Artigo

Informativo STJ 691 Comentado


Informativo nº 691 do STJ COMENTADO está disponível para quem está ligado aqui conosco no Estratégia Carreiras Jurídicas!

DOWNLOAD do PDF AQUI!

Sumário

Sumário.. 1

DIREITO CONSTITUCIONAL. 3

1.      Prerrogativa dos Membros do MP junto aos Tribunais de Contas para requerer informações diretamente aos jurisdicionados. 3

1.1.        Situação FÁTICA. 3

1.2.        Análise ESTRATÉGICA. 3

DIREITO ADMINISTRATIVO… 5

2.      (Im)Prescritibilidade da pretensão de expedição de novo precatório ou RPV após o cancelamento.. 5

2.1.        Situação FÁTICA. 5

2.2.        Análise ESTRATÉGICA. 5

A DIREITO PROCESSUAL CIVIL. 7

3.      (Im)Possibilidade da revisão de ofício das astreintes. 7

3.1.        Situação FÁTICA. 7

3.2.        Análise ESTRATÉGICA. 7

4.      (Im)Possibilidade de majoração dos honorários advocatícios a serem fixados em liquidação de sentença. 10

4.1.        Situação FÁTICA. 10

4.2.        Análise ESTRATÉGICA. 11

5.      Alegação da Fazenda Pública de excesso de execução sem a apresentação da memória de cálculos e não conhecimento da arguição.. 12

5.1.        Situação FÁTICA. 12

5.2.        Análise ESTRATÉGICA. 12

6.      Impugnação ao cumprimento de sentença arbitral e prazo decadencial 14

6.1.        Situação FÁTICA. 14

6.2.        Análise ESTRATÉGICA. 14

DIREITO TRIBUTÁRIO… 16

7.      Sociedades simples e direito ao recolhimento do ISSQN na forma privilegiada. 16

7.1.        Situação FÁTICA. 16

7.2.        Análise ESTRATÉGICA. 17

DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.. 19

8.      (Im)Possibilidade da rescisão de sentença concessiva de adoção ao fundamento de que o adotado, à época da adoção, não a desejava verdadeiramente. 19

8.1.        Situação FÁTICA. 19

8.2.        Análise ESTRATÉGICA. 19

DIREITO DO CONSUMIDOR.. 21

9.      Alienação de terrenos a consumidores de baixa renda em loteamento irregular e dano moral coletivo.. 21

9.1.        Situação FÁTICA. 21

9.2.        Análise ESTRATÉGICA. 22

DIREITO EMPRESARIAL. 24

10.         Terceiro de boa-fé e perda do crédito de natureza cambial em vista da quitação feita ao endossante (credor originário), sem resgate da cártula. 24

10.1.     Situação FÁTICA. 25

10.2.     Análise ESTRATÉGICA. 25

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. 27

11.         Pacote anticrime e exigibilidade de representação da vítima no crime de estelionato (PACIFICOU O ENTENDIMENTO DO INFO 674) 27

11.1.     Situação FÁTICA. 27

11.2.     Análise ESTRATÉGICA. 27

12.         Termo final da suspensão do prazo prescricional pela expedição de carta rogatória para citação do acusado no exterior. 29

12.1.     Situação FÁTICA. 29

12.2.     Análise ESTRATÉGICA. 29

13.         Requerimento da autoridade policial pela segregação cautelar ou manifestação do Ministério Público favorável à prisão preventiva e vício da inobservância da formalidade de prévio requerimento. 31

13.1.     Situação FÁTICA. 31

13.2.     Análise ESTRATÉGICA. 31

PARA TESTAR SEU CONHECIMENTO… 34

14.        QUESTÕES. 34

14.1.     Questões objetivas: CERTO ou ERRADO. 34

14.2.     Gabarito. 34

DIREITO CONSTITUCIONAL

1.      Prerrogativa dos Membros do MP junto aos Tribunais de Contas para requerer informações diretamente aos jurisdicionados

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA

É assegurada, aos membros do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, a prerrogativa de requerer informações diretamente aos jurisdicionados do respectivo Tribunal, sem subordinação ao Presidente da Corte.

