Artigo

Furto mediante fraude, estelionato e apropriação indébita

Olá, estudantes do Direito! Preparados para mais uma sessão de aprendizado? Neste artigo estudaremos as diferenças entre furto mediante fraude, estelionato e apropriação indébita.

Para melhor compreensão, o assunto foi dividido nos seguintes tópicos:

  • Introdução
  • Furto mediante fraude
  • Estelionato
  • Apropriação indébita
  • Questões de concurso

Vamos lá!

furto mediante fraude

Introdução

As teorias de formação do Estado se fundamentam em determinadas premissas que justificam a sua existência. Praticamente todos os pensadores que estudam o assunto concordam que dentre os motivos que ensejaram a formação das commonwealth (sociedades em comum), sobre as quais as concepções atuais de Estado teriam se estabelecido, a segurança foi o motivo mais importante.

Isso, porque o Estado, formado pela conjunção de forças, asseguraria a proteção dos bens mais valiosos que os seres humanos detinham. Para alguns autores, esse bem era a vida, para outros a liberdade ou a propriedade (a propriedade, para Locke, é entendida em sentido amplo, englobando também a vida e a liberdade).

Atualmente, os bens jurídicos tutelados pelo Direito Penal são praticamente os mesmos que eram guardados pelas primeiras formas de organização social. Por exemplo, o patrimônio manteve sua relevância social e jurídica até mesmo nos Estados Sociais. A CF de 88, em vários artigos, visa a proteger o patrimônio e a conciliar seu uso com as funções sociais que lhe são inerentes. No Código Penal existe capítulo específico que trata dos crimes patrimoniais.

Como se vê, os direitos de propriedade e o patrimônio são um dos pilares que sustentam a sociedade. Hayek defendia que sem os direitos à propriedade não existiria sequer liberdade individual.

Tamanha a importância dada a essa espécie de direito que as bancas organizadoras de concursos não poderiam negligenciar sua cobrança em provas. De fato, esse assunto tem alta incidência nos certames públicos.

Diante disso, estudaremos nos tópicos a seguir cada um desses tipos penais a fim de aprender a diferenciar furto mediante fraude, estelionato e apropriação indébita.

Furto mediante fraude

O furto mediante fraude é uma modalidade qualificada do furto:

Art. 155 – Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

(…)

Furto qualificado

§ 4º – A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:

(…)

II – com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

Entender o conceito de fraude, apesar de ser uma tarefa fácil, no âmbito penal ela deve ser feita por inferência de dispositivos legais, pois o Código Penal não apresenta sua definição.

Uma outra forma de entender o conceito de fraude é recorrer às fontes linguísticas e fazer interpretação gramatical ou teleológica do tipo penal. Segundo o dicionário Michaelis, a fraude é ato de má-fé que tem por objetivo fraudar ou ludibriar alguém. É cantiga, engano, sofisticação. Também pode ser considerada como mentira ardilosa ou ato de falsificar documentos, marcas e produtos.

A definição constante no Michaelis é praticamente a mesma adotada no meio jurídico. Sendo assim, o furto mediante fraude pode ser compreendido como a subtração de coisa alheia mediante engano, mentira sofisticada, falsificação ou ludibriamento, com redução da vigilância da vítima sobre a coisa subtraída.

Estelionato

O estelionato está tipificado no art. 171 do CP:

Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.

O que caracteriza o estelionato é a entrega voluntária da coisa ao estelionatário. O dolo no crime de estelionato está presente antes da inversão da coisa.

A fraude é um elemento que está presente tanto no furto mediante fraude quanto no estelionato. Quando o produto do crime é uma coisa móvel, pode haver confusão entre as duas condutas. De fato, elas são muito parecidas. Mas a grande diferença entre o furto mediante fraude e o estelionato reside no modo como a posse da coisa é vertida ao criminoso:

  • No furto mediante fraude, a fraude é utilizada para burlar a vigilância da vítima sobre o bem e facilitar sua subtração. O autor do crime subtrai o bem. A vítima não entrega o produto do crime ao autor.
  • No estelionato a própria vítima, mediante erro, entrega conscientemente a coisa ao criminoso.

Apropriação indébita

A apropriação indébita está prevista no art. 168 do CP:

Art. 168 – Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:

Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Não é comum confundir a apropriação indébita com o furto. Mas é plausível que se confunda a apropriação indébita com o estelionato praticado mediante a obtenção de vantagem por meio de coisa transferida por meio de sua entrega. Isso, pois em ambos os casos a inversão da posse se faz de maneira voluntária. A diferença entre os dois tipos é que:

  • no estelionato, a vítima é induzida a erro e a posse é de má-fé desde o início.
  • na apropriação indébita a coisa é recebida inicialmente de boa-fé e sua posse ou detenção mantida licitamente. Somente em razão de fato superveniente, que retire a legitimidade da posse ou da detenção da coisa, é que fica caracterizada a apropriação indébita, devendo, ainda, haver recusa do possuidor ou detentor a devolvê-la.

