmo do próprio imóvel adquirido.

A Segunda Turma, ao se defrontar com o tema, registrou que o afastamento da capitalização de juros não pode gerar benefício repetitório em favor do mutuário, uma vez que as diferenças decorrentes desta operação devem compor o saldo devedor, o qual será coberto pelo FCVS. Já o acórdão paradigma, prolatado pela Primeira Turma, em situação fática em muito semelhante, concluiu que “O art. 23 da Lei n. 8.004/1990, não prevê que os valores eventualmente cobrados com excesso sejam compensados com saldo devedor, mas, antes, restituídos ao mutuário, com redução nas prestações vincendas imediatamente subsequentes ou, acaso findas as parcelas, em espécie, nos exatos termos do aludido dispositivo legal” (REsp 848.855/RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 19/8/2008, DJe 15/9/2008).

O ponto fulcral do debate está em definir qual o efeito da prática de anatocismo no contrato de financiamento imobiliário celebrado com a adoção do PES. Se o mutuário teve que arcar com prestações mensais maiores, existirá, sim, o direito de repetição; contudo, se tal procedimento impactou apenas o valor do saldo devedor, este deve ser reduzido e utilizado um montante menor do FCVS para a quitação do mútuo. De fato, somente os valores efetivamente desembolsados pelo mutuário poderiam ensejar o direito de restituição.

5.2.3.  Resultado final.

Nos contratos de mútuo imobiliário regidos pelo Plano de Equivalência Salarial – PES, segurados pelo Fundo de Compensação de Valorizações Salariais – FCVS, o reconhecimento de anatocismo não gera direito a repetição de indébito se tal procedimento impactou apenas no valor do saldo devedor do contrato.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

6.      Necessidade da citação do cônjuge em anulação de partilha que resulte em perda de imóvel

RECURSO ESPECIAL

No caso de a anulação de partilha acarretar a perda de imóvel já registrado em nome de herdeiro casado sob o regime de comunhão universal de bens, a citação do cônjuge é indispensável, tratando-se de hipótese de litisconsórcio necessário.

REsp 1.706.999-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021(Info 686)

6.1. Situação FÁTICA.

Bastião e Maria mantiveram união estável por um certo período de tempo. Ocorre que Maria adoeceu e Bastião, pessoa muito simples e humilde,  não pode cuidar dela, que permaneceu internada sob a responsabilidade de seu irmão e curador.

Passado algum tempo, Maria faleceu. Ocorre que o irmão de Maria convenceu (logrou, engrupiu) Bastião a concordar com um plano de partilha amigável, que foi aceito, uma vez que este não sabia que era o herdeiro único da falecida e, portanto, não haveria que se falar em partilha.

Algum tempo depois, Bastião ajuizou ação na qual requereu a nulidade da partilha. Em contestação, os réus alegaram que seus respectivos cônjuges deveriam compor a lide, pois são casados em regime de comunhão universal de bens e a partilha envolveu imóveis sobre os quais passaram a ter a propriedade.

6.2. Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.  Questão JURÍDICA.

Código Civil:

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:

I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;

II – pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;

III – prestar fiança ou aval;

IV – fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.

Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada.

Art. 1.225. São direitos reais:

I – a propriedade;

II – a superfície;

III – as servidões;

IV – o usufruto;

V – o uso;

VI – a habitação;

VII – o direito do promitente comprador do imóvel;

VIII – o penhor;

IX – a hipoteca;

X – a anticrese.

XI – a concessão de uso especial para fins de moradia;

XII – a concessão de direito real de uso; e

XIII – a laje

CPC/2015:

Art. 73. O cônjuge necessitará do consentimento do outro para propor ação que verse sobre direito real imobiliário, salvo quando casados sob o regime de separação absoluta de bens.

§ 1º Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para a ação:

I – que verse sobre direito real imobiliário, salvo quando casados sob o regime de separação absoluta de bens;

6.2.2.     Necessária a participação dos cônjuges?

R: SIM!

Conforme determina o art. 1.647 do Código Civil, a alienação, a cessão, a desistência e a renúncia de bens imóveis necessitam de outorga uxória. O que norteia a conclusão de que o cônjuge do herdeiro deve participar do processo é a correspondência entre a renúncia, a cessão e a desistência com a alienação de bem imóvel.

Essa situação fica ainda mais preponderante nos casos em que o herdeiro é casado sob o regime de comunhão universal de bens, pois tudo o que houver sido adquirido por herança passa imediatamente a integrar o patrimônio comum, cabendo ao outro cônjuge por metade.

No caso de ação de anulação de partilha, parece que o mesmo raciocínio deve orientar a verificação quanto à necessidade de participação do cônjuge do herdeiro no processo. Assim, se houver a possibilidade de ser atingido negativamente o patrimônio do casal, com a alienação (perda) de bem imóvel, o cônjuge do herdeiro deve ser chamado para integrar a lide. Caso contrário, é DISPENSADA sua participação.

Na hipótese dos autos, o regime de casamento dos herdeiros é a comunhão universal de bens e a partilha anteriormente realizada contemplou bens imóveis. Nessa situação, em que os imóveis recebidos pelos recorrentes por conta da anterior partilha já foram levados a registro, integrando o patrimônio comum do casal, mostra-se indispensável a citação do cônjuge do herdeiro para a ação de anulação de partilha. Isso porque poderá haver a perda do imóvel que atualmente pertence a ambos, devendo a lide ser decidida de forma uniforme para ambos.