RMS 51.841/CE, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, por maioria, julgado em 06/04/2021. (Info 691)

1.1. Situação FÁTICA.

Um membro do Ministério Público do Tribunal de Contas requereu à Secretaria Estadual de Esportes   cópias de um convênio no qual foram investidos recursos públicos.

O Presidente do Tribunal de Contas de ofício, recebeu a resposta do Secretário de Estado, não repassou ao MP de Contas, e, sem qualquer comunicação ou anúncios prévios, levou a resposta a plenário, sob autuação processual, votando pelo arquivamento da resposta mediante o argumento de ausência de poderes do Ministério Público para formular qualquer sorte de requerimento para além dos muros da Corte de Contas.

Ainda teria comunicado ao Governador do Estado, a todos os secretários de governo e ao Procurador-Geral do Estado no sentido de que não fossem respondidos os ofícios expedidos diretamente pelo MP de Contas.

1.2. Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.  Questão JURÍDICA.

Constituição Federal:

Art. 73. O Tribunal de Contas da União, integrado por nove Ministros, tem sede no Distrito Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo o território nacional, exercendo, no que couber, as atribuições previstas no art. 96.

§ 2º Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão escolhidos:

I – um terço pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, sendo dois alternadamente dentre auditores e membros do Ministério Público junto ao Tribunal, indicados em lista tríplice pelo Tribunal, segundo os critérios de antigüidade e merecimento;

Art. 130. Aos membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas aplicam-se as disposições desta seção pertinentes a direitos, vedações e forma de investidura.

1.2.2.     O MPTC pode requerer tais informações diretamente?

R: SIM!!!

A Constituição da República, em seu art. 73, § 2º, I, prevê a existência do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, outorgando aos seus membros, nos termos do art. 130, as mesmas prerrogativas, vedações e forma de investidura relativas ao Parquet, enquanto função ESSENCIAL à Justiça.

O Supremo Tribunal Federal, na exegese desses dispositivos, firmou orientação, há muito, segundo a qual o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas é órgão de extração constitucional, cuja existência jurídica tem sua gênese na Lei Maior, sem ostentar, entretanto, fisionomia institucional própria.

Outrossim, ainda no âmbito do Supremo Tribunal Federal, restou consolidado o entendimento de que o legislador constituinte, ao assegurar aos membros do Ministério Público de Contas as robustas garantias do Ministério Público comum, deferiu àqueles um “status jurídico especial”, de modo a possibilitar que sua atuação funcional se dê de modo exclusivo e autônomo, em relação a tal Corte.

1.2.3.  Resultado final.

É assegurada, aos membros do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, a prerrogativa de requerer informações diretamente aos jurisdicionados do respectivo Tribunal, sem subordinação ao Presidente da Corte.

DIREITO ADMINISTRATIVO

2.      (Im)Prescritibilidade da pretensão de expedição de novo precatório ou RPV após o cancelamento

RECURSO ESPECIAL

É prescritível a pretensão de expedição de novo precatório ou RPV após o cancelamento estabelecido pelo art. 2º da Lei n. 13.463/2017.

REsp 1.833.358/PB, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 06/04/2021.(Info 691)

2.1. Situação FÁTICA.

Geneci, credor de um valor devido pela União, faleceu em 25/06/2012. Em 05/11/2012, foi depositada Requisição de Pequeno Valor em seu nome.

Já em 2017, a RPV foi cancelada por força do advento da Lei nº 13.463/2017. Em 23/01/2018, foi postulada a expedição de novo requisitório de pagamento.

2.2. Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei n. 13.463/2017:

Art. 2º Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo credor e estejam depositados há mais de dois anos em instituição financeira oficial.

