Artigo

O Problema dos Bodes

Fala, pessoal!

Tudo bem?

Hoje, o aluno Octávio Victor me pediu para explicar o famoso Problema dos Bodes, também conhecido como Problema de Monty Hall.

Esse Problema surgiu a partir de um concurso televisivo dos Estados Unidos chamado Let’s Make a Deal, exibido na década de 1970.

Eis o problema original:

Em um programa de auditório, o convidado deve escolher uma dentre três portas. Atrás de uma das portas há um carro e atrás de cada uma das outras duas há um bode. O convidado ganhará o que estiver atrás da porta; devemos supor neste problema que o convidado prefere ganhar o carro. O procedimento para escolha da porta é o seguinte: o convidado escolhe inicialmente, em caráter provisório, uma das três portas. O apresentador do programa, que sabe o que há atrás de cada porta, abre neste momento uma das outras duas portas, sempre revelando um dos dois bodes. O convidado agora tem a opção de ficar com a primeira porta que ele escolheu ou trocar pela outra porta fechada. Suponha que o candidato escolha por trocar pela outra porta fechada. A probabilidade de que, agora, nessa nova escolha, o convidado tenha escolhido a porta que conduz ao carro é igual a quanto?

A finada banca ESAF cobrou esse problema no concurso do MPU em 2004. Veja como foi o enunciado da questão da ESAF:

(ESAF 2004/MPU – Técnico Administrativo)

Luís é prisioneiro do temível imperador Ivan. Ivan coloca Luís à frente de três portas e lhe diz: “Atrás de uma destas portas encontra-se uma barra de ouro, atrás de cada uma das outras, um tigre feroz. Eu sei onde cada um deles está. Podes escolher uma porta qualquer. Feita tua escolha, abrirei uma das portas, entre as que não escolheste, atrás da qual sei que se encontra um dos tigres, para que tu mesmo vejas uma das feras. Aí, se quiseres, poderás mudar a tua escolha”. Luís, então, escolhe uma porta e o imperador abre uma das portas não-escolhidas por Luís e lhe mostra um tigre. Luís, após ver a fera, e aproveitando-se do que dissera o imperador, muda sua escolha e diz: “Temível imperador, não quero mais a porta que escolhi; quero, entre as duas portas que eu não havia escolhido, aquela que não abriste”. A probabilidade de que, agora, nessa nova escolha, Luís tenha escolhido a porta que conduz à barra de ouro é igual a

a) 1/2.

b) 1/3.

c) 2/3.

d) 2/5.

e) 1.

A tentação é responder o seguinte: que importância tem mudar ou não, uma vez que restam somente duas portas? Sabe-se que por trás de uma das duas está o automóvel, e que a probabilidade de que ele esteja atrás de uma ou de outra é 50%.

Será que isso é verdade?

Vamos analisar detalhadamente. Uma vez que o convidado “escolhe” uma das três portas, o apresentador do programa, que sabe atrás de qual delas está o prêmio, procura colaborar com o participante e, para isso, abre uma das portas onde sabe que o automóvel não está.

Ora, sabemos que inicialmente, antes de qualquer informação dada pelo apresentador, a probabilidade de o candidato escolher um bode é igual a 2/3 e a probabilidade de o candidato escolher um carro é igual a 1/3.

E o mais importante de tudo: estamos adotando o fato de que o candidato trocará de porta.

Se o participante escolher um bode na sua primeira escolha (a probabilidade de esse caso ocorrer é igual a 2/3), então, das portas que sobraram, uma possui um carro e a outra possui um bode. O apresentador não tem escolha: será obrigado a abrir a porta que tem o bode. E, assim, se o participante trocar de porta, irá para a porta em que está o carro. Em outras palavras, se ele escolher um bode inicialmente (probabilidade igual a 2/3) e trocar de porta após a “dica” do apresentador, ele irá ganhar o carro.

Se o participante escolher um carro na sua primeira escolha (a probabilidade de esse caso ocorrer é igual a 1/3), então, as duas portas que sobraram possuem bodes. O apresentador estará livre para abrir qualquer uma das outras portas. E, assim, se o participante trocar de porta, irá para a porta em que está o outro bode. Em outras palavras, se ele escolher um carro inicialmente (probabilidade igual a 1/3) e trocar de porta após a “dica” do apresentador, ele irá ganhar um bode (perderá o jogo).

Em suma, adotando a estratégia de trocar a porta após a “dica” do apresentador, duas coisas podem acontecer:

i) Escolher um bode inicialmente (probabilidade igual a 2/3), o apresentador mostra o outro bode, ele troca de porta e ganha o carro.

ii) Escolher o carro inicialmente (probabilidade igual a 1/3), o apresentador mostra qualquer um dos bodes, ele troca de porta e ganha o outro bode (perde o jogo).

Se o participante trocar de porta após o apresentador mostrar um bode, ele tem uma probabilidade igual a 2/3 de ganhar o carro. Ele só ganha o carro trocando de porta se escolher um bode inicialmente, pois o apresentador mostrará o outro bode e ele trocará pela porta do carro!

Surpreendente não?

E se o participante não trocar de porta?

A probabilidade de ganhar, neste caso, é igual a 1/3.

Conclusão: No problema de Monty Hall, o candidato terá maior chance de ganhar se trocar de porta. Esse problema gerou uma polêmica imensa entre os matemáticos da época.

Agora, para convencer-se ainda mais (se é que isso é necessário), vejamos exaustivamente todas as possibilidades. Estas são as três possíveis configurações:

                       Porta 1    Porta 2     Porta 3

Posição 1         Carro       Bode        Bode

Posição 2         Bode       Carro        Bode

Posição 3         Bode       Bode         Carro

Suponhamos que temos a posição 1.

Possibilidade 1: O candidato escolhe a porta 1. O apresentador abre a porta 2 ou a porta 3. O apresentador tem liberdade neste caso.

Se o candidato trocar, PERDE.

Se não trocar, GANHA.

Possibilidade 2: O candidato escolhe a porta 2. O apresentador só pode abrir a porta 3.

Se o candidato trocar, GANHA.

Se o candidato não trocar, PERDE.

Possibilidade 3: O candidato escolhe a porta 3. O apresentador só pode abrir a porta 2.

Se o candidato trocar, GANHA.

Se o candidato não trocar, PERDE.

Em resumo, o candidato GANHA em duas das vezes se trocar e só GANHA uma vez se não o fizer. Ou seja, GANHA o dobro das vezes se trocarem.

A resposta do problema é 2/3. Letra C.

A ESAF pegou pesado com essa questão! Provavelmente a maioria dos candidatos marcou a letra A (1/2).

Espero que tenham gostado.

Um forte abraço,

Guilherme Neves

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Veja os comentários
  • Agora sim entendi de uma vez por todas esse problema...Se for pela intuição, sempre o apresentador terá uma porta com um tigre (bode) para abrir. Para o candidato, é indiferente a informação do apresentador. Contudo, quando se calcula as probabilidades é evidente que deve-se trocar de porta. Um forte abraço Prof. Guilherme! Ótima explicação!
    Anderson Girolimeto em 08/12/19 às 22:36