Vale lembrar, ainda, que de acordo com o artigo 10, §1º, I, do CPC/1973 (art. 73, § 1º, I, do CPC/2015), os cônjuges serão necessariamente citados para a ação que trate de direitos reais imobiliários (art. 1.225 do CC). Nesse contexto, se o imóvel passou a integrar o patrimônio comum, a ação na qual se pretende a anulação da partilha envolve a anulação do próprio registro de transferência da propriedade do bem, mostrando-se indispensável a citação.        

6.2.3.  Resultado final.

No caso de a anulação de partilha acarretar a perda de imóvel já registrado em nome de herdeiro casado sob o regime de comunhão universal de bens, a citação do cônjuge é indispensável, tratando-se de hipótese de litisconsórcio necessário.

7.      Remissão da execução: termo final e requisitos.

RECURSO ESPECIAL

O termo final para a remição da execução é a assinatura do auto de arrematação. Para a remição da execução, o executado deve depositar o montante correspondente à totalidade da dívida executada, acrescida de juros, custas e honorários de advogado.

REsp 1.862.676-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021(Info 686)

7.1. Situação FÁTICA.

Nostrabriga Administradora de Imóveis ajuizou ação de execução de título extrajudicial referente à cobrança de aluguéis de imóvel não comercial em face de Mandrião Telecomunicações.

No decorrer da ação, o Juízo determinou a praça do imóvel dado em caução no contrato de locação, sendo que houve oferta de lance na referida praça. Ocorre que, antes do pagamento da arrematação, Mandrião depositou em juízo o valor atualizado do débito para fins de remição, mas não depositou todos os valores englobados no feito (custas, honorários do advogado, etc.).

Por entender insuficiente o depósito, o Juízo indeferiu o pedido de remição.

7.2. Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.  Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 826. Antes de adjudicados ou alienados os bens, o executado pode, a todo tempo, remir a execução, pagando ou consignando a importância atualizada da dívida, acrescida de juros, custas e honorários advocatícios.

Art. 903. Qualquer que seja a modalidade de leilão, assinado o auto pelo juiz, pelo arrematante e pelo leiloeiro, a arrematação será considerada perfeita, acabada e irretratável, ainda que venham a ser julgados procedentes os embargos do executado ou a ação autônoma de que trata o § 4º deste artigo, assegurada a possibilidade de reparação pelos prejuízos sofridos.

§ 1º Ressalvadas outras situações previstas neste Código, a arrematação poderá, no entanto, ser:

I – invalidada, quando realizada por preço vil ou com outro vício;

II – considerada ineficaz, se não observado o disposto no art. 804 ;

III – resolvida, se não for pago o preço ou se não for prestada a caução.

§ 2º O juiz decidirá acerca das situações referidas no § 1º, se for provocado em até 10 (dez) dias após o aperfeiçoamento da arrematação.

§ 3º Passado o prazo previsto no § 2º sem que tenha havido alegação de qualquer das situações previstas no § 1º, será expedida a carta de arrematação e, conforme o caso, a ordem de entrega ou mandado de imissão na posse.

§ 4º Após a expedição da carta de arrematação ou da ordem de entrega, a invalidação da arrematação poderá ser pleiteada por ação autônoma, em cujo processo o arrematante figurará como litisconsorte necessário.

§ 5º O arrematante poderá desistir da arrematação, sendo-lhe imediatamente devolvido o depósito que tiver feito:

I – se provar, nos 10 (dez) dias seguintes, a existência de ônus real ou gravame não mencionado no edital;

II – se, antes de expedida a carta de arrematação ou a ordem de entrega, o executado alegar alguma das situações previstas no § 1º ;

III – uma vez citado para responder a ação autônoma de que trata o § 4º deste artigo, desde que apresente a desistência no prazo de que dispõe para responder a essa ação.

§ 6º Considera-se ato atentatório à dignidade da justiça a suscitação infundada de vício com o objetivo de ensejar a desistência do arrematante, devendo o suscitante ser condenado, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos, ao pagamento de multa, a ser fixada pelo juiz e devida ao exequente, em montante não superior a vinte por cento do valor atualizado do bem.

7.2.2.     Mandrião fez o depósito a tempo e de forma válida?

R: Em tempo, SIM. Mas não foi válido em razão do valor incompleto.

A remição da execução consiste na satisfação integral do débito executado no curso do processo e impede a alienação do bem penhorado. Essa prerrogativa está prevista no art. 826 do CPC/2015, cuja primeira parte estabelece que “antes de adjudicados ou alienados os bens, o executado pode, a todo tempo, remir a execução (…)”.

Embora o dispositivo legal colacionado faça referência à alienação, não se pode olvidar que a arrematação se trata de um ato complexo que, nos termos do art. 903 do CPC/2015, só se considera perfeita e acabada no momento da assinatura do auto de arrematação pelo juiz, pelo arrematante e pelo leiloeiro.

Nessa linha de pensamento, a doutrina pondera que “mesmo depois de encerrado o pregão, mas enquanto não se firma o auto de arrematação, ou não se publica a sentença de adjudicação, ainda é possível ao devedor remir a execução”. Logo, a arrematação do imóvel não impede o devedor de remir a execução, caso o auto de arrematação ainda esteja pendente de assinatura.

O art. 826 do CPC/2015 exige, para a remição da execução, que o executado pague ou consigne “a importância atualizada da dívida, acrescida de juros, custas e honorários advocatícios”. Assim, é IMPRESCINDÍVEL que o executado deposite o montante integral do crédito e seus acessórios.

É axiomático que a importância a que se refere a lei diz respeito ao valor da dívida exigida no processo de execução cuja remissão é pretendida. Intepretação diversa importaria na imposição de ônus adicional ao executado e, consequentemente, em restrição a direito que lhe é assegurado, sem qualquer respaldo na legislação processual vigente. Se mais de uma execução estiver em trâmite em face do executado, caso assim o deseje, ele poderá remir aquela que melhor lhe aprouver.