2.2.2.     Ocorreu a prescrição?

R: Para a Segunda Turma… Sim…

Conforme o entendimento da Segunda Turma do STJ, é prescritível a pretensão de expedição de novo precatório ou RPV após o cancelamento estabelecido pelo art. 2º da Lei n. 13.463/2017.Nos termos do REsp 1.859.409/RN, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 16/6/2020, DJe 25/6/2020: “1. Estabelecem, respectivamente, os arts. 2º e 3º da Lei 13.463/2017: “Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo credor e estejam depositados há mais de dois anos em instituição financeira oficial”, “cancelado o precatório ou a RPV, poderá ser expedido novo ofício requisitório, a requerimento do credor”. 2. A pretensão de expedição de novo precatório ou nova RPV, após o cancelamento de que trata o art. 2º da Lei nº 13.463/2017, não é imprescritível.”

O fundamento é o de que, por aplicação do princípio da actio nata, conforme o referido precedente, “o direito do credor de que seja expedido novo precatório ou nova RPV começa a existir na data em que houve o cancelamento do precatório ou RPV cujos valores, embora depositados, não tenham sido levantados”.

CUIDADO!!

É imprescritível a pretensão de expedição de novo precatório ou nova Requisição de Pequeno Valor – RPV, após o cancelamento de que trata o art. 2º da Lei n. 13.463/2017. REsp 1.856.498-PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, por maioria, julgado em 06/10/2020, DJe 13/10/2020 (Info 681)

SEGUNDA TURMAPRIMEIRA TURMA
Princípio da actio nataNão há, por opção do legislador, prazo prescricional
PRESCRITÍVELIMPRESCRITÍVEL

2.2.3.  Resultado final.

É prescritível a pretensão de expedição de novo precatório ou RPV após o cancelamento estabelecido pelo art. 2º da Lei n. 13.463/2017.

A DIREITO PROCESSUAL CIVIL

3.      (Im)Possibilidade da revisão de ofício das astreintes

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM  AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

É possível que o magistrado, a qualquer tempo, e mesmo de ofício, revise o valor desproporcional das astreintes.

EAREsp 650.536/RJ, Rel. Min. Raul Araújo, Corte Especial, por maioria, julgado em 07/04/2021.(Info 691)

3.1. Situação FÁTICA.

Vânia ajuizou ação de obrigação de fazer cc/indenizatória em razão do descumprimento do contrato de seguro de saúde pela Brasa Saúde, que não pagou devidamente e em prazo adequado os reembolsos decorrentes de tratamento fisioterápico a que se submetera o menor João, portador de paralisia cerebral infantil.

A tutela antecipada foi deferida e determinando que a parte ré reembolsasse as despesas com o tratamento fisioterápico, sob pena de incidência de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) caso não realizasse o cumprimento imediato da determinação.

Muito tempo depois, quando já transitada em julgada a condenação e fixada e paga a indenização de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), verificou-se o reembolso a menor pela ré. Foi deflagrada então a fase de cumprimento da sentença na qual pleitearam os autores a quantia de R$ 664.000,00 (seiscentos e sessenta e quatro mil reais), sem prejuízo dos reembolsos futuros.

Ocorre que, face o requerimento/pedido então formulado pelo devedor para a redução do valor das astreintes, o juiz promoveu a redução do valor global da multa para o total de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

3.2. Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.  Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.

§ 1º Para atender ao disposto no caput , o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.

§ 2º O mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas será cumprido por 2 (dois) oficiais de justiça, observando-se o disposto no art. 846, §§ 1º a 4º , se houver necessidade de arrombamento.

§ 3º O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando injustificadamente descumprir a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de desobediência.

§ 4º No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, aplica-se o art. 525 , no que couber.

§ 5º O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional

Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.

§ 1º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que:

I – se tornou insuficiente ou excessiva;

II – o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.

3.2.2.     Pode revisar o valos das astreintes?

R: SIM!!!

