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Jurisprudência em Processo Civil: Ônus da Prova Grafotécnica em Contrato Bancário

Olá pessoal, tudo bem?

Sou professor de Direito Processual Civil no Estratégia Concursos. Desde 2015 trabalhamos a disciplina com materiais escritos e em vídeo no site. Tenho acompanhado mudança de padrão na cobrança de questões recentes em Processo Civil. A jurisprudência que até então não era comum, passou a ser cada vez mais cobrada em prova. Em face disso, vamos manter atualizados entendimentos jurisprudenciais de forma didática para você. Apenas aquilo que pode ser cobrado em prova, analisado de forma direta e objetiva.

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Neste artigo, vamos estudar o precedente do REsp 1.846.649, da relatoria do ministro do STJ Marco Aurélio Belizze, julgado em 24/11/2021, com acórdão publicado em 9/12/2012. Esse precedente foi firmado em sede de recurso especial repetitivo, então essa tese é de aplicação obrigatória pelos Juízes e Tribunais.

Esse caso traz importante discussão em contratos bancários: no caso de alegação de falsidade de assinatura, de quem é o ônus de provar a veracidade?

Por exemplo, imagine que Jorge recebe uma notificação do Banco Diamante avisando que ele está devendo R$ 10.000,00 em razão de um empréstimo. Jorge não se recorda de ter feito empréstimo com o Banco Diamante, por isso, ajuizou ação declaratória de inexistência da obrigação. Na sua contestação, o Banco Pérola afirma que o contrato foi devidamente constituído e, como prova, juntou aos autos o instrumento com a assinatura de Jorge. Jorge, analisando a assinatura, verifica que ela não é sua: é uma assinatura falsa. Portanto, Jorge alega no processo a falsidade da assinatura. 

Foi exatamente esse tipo de situação que o STJ analisou nesse precedente: quem tem o dever de promover a perícia grafotécnica para avaliar se a assinatura é, ou não, de Jorge?

No recurso especial, o recorrente era uma instituição financeira. O banco alegou que as assinaturas apresentadas por instituições financeiras devem ser presumidas como verdadeiras. Nesse caso, a impugnação da autenticidade deve ser provada por quem fez a alegação de falsidade. Assim, o ônus de realizar a perícia grafotécnica seria do consumidor, que fez a alegação de falsidade.

Para responder à questão, devemos nos recordar do instituto do ônus da prova.

O ônus da prova é um encargo que as partes do processo assumem para que possam obter um resultado útil no processo. As regras de ônus da prova têm a intenção de facilitar a obtenção da verdade real no processo: com a aplicação dessas regras, as partes sabem exatamente o que terão que fazer para provar seus argumentos.

Quer dizer, lembrando do nosso caso hipotético, o primeiro ponto discutido era justamente a respeito da própria existência do contrato: afinal, houve ou não contrato de empréstimo? Jorge diz que não houve, o Banco diz que houve. Como resolver esse ponto? Com a aplicação das regras de ônus da prova.

E a regra básica sobre ônus de prova é a que consta do art. 373 do CPC/2015: o autor deve provar os fatos constitutivos do seu direito e o réu deve provar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor.

Imagine, por exemplo, ainda a respeito do débito de Jorge, que o Banco promovesse ação de cobrança do débito. Digamos que o Banco não juntasse qualquer prova do contrato. Nesse caso, por padrão, o ônus de prova de que a obrigação foi efetivamente constituída é do banco, portanto, o pedido deveria ser julgado improcedente em razão da ausência de prova da constituição da obrigação.  

No nosso primeiro caso, no entanto, o Banco juntou aos autos o documento assinado.

Pois bem, especialmente para os documentos, temos uma regra especial no art. 408 do CPC/2015: há presunção de veracidade, em relação ao signatário, das declarações que constam de documento particular escrito e assinado ou mesmo somente assinado.

Então, como há, nos autos, instrumento contratual que, pelo menos inicialmente, parece ter sido assinado por Jorge, presumem-se verdadeiras as declarações do contrato em relação a Jorge. Então, se no contrato assinado está escrito que Jorge contraiu dívida de R$ 10.000,00 que deveria ser paga em tal data, presume-se que a obrigação está constituída, então, Jorge efetivamente deve os R$ 10.000,00 ao Banco.

Mas agora surge outra questão: o banco juntou aos autos o instrumento do contrato com a assinatura, no entanto, o devedor alega a falsidade da assinatura. E agora?

O próprio CPC/2015 nos dá a resposta: o art. 429 especifica o ônus probatório em relação aos incidentes nas provas documentais.

No caso de alegação de falsidade do documento ou de preenchimento abusivo, o ônus da prova cabe à própria parte que arguir o fato.  

Por exemplo, se Jorge, ao invés de impugnar a autenticidade da assinatura, alegasse que o valor contratado foi, na verdade de apenas R$ 1.000,00, ou seja, alegasse que o valor do débito era falso ou foi preenchido indevidamente, o ônus de provar essa falsidade seria de Jorge.

Por outro lado, o art. 429 tem um inciso II, que traz outra regra: quando for impugnada a autenticidade, a prova cabe à parte que produziu o documento. Quando falamos em autenticidade, estamos falando de autor, de quem foi o autor da assinatura, ou seja, quem de fato assinou.

Esse é o nosso caso inicial. Jorge alega que o documento não é autêntico: quer dizer, apesar de constar do instrumento assinatura que o Banco afirma que é de Jorge, Jorge, por sua vez, nega que a assinatura seja sua. É como se Jorge dissesse: eu não sou o autor desse documento, eu não assinei, portanto, não é autêntico.

Então, aplicando essa regra, podemos resolver nosso problema inicial: quem deve provar que a assinatura de Jorge é autêntica? É, de acordo com o art. 429, II, a parte que produziu no processo o documento, ou seja, o Banco

O ônus de provar a autenticidade do documento é da instituição financeira que juntou aos autos o documento. Ou seja, é o Banco que vai ter o custo de promover a perícia grafotécnica. O custo será ressarcido ao final pelo réu, se o Banco sair vitorioso no processo.

Perceba que não precisamos, para responder à questão, discutir sobre distribuição dinâmica do ônus da prova ou de presunção em favor do consumidor. Basta utilizar as regras gerais do processo civil.  

E como podemos responder à alegação do Banco de que há presunção de veracidade das assinaturas nos instrumentos apresentados por instituições financeiras? Devemos simplesmente observar que não há previsão legal para essa presunção. Na verdade, aplica-se de forma plena o art. 429, que nós acabamos de estudar.

E qual foi, afinal, a tese firmada pelo STJ?

Foi a seguinte: “Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. 6º, 368 e 429, II).”

Com isso concluímos a análise desse importante precedente, que resolve uma questão bastante recorrente no Judiciário, afinal, as demandas a respeito de contratos bancários são massificadas e há muitos casos semelhantes.

Forte abraço,

Prof. Ricardo Torques

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