Essa tese encontra suporte, analogicamente, no entendimento doutrinário segundo o qual mesmo existindo diversas penhoras sobre o imóvel, “o depósito do devedor não precisa abranger, necessariamente, o crédito de todos os participantes do concurso de preferências (art. 908). É lícito ao executado escolher a dívida que pretende pagar, talvez com o propósito de extinguir a execução mais adiantada, em que se realizarão os atos expropriatórios. A penhora dos demais credores subsistirá com plena eficácia. O devedor assume o risco de remir logo adiante outra execução, se credor diverso retomar a expropriação do bem penhorado.

Em resumo, para a remição da execução, o executado deve depositar o montante correspondente à totalidade da dívida executada, acrescida de juros, custas e honorários de advogado, não sendo possível exigir-lhe o pagamento de débitos executados em outras demandas.

7.2.3.  Resultado final.

O termo final para a remição da execução é a assinatura do auto de arrematação. Para a remição da execução, o executado deve depositar o montante correspondente à totalidade da dívida executada, acrescida de juros, custas e honorários de advogado.

8.      Negócio jurídico-processual que afeta contraditório e necessidade de concordância do juízo.

RECURSO ESPECIAL

O negócio jurídico processual que transige sobre o contraditório e os atos de titularidade judicial se aperfeiçoa validamente se a ele aquiescer o juiz.

REsp1.810.444-SP, Rel.Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade,julgado em 23/02/2021(Info 686)

8.1. Situação FÁTICA.

Cobromesmo Imobiliária vendeu um imóvel a Pagonada Ltda. Ciente da fama de mau pagador da compradora, fez constar no contrato uma cláusula na qual, em caso de inadimplência, a compradora concordava com o bloqueio de ativos desta, sem necessidade de ouvir a devedora (contraditório) e tampouco de prestar garantia em razão do bloqueio.

Como o esperado, Pagonada honrou o nome, não efetuou os pagamentos e ainda quando acionada judicialmente alegou a nulidade do negócio jurídico pré processual.

8.2. Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.  Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.

Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.

8.2.2.     Válido o negócio jurídico processual?

R: Nops…

A controvérsia dos autos consiste na verificação dos possíveis limites impostos pelo diploma legal ao objeto do negócio jurídico processual. Na hipótese, a questão é definir a possibilidade das partes estipularem, em negócio jurídico processual prévio, que haverá, em caso de inadimplemento contratual, o bloqueio de ativos financeiros para fins de arresto e penhora, em caráter inaudita altera parte e sem necessidade de se prestar garantia.

De acordo com a doutrina, o negócio jurídico processual é “o instrumento por excelência da autonomia privada, correspondendo justamente à modalidade de ato lícito que permite ao particular escolher os efeitos a serem produzidos, os quais serão tão somente reconhecidos e tutelados pelo ordenamento na medida em que se mostrem compatíveis, estrutural e funcionalmente, com os limites da legalidade”. O art. 190 do CPC/2015 formalizou a adoção da teoria dos negócios jurídicos processuais, conferindo, assim, certa flexibilização procedimental ao processo, tendo em mira a promoção efetiva do direito material discutido.

É certo que não é de hoje a existência de hipóteses isoladas e tipificadas de negócios jurídicos processuais. Todavia, ganha destaque a sistematicidade com que o novo Código de Processo Civil articulou uma cláusula geral de negociação, consagrando a atipicidade como meio apto à adequação das demandas às especificidades da causa e segundo a conveniência dos litigantes, sempre, é claro, moldada pelos limites impostos pelo ordenamento jurídico.

Assim, não se sujeita a um juízo de conveniência pelo juiz, prevista a recusa de sua aplicação “somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade”. A doutrina preconiza que, nada obstante, quando evidenciado um conflito entre alguma das típicas garantias processuais formadoras da tutela justa (contraditório, igualdade, ampla defesa) e a manifestação volitiva das partes, o magistrado, diante do caso concreto, deverá realizar um exame de ponderação entre os valores colidentes.

No caso, no exercício da função fundamental de conferir efetividade às convenções, preservando a materialidade da garantia constitucional, consideram-se transpostos os limites impostos à celebração, em razão de seu objeto.

Ademais, o objeto de negociação investigado merece reprimenda também pelo fato de transigir sobre atos de titularidade judicial. Nessa linha de intelecção, no que respeita ao caso concreto, é possível afirmar que todas as vezes que a supressão do contraditório conduzir à desigualdade de armas no processo, o negócio processual, ou a cláusula que previr tal situação, deverá ser considerado INVÁLIDO. Noutro ponto, vislumbrando o juiz, na análise do instrumento, que a transação acerca do contraditório não torna uma das partes vulnerável, dada as peculiaridades do caso, é possível reconhecer-lhe validade.

8.2.3.  Resultado final.

O negócio jurídico processual que transige sobre o contraditório e os atos de titularidade judicial se aperfeiçoa validamente se a ele aquiescer o juiz.

9.      Natureza da participação processual do INPI quanto não for parte em ação de nulidade de marca

RECURSO ESPECIAL

Em ação de nulidade de registro de marca, a natureza da participação processual do INPI, quando não figurar como autor ou corréu, é de intervenção sui generis (ou atípica) obrigatória, na condição de assistente especial.

REsp1.817.109-RJ, Rel.Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021 (Info 686)

9.1.  Situação FÁTICA.

Vailar S.A ajuizou ação de nulidade de registro de marca em face do INPI e de VTA Tecnologies em razão de suposta irregularidade no registro de certa vacina veterinária pela ré. Citado, o INPI confirmou que a expressão RB-51 (parte do nome da vacina envolvida) corresponde à forma técnica da cepa do vírus, motivo pelo qual requereu a nulidade do registro.