É possível a revisão do quantum fixado a título de multa cominatória, na via do recurso uniformizador, por meio do exame da questão de direito processual adjacente – preclusão da discussão do valor da multa cominatória -, mormente diante do flagrante exagero da quantia alcançada, em afronta aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade e à vedação do enriquecimento sem causa.

Ressalte-se que a finalidade das astreintes é conferir efetividade ao comando judicial, coibindo o comportamento desidioso da parte contra a qual foi imposta obrigação judicial. Seu escopo não é indenizar ou substituir o adimplemento da obrigação, tampouco servir ao enriquecimento imotivado da parte credora, devendo, pois, serem observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Nessa toada, a própria legislação que prevê a possibilidade de imposição de multa cominatória autoriza o magistrado, a requerimento da parte ou de ofício, alterar o valor e a periodicidade da multa, quando, em observância aos referidos princípios, entender ser esta insuficiente ou excessiva, nos termos do art. 461, § 6º, do CPC/1973 e, atualmente, do art. 537, § 1º, do CPC/2015.Interpretando as referidas normas processuais, o Superior Tribunal de Justiça firmou orientação de que o valor das astreintes, previstas no citado art. 461 do Código de Processo Civil revogado (correspondente ao art. 536 do Código vigente), é estabelecido sob a cláusula rebus sic stantibus, de maneira que, quando se tornar irrisório ou exorbitante ou desnecessário, pode ser modificado ou até mesmo revogado pelo magistrado, a qualquer tempo, até mesmo de ofício, ainda que o feito esteja em fase de execução ou cumprimento de sentença, não havendo falar em preclusão ou ofensa à coisa julgada. Considera-se que a multa não tem uma finalidade em si mesma e assim como pode ser fixada de ofício pelo juiz, em qualquer fase do processo, também pode ser revista ex officio por este, a qualquer tempo.

A propósito, no julgamento do Recurso Especial 1.333.988/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos, a Segunda Seção, no Tema 706, consolidou a tese de que “a decisão que comina astreintes não preclui, não fazendo tampouco coisa julgada”.Por sua vez, a Primeira Seção, também julgando Recurso Especial Repetitivo para analisar o Tema 98 (possibilidade de imposição de multa diária a ente público, para compeli-lo a fornecer medicamento a pessoa desprovida de recursos financeiros), afirmou a não incidência do instituto da coisa julgada na revisão do valor das astreintes.

Nesse contexto, com respaldo na legislação e na jurisprudência do STJ, pode o julgador, a requerimento da parte ou de ofício, a qualquer tempo, ainda que o feito esteja em fase de cumprimento de sentença, modificar o valor das astreintes, seja para majorá-lo, para evitar a conduta recalcitrante do devedor em cumprir a decisão judicial, seja para minorá-lo, quando seu montante exorbitar da razoabilidade e da proporcionalidade, ou até mesmo para excluir a multa cominatória, quando não houver mais justa causa para sua mantença.

Nessa linha de intelecção, ainda que já tenha havido redução anterior do valor da multa cominatória, não há vedação legal a que o magistrado, amparado na constatação de que o total devido a esse título alcançou montante elevado, reexamine a matéria novamente, caso identifique, diante de um novo quadro, que a cominação atingiu patamar desproporcional à finalidade da obrigação judicial imposta.

Nesse diapasão, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, é recomendável a redução, quantas vezes forem necessárias, do valor das astreintes, sobretudo nas hipóteses em que a sua fixação ensejar valor superior ao discutido na ação judicial em que foi imposta, a fim de evitar eventual enriquecimento sem causa.

Desse modo, fixada a premissa de que as astreintes não se sujeitam à preclusão ou à coisa julgada, deve-se definir os critérios para a melhor adequação do valor da multa quando ele se tornar excessivo ou irrisório.