Questões de concurso

Na prova do ENAM 2024.2 esses tipos penais foram cobrados da seguinte maneira:

(FGV – 2024) Antônio assistia a uma série televisiva noturna, quando foi surpreendido pelo inesperado toque da campainha de sua casa. Ao atender a porta, deparou-se com o funcionário de uma renomada loja de vinhos, que indagou se aquele seria o endereço para onde havia sido pedido por João da Silva uma celebrada garrafa de vinho, já devidamente paga por Pix pelo destinatário, no valor de R$1.500,00 (mil e quinhentos reais). Percebendo o erro, mas dominado pela vontade de degustar a bebida, Antônio confirmou falsamente ser ele o autor da encomenda, dando ainda como correto o endereço, o que fez com que a garrafa fosse, em seguida, a ele voluntariamente entregue, sendo consumida por Antônio antes do engano ser percebido pela loja vendedora do produto e por seu funcionário. Sobre a hipótese narrada, assinale a afirmativa correta.

(A) Antônio responderá por furto qualificado pela fraude.

(B) Antônio responderá por crime de estelionato.

(C) Antônio responderá por crime de apropriação indébita

simples.

(D) Antônio responderá por apropriação indébita de coisa alheia

havida por erro.

(E) Antônio responderá por furto qualificado pela destreza.

Comentários: A posse da coisa foi de má-fé desde o início. Logo não poderia ser apropriação indébita. No caso, o entregador foi induzido a erro para entregar a coisa, caracterizando o estelionato. Não fica configurado furto, pois não houve subtração da garrafa de vinho, mas sim entrega voluntária.

Já no ENAM 2024.1 houve duas questões sobre o tema:

(FGV – 2024) Ricardo, com a intenção de ter um carro, apresentou-se como manobrista na frente de um restaurante e, assim, logrou iludir Carolina, que lhe entregou as chaves de seu veículo, pensando que este seria estacionado em segurança. Em seguida, Ricardo se apossou do veículo de Carolina. Assinale a opção que indica, corretamente, o crime praticado por Ricardo.

(A) Estelionato.

(B) Apropriação indébita.

(C) Furto mediante fraude.

(D) Furto mediante abuso de confiança.

(E) Apropriação de coisa havida por erro.

Comentário: No caso em tela, não fica configurado furto, pois a coisa foi entregue voluntariamente. Não se fala em apropriação indébita, pois a posse foi ilícita e de má-fé desde o início. Resta, então, a alternativa de estelionato, pois a vítima foi induzida ao erro para entregar o bem ao estelionatário.

(FGV – 2024) Alberto, mágico profissional, em uma relojoaria, pede ao vendedor para ver um relógio suíço, de elevado valor. O vendedor atende a seu pedido, e Alberto coloca o relógio em seu pulso, sob o pretexto de querer ver se o acessório fica bem em seu braço. Ato contínuo, ele distrai o vendedor, tirando-lhe a atenção, momento em que, valendo-se da ligeireza de seus movimentos, retira rapidamente o relógio do pulso, substituindo-o por uma cópia idêntica, que traz em seu bolso, e a entrega ao vendedor, que nada percebe. Alberto, então, agradece a atenção, pergunta quanto custa o relógio e, depois de afirmar que vai pensar um pouco mais, deixa a loja, levando consigo a peça. Diante do caso narrado, Alberto deverá responder por

(A) estelionato.

(B) furto simples.

(C) furto qualificado.

(D) apropriação indébita simples.

(E) apropriação indébita qualificada.

Comentário: No caso em tela não se trata de apropriação, pois ainda que o relojoeiro tenha entregado o bem ao criminoso, o fez de maneira temporária, com o intuito de reavê-lo logo em seguida, sem intuito de inversão da posse. Pelo mesmo motivo não fica configurado o estelionato, que dependeria da voluntariedade na inversão da posse. Resta então a alternativa do furto qualificado, uma vez que o criminoso usou de sua destreza para reduzir a vigília da vítima sobre a coisa em relação a qual subtraiu. Assim, a inversão da posse por iniciativa do criminoso combinada com a fraude caracteriza furto qualificado mediante fraude.

Gostou do texto? Deixe um comentário abaixo.

https://www.instagram.com/gabrielssantos96

Deixe seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Veja os comentários
  • Nenhum comentário enviado.