Após a manifestação do INPI e antes da sentença, as empresas celebraram transação, a qual foi homologada pelo juízo. O INPI então interpôs apelação na qual sustentou a nulidade da transação e a continuidade do processo para que fosse analisado o mérito da ação, o que foi deferido pelo Tribunal Regional Federal local.

9.2. Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei n. 9.279/1996:

Art. 57. A ação de nulidade de patente será ajuizada no foro da Justiça Federal e o INPI, quando não for autor, intervirá no feito.

§ 1º O prazo para resposta do réu titular da patente será de 60 (sessenta) dias.

§ 2º Transitada em julgado a decisão da ação de nulidade, o INPI publicará anotação, para ciência de terceiros.

Art. 118. Aplicam-se à ação de nulidade de registro de desenho industrial, no que couber, as disposições dos arts. 56 e 57.

Art. 173. A ação de nulidade poderá ser proposta pelo INPI ou por qualquer pessoa com legítimo interesse.

Parágrafo único. O juiz poderá, nos autos da ação de nulidade, determinar liminarmente a suspensão dos efeitos do registro e do uso da marca, atendidos os requisitos processuais próprios.

Art. 175. A ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da justiça federal e o INPI, quando não for autor, intervirá no feito.

§ 1º O prazo para resposta do réu titular do registro será de 60 (sessenta) dias.

§ 2º Transitada em julgado a decisão da ação de nulidade, o INPI publicará anotação, para ciência de terceiros.

Lei n. 4.717/1965:

Art. 6º A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no art. 1º, contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo.

§ 3º A pessoas jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente.

Lei n. 8.429/1992:

Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

§ 3o  No caso de a ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se, no que couber, o disposto no § 3o do art. 6o da Lei no 4.717, de 29 de junho de 1965.

9.2.2.     O INPI sustenta legitimidade para recorrer de sentença quando não é parte?

R: SIM!

A Lei n. 9.279/1996 (LPI) regula os direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, definindo, ainda, o procedimento a ser adotado nas ações de nulidade de patente e de registro de desenho industrial e de marcas (artigos 57, 118 e 175).

Em qualquer das aludidas pretensões, segundo as normas indicadas, deverá ocorrer a intervenção do INPI, autarquia federal responsável pelo aperfeiçoamento, pela disseminação e pela gestão do sistema brasileiro de concessão e garantia de direitos de propriedade intelectual.

No tocante à nulidade do registro de marca, o caput do artigo 175 da LPI estabelece que “a ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da justiça federal e o INPI, quando não for autor, intervirá no feito”. A referida ação, portanto, poderá ser proposta tanto pelo INPI como por qualquer outra pessoa (física ou jurídica) com legítimo interesse (artigo 173), mas, em não sendo a autarquia a autora, deverá, OBRIGATORIAMENTE, intervir no feito, sob pena de nulidade.

Diante desse contexto normativo, precedentes do STJ envolvendo discussões sobre ônus sucumbencial e honorários recursais – consagraram o entendimento de que, na ação de nulidade de patente ou de registro de marca (ou de desenho industrial), a atuação processual do INPI, quando não figurar como autor ou corréu, terá a natureza de intervenção sui generis (ou atípica), na condição de assistente especial (ou até de amicus curiae), por se dar de forma obrigatória, tendo em vista o interesse público encartado na sua finalidade institucional de proteção eficiente da propriedade industrial com o necessário estímulo ao desenvolvimento tecnológico e econômico do país, observada a livre iniciativa, a função social da propriedade e a defesa do mercado consumidor.

Sob tal ótica, destaca-se precedente da Terceira Turma, exarado por ocasião do julgamento do Recurso Especial 1.775.812/RJ – da relatoria do eminente Ministro Marco Aurélio Bellizze -, que, ao versar sobre a legitimidade processual do INPI para impugnar sentença extintiva de reconvenção apresentada por corréu, reconheceu a natureza dinâmica do litisconsórcio exercido pela autarquia, que não fica adstrita a qualquer um dos polos da demanda.

Desse modo, fala-se em uma “migração interpolar” do INPI, a exemplo do que ocorre na ação popular e na ação de improbidade, nas quais a pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, pode abster-se de contestar o pedido, ou atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, nos termos dos artigos 6º, § 3º, da Lei n. 4.717/1965 e 17, § 3º, da Lei n. 8.429/1992.

9.2.3.  Resultado final.

Em ação de nulidade de registro de marca, a natureza da participação processual do INPI, quando não figurar como autor ou corréu, é de intervenção sui generis (ou atípica) obrigatória, na condição de assistente especial.

DIREITO TRIBUTÁRIO

10.  Inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes e aplicabilidade nas execuções fiscais

RECURSO ESPECIAL

O art. 782, §3º, do CPC é aplicável às execuções fiscais, devendo o magistrado deferir o requerimento de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, preferencialmente pelo sistema SERASAJUD, independentemente do esgotamento prévio de outras medidas executivas, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito previsto na Certidão de Dívida Ativa – CDA.

REsp 1.807.180/PR, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 24/02/2021. (Tema 1026).(Info 686)

10.1.             Situação FÁTICA.

Em certa execução fiscal, a União requereu a inclusão do devedor nos cadastros de inadimplentes após o prazo para pagamento pelo executado, mas antes de qualquer tentativa de penhora.

Ocorre que, Dr. Creisson, o juiz competente, indeferiu o pedido por entender que a inclusão do executado nos cadastros de inadimplentes prevista no art.782, §3º, do CPC somente seria permitido nas execuções comuns e não nas fiscais.