Acerca da temática, a Quarta Turma, em importante precedente, de relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão (AgInt no AgRg no AREsp 738.682/RJ), delineou que o julgador, na fixação e/ou alteração do valor da multa cominatória, deve-se balizar segundo dois “vetores de ponderação: a) efetividade da tutela prestada, para cuja realização as astreintes devem ser suficientemente persuasivas; e b) vedação ao enriquecimento sem causa do beneficiário, porquanto a multa não é, em si, um bem jurídico perseguido em juízo”. Assim, lançou o eminente Relator alguns parâmetros para nortear o magistrado na difícil tarefa de fixar o quantum devido a título de astreintes: “i) valor da obrigação e importância do bem jurídico tutelado; ii) tempo para cumprimento (prazo razoável e periodicidade); iii) capacidade econômica e de resistência do devedor; iv) possibilidade de adoção de outros meios pelo magistrado e dever do credor de mitigar o próprio prejuízo (duty to mitigate de loss)”.Assim, entende-se que o magistrado, diante da desproporção que alcançou o valor da multa diária originariamente arbitrada, deve, com base nos referidos critérios, de ofício ou a requerimento da parte, fazer novo balizamento do quantum, garantindo, com isso, a eficácia da decisão judicial e, ao mesmo tempo, evitando o enriquecimento sem causa do beneficiário.

3.2.3.  Resultado final.

É possível que o magistrado, a qualquer tempo, e mesmo de ofício, revise o valor desproporcional das astreintes.

4.      (Im)Possibilidade de majoração dos honorários advocatícios a serem fixados em liquidação de sentença

EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO RECURSO ESPECIAL

Não cabe ao STJ majorar honorários advocatícios ainda a serem fixados em liquidação de sentença, na forma do inciso II, do § 4º, do art. 85 do CPC/2015.

EDCL no REsp 1.785.364/CE, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 06.04.2021. (Info 691)

4.1. Situação FÁTICA.

Ricardo ajuizou ação contra a União e teve seu pedido julgado procedente em primeiro grau. Ocorre que, por se tratar de sentença ilíquida, Juiz decidiu que os honorários seriam fixados na forma do art. 85,§4º do CPC, ou seja, o percentual devido somente seria fixado por ocasião da liquidação da sentença.

A União interpôs sucessivos recursos, sendo o último um recurso especial, mas a decisão inicial foi mantida. Insatisfeito (e mui ansiosamente), Ricardo opôs embargos de declaração no qual requereu a majoração dos honorários advocatícios deferidos na forma do art. 85,§11 do CPC.

4.2. Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.  Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

§ 4º Em qualquer das hipóteses do § 3º :

II – não sendo líquida a sentença, a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V, somente ocorrerá quando liquidado o julgado;

4.2.2.     Possível a majoração?

R: Logicamente que NÃO!!!

No caso analisado, as instâncias ordinárias condenaram a parte sucumbente ao pagamento de honorários “em percentual incidente sobre o valor da condenação a ser fixado por ocasião da liquidação de sentença, na forma preconizada no inciso II, do § 4º, do art. 85 do CPC/2015”.O dispositivo estabelece que, proferida sentença ilíquida nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a definição do percentual dos honorários só ocorrerá após a liquidação do julgado. O objetivo da norma é evitar desproporção na fixação da verba honorária, que tem maior chance de acontecer enquanto não conhecida a base de cálculo.

Sendo esse o caso analisado, não há como o STJ majorar honorários ainda não definidos, não apenas por IMPOSSIBILIDADE LÓGICA, mas também o art. 85, § 4º, II, do CPC/2015, deve ser observado, inclusive, pela instância superior.

O fato de a parte sucumbente ter insistido em sua pretensão, sem êxito no recurso interposto, deve ser considerado pelo Juízo da liquidação no momento em que for definir o percentual da verba honorária.

4.2.3.  Resultado final.

Não cabe ao STJ majorar honorários advocatícios ainda a serem fixados em liquidação de sentença, na forma do inciso II, do § 4º, do art. 85 do CPC/2015.

5.      Alegação da Fazenda Pública de excesso de execução sem a apresentação da memória de cálculos e não conhecimento da arguição

RECURSO ESPECIAL

A alegação da Fazenda Pública de excesso de execução sem a apresentação da memória de cálculos com a indicação do valor devido não acarreta, necessariamente, o não conhecimento da arguição.

REsp 1.887.589/GO, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 06.04.2021.(Info 691)

5.1. Situação FÁTICA.

Milena ajuizou uma ação contra o Município de Goiânia e saiu vencedora. O Município foi condenado ao pagamento de certo valor. Milena então juntou aos autos um cálculo discriminado referente ao valor que entendia devido.

O Município alegou excesso de execução, mas deixou de juntar o próprio cálculo sob a alegação de falta de pessoal especializado no tema. O Juízo então deixou de conhecer da alegação de excesso de execução, em face da não apresentação da memória de cálculos com a indicação do valor que o município entendia devido, consoante teor do art. 535, § 2º, do CPC.

Porém, em recurso, o Tribunal de Justiça local concedeu à Fazenda municipal o prazo de 30 (trinta) dias para a apresentação da planilha de cálculos.

5.2. Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.  Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 526. É lícito ao réu, antes de ser intimado para o cumprimento da sentença, comparecer em juízo e oferecer em pagamento o valor que entender devido, apresentando memória discriminada do cálculo.

§ 1º O autor será ouvido no prazo de 5 (cinco) dias, podendo impugnar o valor depositado, sem prejuízo do levantamento do depósito a título de parcela incontroversa.

§ 2º Concluindo o juiz pela insuficiência do depósito, sobre a diferença incidirão multa de dez por cento e honorários advocatícios, também fixados em dez por cento, seguindo-se a execução com penhora e atos subsequentes.

Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu representante judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para, querendo, no prazo de 30 (trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução, podendo arguir:

§ 2º Quando se alegar que o exequente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante do título, cumprirá à executada declarar de imediato o valor que entende correto, sob pena de não conhecimento da arguição.

5.2.2.     A arguição pode ser conhecida?

R: Dá uma segunda chance…

O art. 535, § 2º, do CPC prevê consequência específica para a não indicação do valor que a Fazenda Pública entende correto em sua impugnação ao cumprimento de sentença, qual seja, o não conhecimento da arguição de excesso de execução.

Todavia, o STJ possui jurisprudência no sentido de que “eventuais erros materiais nos cálculos apresentados para o cumprimento de sentença não estão sujeitos à preclusão, sendo possível ao magistrado, inclusive, encaminhar os autos à contadoria, de ofício, para apurar se os cálculos estão em conformidade com o título em execução”(AgInt no AREsp 1.364.410/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 4/5/2020, DJe 8/5/2020).

Assim, em regra, a ausência de indicação do valor que a Fazenda Pública entende como devido na impugnação enseja o não conhecimento da arguição de excesso, por existência de previsão legal específica nesse sentido (art. 535, §2º, do CPC). No entanto, tal previsão legal não afasta o poder-dever de o magistrado averiguar a exatidão dos cálculos à luz do título judicial que lastreia o cumprimento de sentença, quando verificar a possibilidade de existência de excesso de execução.

Tal entendimento encontra respaldo inclusive no próprio Código de Ritos, em seu art. 526, §§ 1º e 2º, cuja aplicação é cabível nos cumprimentos de sentença contra a Fazenda Pública, com as devidas adaptações.

Nesse sentido, se é cabível a remessa dos autos à contadoria do juízo para a verificação dos cálculos, é razoável a concessão de prazo para apresentação da respectiva planilha pela Fazenda Pública, documento que pode inclusive vir a facilitar o trabalho daquele órgão auxiliar em eventual necessidade de manifestação.