10.2.             Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1.                Questão JURÍDICA.

CPC:

Art. 782. Não dispondo a lei de modo diverso, o juiz determinará os atos executivos, e o oficial de justiça os cumprirá.

§ 3º A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes.

§ 5º O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título judicial.

Lei n. 6.830/1980:

Art. 1º – A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil

10.2.2. Aplicável também às execuções fiscais?

R: Com certeza!!!

O objeto da controvérsia é definir se o art. 782, §3º, do CPC é aplicável apenas às execuções de título judicial ou também às de título extrajudicial, mais especificamente, às execuções fiscais. O art. 782, §3º, do CPC está inserido no Capítulo III (“Da competência”), do Título I (“Da execução em geral”), do Livro II (Do processo de execução”) do CPC, sendo que o art. 771 dispõe que “este Livro regula o procedimento da execução fundada em título extrajudicial”.

Não há dúvidas, portanto, de que o art. 782, §3º, do CPC ao determinar que “A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes.”, dirige-se às execuções fundadas em títulos extrajudiciais.

O art. 782, §5º, do CPC ao prever que “O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título judicial.”, possui dupla função: 1) estender às execuções de títulos judiciais a possibilidade de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes; 2) excluir a incidência do instituto nas execuções provisórias, restringindo-o às execuções definitivas.

Nos termos do art. 1º da Lei n. 6.830/1980, o CPC tem aplicação SUBSIDIÁRIA às execuções fiscais, caso não haja regulamentação própria sobre determinado tema na legislação especial, nem se configure alguma incompatibilidade com o sistema.

É justamente o caso do art. 782, §3º, do CPC, que se aplica subsidiariamente às execuções fiscais pois: 1) não há norma em sentido contrário na Lei n. 6.830/1980; 2) a inclusão em cadastros de inadimplência é medida coercitiva que promove no subsistema os valores da efetividade da execução, da economicidade, da razoável duração do processo e da menor onerosidade para o devedor.

O Poder Judiciário determina a inclusão nos cadastros de inadimplentes com base no art. 782, §3º, por meio do SERASAJUD, sistema gratuito e totalmente virtual, regulamentado pelo Termo de Cooperação Técnica n. 020/2014 firmado entre CNJ e SERASA. O ente público, por sua vez, tem a opção de promover a inclusão sem interferência ou necessidade de autorização do magistrado, mas isso pode lhe acarretar despesas a serem negociadas em convênio próprio.

A situação ideal a ser buscada é que os entes públicos firmem convênios mais vantajosos com os órgãos de proteção ao crédito, de forma a conseguir a quitação das dívidas com o mínimo de gastos e o máximo de eficiência. Isso permitirá que, antes de ajuizar execuções fiscais que abarrotarão as prateleiras (físicas ou virtuais) do Judiciário, com baixo percentual de êxito (conforme demonstrado ano após ano no “Justiça em Números” do CNJ), os entes públicos se valham do protesto da CDA ou da negativação dos devedores, com uma maior perspectiva de sucesso.

Porém, no momento atual, em se tratando de execuções fiscais ajuizadas, não há justificativa legal para o magistrado negar, de forma abstrata, o requerimento da parte de inclusão do executado em cadastros de inadimplentes, baseando-se em argumentos como: 1) o art. 782, § 3º, do CPC apenas incidiria em execução definitiva de título judicial; 2) em se tratando de título executivo extrajudicial, não haveria qualquer óbice a que o próprio credor providenciasse a efetivação da medida; 3) a intervenção judicial só caberá se eventualmente for comprovada dificuldade significativa ou impossibilidade de o credor fazê-lo por seus próprios meios; 4) ausência de adesão do tribunal ao convênio SERASAJUD ou a indisponibilidade do sistema. Tais requisitos não estão previstos em lei.

Em suma, tramitando uma execução fiscal e sendo requerida a negativação do executado com base no art. 782, § 3º, do CPC, o magistrado deverá deferi-la, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito previsto na Certidão de Dívida Ativa – CDA, a exemplo da prescrição, da ilegitimidade passiva ad causam, ou outra questão identificada no caso concreto. Outro ponto importante a ser fixado é que, sendo medida menos onerosa, a anotação do nome da parte executada em cadastro de inadimplentes pode ser determinada antes de exaurida a busca por bens penhoráveis. Atende-se, assim, ao princípio da menor onerosidade da execução, positivado no art. 805 do CPC.

10.2.3.                Resultado final.

O art. 782, §3º, do CPC é aplicável às execuções fiscais, devendo o magistrado deferir o requerimento de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, preferencialmente pelo sistema SERASAJUD, independentemente do esgotamento prévio de outras medidas executivas, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito previsto na Certidão de Dívida Ativa – CDA.

DIREITO DO CONSUMIDOR

11.  Cumprimento forçado e obrigação consumerista e insuficiência do produto em estoque

RECURSO ESPECIAL

O mero fato de o fornecedor do produto não o possuir em estoque no momento da contratação não é condição suficiente para eximi-lo do cumprimento forçado da obrigação.

REsp 1.872.048-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021 (Info 686)

11.1.             Situação FÁTICA.

Rodrigo, fã de músicas antigas, adquiriu pela internet um videogame Mega Drive original. Um dia depois da compra, a loja Disapel enviou um e-mail informando a ausência do produto em estoque e que então a compra seria desfeita e o valor devolvido.

Indignado, Rodrigo ajuizou ação na qual pleiteou a condenação da loja ao fornecimento do produto e fundamentou o pedido no princípio da vinculação à oferta, mesmo que isso significasse que a loja teria de providenciar o produto de outro revendedor ou loja.