5.2.3.  Resultado final.

A alegação da Fazenda Pública de excesso de execução sem a apresentação da memória de cálculos com a indicação do valor devido não acarreta, necessariamente, o não conhecimento da arguição.

6.    Impugnação ao cumprimento de sentença arbitral e prazo decadencial

RECURSO ESPECIAL

A impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, devido à ocorrência dos vícios elencados no art. 32 da Lei n. 9.307/1996, possui prazo decadencial de 90 (noventa) dias.

REsp 1.900.136/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 06/04/2021.(Info 691)

6.1. Situação FÁTICA.

Barra Sul Shopping Center e Gandi Empreendimentos firmaram “Instrumento Particular de Constituição de Consórcio”, e, em razão de conflitos na execução do empreendimento (shopping center), recorreram ao Juízo arbitral, sobrevindo a sentença.

Ocorre que Barra Sul apresentou impugnação à ação de cumprimento de sentença, suscitando a nulidade da sentença arbitral por cerceamento de defesa, em razão de indeferimento da produção de prova pericial.

O Tribunal de Justiça local, ao analisar o pedido de nulidade do procedimento arbitral com fundamento no cerceamento de defesa, verificou que a impugnação está baseada exclusivamente no art. 32, VIII, da Lei 9.307/96, e reconheceu, então, a decadência, porquanto a impugnação foi apresentada após o decurso do prazo de 90 dias previsto no art. 33, § 1º da citada lei e a matéria não integraria aquela prevista no art. 525, § 1º, do CPC.

6.2. Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei n. 9.307/1996:

Art. 32. É nula a sentença arbitral se:

I – for nula a convenção de arbitragem;

II – emanou de quem não podia ser árbitro;

III – não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei;

IV – for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem;

V – não decidir todo o litígio submetido à arbitragem;

VI – comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva;

VII – proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e

VIII – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2º, desta Lei.

Art. 33.  A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a declaração de nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei. 

§ 1o A demanda para a declaração de nulidade da sentença arbitral, parcial ou final, seguirá as regras do procedimento comum, previstas na Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), e deverá ser proposta no prazo de até 90 (noventa) dias após o recebimento da notificação da respectiva sentença, parcial ou final, ou da decisão do pedido de esclarecimentos. 

§ 3o A decretação da nulidade da sentença arbitral também poderá ser requerida na impugnação ao cumprimento da sentença, nos termos dos arts. 525 e seguintes do Código de Processo Civil, se houver execução judicial.

CPC/2015:

Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação.

§ 1º Na impugnação, o executado poderá alegar:

I – falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia;

II – ilegitimidade de parte;

III – inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;

IV – penhora incorreta ou avaliação errônea;

V – excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;

VI – incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução;

VII – qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença.

6.2.2.     Decai em 90 dias?

R: Absolutamente!

A declaração de nulidade da sentença arbitral pode ser pleiteada, judicialmente, por duas vias: (i) ação declaratória de nulidade de sentença arbitral (art. 33, § 1º, da Lei n. 9.307/1996) ou (ii) impugnação ao cumprimento de sentença arbitral (art. 33, § 3º, da Lei n. 9.307/1996).Se a declaração de invalidade for requerida por meio de ação própria, há também a imposição de prazo decadencial. Esse prazo, nos termos do art. 33, § 1º, da Lei de Arbitragem, é de 90 (noventa) dias.

Sua aplicação, reitera-se, é restrita ao direito de obter a declaração de nulidade devido à ocorrência de qualquer dos vícios taxativamente elencados no art. 32 da referida norma.

Assim, embora a nulidade possa ser suscitada em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, se a execução for ajuizada após o decurso do prazo decadencial da ação de nulidade, a defesa da parte executada fica limitada às matérias especificadas pelo art. 525, § 1º, do CPC/2015, sendo vedada a invocação de nulidade da sentença com base nas matérias definidas no art. 32 da Lei n. 9.307/1996.