11.2.             Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1.                Questão JURÍDICA.

CDC:

Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:

I – exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade;

II – aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;

III – rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.

Art. 48. As declarações de vontade constantes de escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações de consumo vinculam o fornecedor, ensejando inclusive execução específica, nos termos do art. 84 e parágrafos.

Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

§ 1° A conversão da obrigação em perdas e danos somente será admissível se por elas optar o autor ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.

§ 2° A indenização por perdas e danos se fará sem prejuízo da multa (art. 287, do Código de Processo Civil).

§ 3° Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.

§ 4° O juiz poderá, na hipótese do § 3° ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito.

§ 5° Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra, impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial.

11.2.2.  A loja deve se “virar nos 30” para entregar o produto comprado?

R: Aham!

Como se infere do art. 35 do CDC, a recusa à oferta oferece ao CONSUMIDOR a prerrogativa de optar, alternativamente e a sua livre escolha, pelo cumprimento forçado da obrigação, aceitar outro produto, ou rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, somada a perdas e danos.

O CDC consagrou expressamente, em seus arts. 48 e 84, o princípio da preservação dos negócios jurídicos, segundo o qual se pode determinar qualquer providência a fim de que seja assegurado o resultado prático equivalente ao adimplemento da obrigação de fazer, razão pela qual a solução de extinção do contrato e sua conversão em perdas e danos é a ultima ratio, o último caminho a ser percorrido.

As opções do art. 35 do CDC são INTERCAMBIÁVEIS e produzem, para o consumidor, efeitos práticos equivalentes ao adimplemento, pois guardam relação com a satisfação da intenção validamente manifestada ao aderir à oferta do fornecedor, por meio da previsão de resultados práticos equivalentes ao adimplemento da obrigação de fazer ofertada ao público.

A impossibilidade do cumprimento da obrigação de entregar coisa, no contrato de compra e venda, que é consensual, deve ser restringida exclusivamente à inexistência absoluta do produto, na hipótese em que não há estoque e não haverá mais, pois aquela espécie, marca e modelo não é mais fabricada.

Assim, a possibilidade ou não do cumprimento da escolha formulada livremente pelo consumidor deve ser aferida à luz da boa-fé objetiva, de forma que, sendo possível ao fornecedor cumprir com a obrigação, entregando ao consumidor o produto anunciado, ainda que obtendo-o por outros meios, como o adquirindo de outros revendedores, não há razão para se eliminar a opção pelo cumprimento forçado da obrigação.

11.2.3.                Resultado final.

O mero fato de o fornecedor do produto não o possuir em estoque no momento da contratação não é condição suficiente para eximi-lo do cumprimento forçado da obrigação.

DIREITO EMPRESARIAL

12.  Proibição do administrador aprovar suas próprias contas e sociedades de apenas dois sócios

RECURSO ESPECIAL

O fato de a sociedade ter somente dois sócios não é suficiente para afastar a proibição de o administrador aprovar suas próprias contas.

REsp 1.692.803-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021(Info 686)

12.1.             Situação FÁTICA.

A indústria Bormann S.A. é uma sociedade anônima fechada e tem apenas dois sócios: José e Wilker. José é o diretor-presidente da companhia. Em determinado momento, o sócio restante Wilker ajuizou ação com o objetivo de anular decisões tomadas na assembleia geral ordinária (AGO) da sociedade empresária.

Entre as decisões questionadas estão aumento da remuneração do diretor presidente (lembra o Congresso Nacional de certo país), distribuição de dividendos e aprovação das contas do exercício anterior. Entende que tais decisões devem ser anuladas em razão ter havido votação do Diretor-Presidente aprovando suas próprias contas e não terem sido distribuídos os dividendos obrigatórios.

12.2.             Análise ESTRATÉGICA.

12.2.1.                Questão JURÍDICA.

Lei n. 6.404/1976:

Art. 115. O acionista deve exercer o direito a voto no interesse da companhia; considerar-se-á abusivo o voto exercido com o fim de causar dano à companhia ou a outros acionistas, ou de obter, para si ou para outrem, vantagem a que não faz jus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a companhia ou para outros acionistas.                       

§ 1º o acionista não poderá votar nas deliberações da assembléia-geral relativas ao laudo de avaliação de bens com que concorrer para a formação do capital social e à aprovação de suas contas como administrador, nem em quaisquer outras que puderem beneficiá-lo de modo particular, ou em que tiver interesse conflitante com o da companhia.

Art. 133. Os administradores devem comunicar, até 1 (um) mês antes da data marcada para a realização da assembléia-geral ordinária, por anúncios publicados na forma prevista no artigo 124, que se acham à disposição dos acionistas:

I – o relatório da administração sobre os negócios sociais e os principais fatos administrativos do exercício findo;

II – a cópia das demonstrações financeiras;

III – o parecer dos auditores independentes, se houver.

IV – o parecer do conselho fiscal, inclusive votos dissidentes, se houver; e                          

V – demais documentos pertinentes a assuntos incluídos na ordem do dia.

Art. 134. Instalada a assembléia-geral, proceder-se-á, se requerida por qualquer acionista, à leitura dos documentos referidos no artigo 133 e do parecer do conselho fiscal, se houver, os quais serão submetidos pela mesa à discussão e votação.

§ 6º As disposições do § 1º, segunda parte, não se aplicam quando, nas sociedades fechadas, os diretores forem os únicos acionistas.

12.2.2.  O administrador pode aprovar as próprias contas?

R: NÃO!

Nos termos do artigo 115, § 1º, da Lei n. 6.404/1976 (LSA), o acionista não poderá votar nas deliberações da assembleia-geral relativas à aprovação de suas contas como administrador. O artigo 134, § 6º, do mesmo diploma legal, entretanto, ressalva a situação em que os diretores forem os únicos acionistas da companhia fechada, autorizando, nesse caso, que participem da votação relativa aos documentos elencados no artigo 133, dentre os quais, os relatórios da administração, os demonstrativos financeiros e o parecer do conselho fiscal.

O texto legal não faz nenhuma ressalva quanto aos acionistas serem diretores somente em certo período do exercício. Ademais, ao se adotar esse entendimento, estaria se inaugurando um questionamento acerca de qual seria o prazo mínimo para ser afastada a proibição do artigo 115, § 1º, da LSA (uma semana, um mês, um trimestre), esvaziando o conteúdo legal.

Dessa forma, o fato de a sociedade ter somente 2 (dois) sócios não é suficiente para afastar a proibição de o administrador aprovar suas próprias contas, pois o acionista minoritário deverá proferir seu voto no interesse da sociedade, podendo responder por eventual abuso.

12.2.3.                Resultado final.

O fato de a sociedade ter somente dois sócios não é suficiente para afastar a proibição de o administrador aprovar suas próprias contas.

DIREITO PENAL

13.  (I)Legalidade da sentença de pronúncia fundamenta exclusivamente em elementos colhidos no inquérito policial.

HABEAS CORPUS

É ilegal a sentença de pronúncia fundamentada exclusivamente em elementos colhidos no inquérito policial.

HC 589.270, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021.(Info 686)

13.1.             Situação FÁTICA.

Caio foi pronunciado por supostamente ter cometido os crimes de homicídio e corrupção de menor. Ocorre que as provas que fundamentaram a sentença de pronúncia foram colhidas exclusivamente no inquérito policial e não foram confirmadas em juízo, conforme inclusive o Juiz ,Dr. Creisson, fez constar em sentença.

Inconformada, a defesa de caio impetrou Habeas Corpus no qual sustentou a nulidade da sentença por falta de fundamentação, pois teria sido baseada exclusivamente em elementos obtidos na fase policial, sem afirmar a presença de qualquer indício de quem teria sido o autor, o executor ou partícipe da empreitada criminosa.

13.2.             Análise ESTRATÉGICA.

13.2.1.                Questão JURÍDICA.

Código de Processo Penal:

Art. 155.  O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.

Art. 406.  O juiz, ao receber a denúncia ou a queixa, ordenará a citação do acusado para responder a acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.

§ 1o  O prazo previsto no caput deste artigo será contado a partir do efetivo cumprimento do mandado ou do comparecimento, em juízo, do acusado ou de defensor constituído, no caso de citação inválida ou por edital.

§ 2o  A acusação deverá arrolar testemunhas, até o máximo de 8 (oito), na denúncia ou na queixa.

§ 3o  Na resposta, o acusado poderá argüir preliminares e alegar tudo que interesse a sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, até o máximo de 8 (oito), qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário.

Art. 421.  Preclusa a decisão de pronúncia, os autos serão encaminhados ao juiz presidente do Tribunal do Júri.

§ 1o  Ainda que preclusa a decisão de pronúncia, havendo circunstância superveniente que altere a classificação do crime, o juiz ordenará a remessa dos autos ao Ministério Público.

§ 2o  Em seguida, os autos serão conclusos ao juiz para decisão.

Constituição Federal:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

13.2.2. Possível a pronúncia apenas com os elementos colhidos no inquérito?

R: Especificamente neste julgado, o STJ entendeu que NÃO. Mas o tema é polêmico.

A atual posição do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema admite a pronúncia do acusado com base em indícios derivados do inquérito policial, sem que isso represente afronta ao art. 155 do Código de Processo Penal (HC 547.442/MT, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 15/4/2020).

Assim, na linha dos precedentes do STJ e do Supremo Tribunal Federal, embora não seja possível sustentar uma condenação com base em prova produzida exclusivamente na fase inquisitorial, não ratificada em juízo, tal entendimento não se aplica à sentença de pronúncia (HC 314.454/SC, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 17/2/2017). Isso não significa, no entanto, que inexistam decisões mais antigas no sentido de não admitir o juízo positivo de pronúncia sem lastro em prova produzida sob o crivo judicial (HC 341.072/RS, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 29/4/2016 e REsp 1.254.296/RS, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 2/2/2016).Nesse sentido, em nova orientação, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (HC 180.144/GO, Ministro Celso de Mello, DJe 22/10/2020) enfrentou a questão e decidiu pela impossibilidade do juízo de pronúncia nas condições mencionadas, partindo da premissa de que o Processo Penal se estrutura sobre as garantias e objetiva resguardar do arbítrio estatal o status libertatis do acusado.

O entendimento perfilado pela Suprema Corte parte da ausência de amparo constitucional e legal do princípio do in dubio pro societate no sistema processual penal brasileiro pós constituição de 1988. Em sentido oposto, considerado o assento constitucional do princípio da presunção de inocência, art. 5º, LVII, da Constituição Federal, em todo seu alcance, como norma de tratamento, norma probatória e norma de juízo, incumbe ao órgão acusador comprovar o alegado em todas as fases e procedimentos.

Como meio de concretização, e com o mesmo status de garantia constitucional, o contraditório e a ampla defesa (e no caso do júri de plenitude de defesa) impedem a prolação de sentença de pronúncia com base exclusiva em elementos produzidos no inquérito policial, nos termos do art. 155 do Código de Processo Penal.

De fato, admitir que a sentença de pronúncia se baseie em provas produzidas no inquérito igualaria em densidade à decisão de recebimento de uma denúncia. O procedimento do jus accusationis, delineado entre os arts. 406 e 421 do Código de Processo Penal, disciplina toda a produção probatória destinada a embasar o deslinde da primeira fase do procedimento. Trata-se de arranjo legal que busca evitar a submissão dos acusados ao Conselho de Sentença de forma temerária, não havendo razão de ser em tais exigências legais, fosse admissível a atividade inquisitorial como suficiente.

É INCOMPATÍVEL com os postulados do Estado Democrático de Direito admitir, no bojo do processo penal, a hipótese de que os jurados possam condenar alguém, com base em íntima convicção, em julgamento que sequer deveria ter sido admitido. Os julgamentos proferidos pelo Tribunal do Júri possuem peculiaridades em permanente discussão, até mesmo nos Tribunais Superiores, a respeito da possibilidade de revisão dos julgamentos de mérito, da extensão dessa revisão, o que torna, mais acertado exigir maior rigor na fase de pronúncia                                                   

13.2.3.                Resultado final.

É ilegal a sentença de pronúncia fundamentada exclusivamente em elementos colhidos no inquérito policial.

Descrição: C:\Users\rafael.almeida\Downloads\Corujas_Estratégia_Concursos-2016-01-14\Corujas Estratégia Concursos\novas-corujas-14.png
STJ. 5ª Turma. AgRg no AgRg no AREsp 1702743/GO, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 15/12/2020. STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 1609833/RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 06/10/2020STJ. 5ª Turma. HC 560.552/RS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 23/02/2021. STJ. 6ª Turma. HC 589.270, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 23/02/202
PODENÃO PODE

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PACIFICADO NO STJ E SUPERADO O INFO 682

14.  (Im)possibilidade da conversão de ofício da prisão em flagrante em preventiva e ausência da audiência de custódia.

RECURSO EM HABEAS CORPUS

Após o advento da Lei n. 13.964/2019, não é possível a conversão ex offício da prisão em flagrante em preventiva, mesmo nas situações em que não ocorre audiência de custódia.

RHC 131.263, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por maioria, julgado em 24/02/2021.(Info 686)

14.1.             Situação FÁTICA.

Rafael foi preso em flagrante pelo crime de tráfico de drogas. A prisão foi convertida de ofício em preventiva, mesmo sem a realização da audiência de custódia.

Em Habeas Corpus, a defesa de Rafael sustentou que o juiz não pode converter/decretar a prisão preventiva de ofício, seja durante o curso da investigação, seja durante o curso da ação penal, exigindo prévio requerimento do MP ou representação da autoridade policial, sob pena de violação ao sistema acusatório.

14.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

14.2.1.                Questão JURÍDICA.

Código de Processo Penal:

 Art. 3º-A. O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação

Art. 282.  As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: 

§ 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público.

 Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente:

II – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou

Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

 Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.  

14.2.2. Possível a conversão de “ofício”?

R: NÃO!

Discute-se acerca da possibilidade de se decretar a prisão preventiva de ofício, mesmo se decorrente de prisão flagrante e mesmo se não tiver ocorrido audiência de custódia, em face do que dispõe a Lei n. 13.964/2019, em razão da divergência de posicionamento entre as Turmas criminais que compõem esta Corte Superior de Justiça.

Contudo, após o advento da Lei n. 13.964/2019, não é mais possível a conversão da prisão em flagrante em preventiva sem provocação por parte ou da autoridade policial, do querelante, do assistente, ou do Ministério Público, mesmo nas situações em que não ocorre audiência de custódia.

Nesse sentido, deve-se considerar o disposto no art. 3º-A do CPP, que reafirma o sistema acusatório em que o juiz atua, vinculado à provocação do órgão acusador; no art. 282, § 2º, do CPP, que vincula a decretação de medida cautelar pelo juiz ao requerimento das partes ou quando, no curso da investigação criminal, à representação da autoridade policial ou a requerimento do Ministério Público; e, finalmente, no art. 311, também do CPP, que é expresso ao vincular a decretação da prisão preventiva a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou à representação da autoridade policial. Vale ressaltar que a prisão preventiva não é uma consequência natural da prisão flagrante, logo é uma situação nova que deve respeitar o disposto, em especial, nos arts. 311 e 312 do CPP.

Não se vê, ainda, como o disposto no inciso II do art. 310 do CPP – possibilidade de o juiz converter a prisão em flagrante em preventiva quando presentes os requisitos do art. 312 e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão – pode autorizar a conversão da prisão em flagrante em preventiva sem pedido expresso nesse sentido, já que tal dispositivo deve ser interpretado em conjunto com os demais que cuidam da prisão preventiva.

Dessa forma, pode, sim, o juiz converter a prisão em flagrante em preventiva desde que, além de presentes as hipóteses do art. 312 e ausente a possibilidade de substituir por cautelares outras, haja o pedido expresso por parte ou do Ministério Público, ou da autoridade policial, ou do assistente ou do querelante.

Por fim, a não realização da audiência de custódia (qualquer que tenha sido a razão para que isso ocorresse ou eventual ausência do representante do Ministério Público quando de sua realização) não autoriza a prisão, de ofício, considerando que o pedido para tanto pode ser formulado independentemente de sua ocorrência. O fato é que as novas disposições legais trazidas pela Lei n. 13.964/2019 impõem ao Ministério Público e à Autoridade Policial a obrigação de se estruturarem de modo a atender os novos deveres que lhes foram impostos.

14.2.3.                Resultado final.

Após o advento da Lei n. 13.964/2019, não é possível a conversão ex officio da prisão em flagrante em preventiva, mesmo nas situações em que não ocorre audiência de custódia.

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