6.2.3.  Resultado final.

A impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, devido à ocorrência dos vícios elencados no art. 32 da Lei n. 9.307/1996, possui prazo decadencial de 90 (noventa) dias.

DIREITO TRIBUTÁRIO

7.      Sociedades simples e direito ao recolhimento do ISSQN na forma privilegiada

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

Sociedades simples fazem jus ao recolhimento do ISSQN na forma privilegiada previsto no art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei n. 406/1968 quando a atividade desempenhada não se sobrepuser à atuação profissional e direta dos sócios na condução do objeto social da empresa, sendo irrelevante para essa finalidade o fato de a pessoa jurídica ter se constituído sob a forma de responsabilidade limitada.

EAREsp 31.084/MS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por maioria, julgado em 24/03/2021.(Info 691)

7.1. Situação FÁTICA.

Med Rim Médicos Ltda é uma sociedade uniprofissional de médicos sem caráter empresarial, na qual os serviços médicos são prestados de forma pessoal e direta pelos sócios, ainda que o tipo societário conste como limitada.

Em razão disso, a sociedade de médicos requereu o recolhimento do ISSQN na forma privilegiada dos §§ 1o. e 3o. do art. 9o. do Decreto-Lei 406/1968.

A possibilidade foi negada administrativamente pelo Município sob a  justificativa de que tal forma de recolhimento não se compatibiliza com a adoção do regime da sociedade limitada, em razão do caráter empresarial das sociedades limitadas.

7.2. Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.  Questão JURÍDICA.

Decreto-Lei n. 406/1968:

Art 9º A base de cálculo do impôsto é o preço do serviço.

§ 1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o impôsto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.

§ 3° Quando os serviços a que se referem os itens 1, 4, 8, 25, 52, 88, 89, 90, 91 e 92 da lista anexa forem prestados por sociedades, estas ficarão sujeitas ao imposto na forma do § 1°, calculado em relação a cada profissional habilitado, sócio, empregado ou não, que preste serviços em nome da sociedade, embora assumindo responsabilidade pessoal, nos termos da lei aplicável.

Código Civil:

Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.

7.2.2.     Faz jus ao recolhimento privilegiado?

R: Mas é claro!

No caso, trata-se de sociedade simples limitada, em que o objeto social é a prestação de serviços médicos desenvolvidos diretamente pelos sócios que compõem o quadro societário, cuja responsabilidade pessoal é regida pelo Código de Ética Médica.

Pautado nas mais variadas concepções factuais, hodiernamente a jurisprudência do STJ tem negado às sociedades limitadas, a benesse da tributação prevista no Decreto-Lei n. 406/1968, tendo por parâmetro, ora a forma com que a sociedade é constituída (limitada, por exemplo), ora baseada no método de distribuição de lucros de seus sócios entre si, se proporcionalmente ao serviço prestado por cada um em nome da sociedade, ou se proporcionalmente à sua participação no capital social.

Neste cenário, há de se esclarecer que o fato de uma sociedade simples adotar o regime de sociedade limitada, não a torna automaticamente uma sociedade empresária. Em verdade, as municipalidades ao interpretar a norma do artigo 9º, § 3º, do Decreto-Lei n. 406/1968 confundem a limitação da responsabilidade perante as obrigações societárias, limitada às quotas de capital social de cada um dos sócios, com a responsabilidade pessoal pela prestação do serviço, que decorre das normas que regulamentam a profissão dos sócios.

A propósito, as profissões descritas no rol do Decreto-Lei n. 406/1968 possuem cada qual, uma lei específica regulamentando e disciplinando a responsabilidade civil pelo exercício da profissão para o público, seja de forma autônoma, seja através de uma pessoa jurídica constituída para esse fim. Nesse cenário, conjugando esses regramentos profissionais, com a norma tributária que instituiu o benefício da alíquota fixa, não se pode condicionar o gozo da referida benesse fiscal ao modelo societário elegido pelos sócios para a consecução do objeto social da pessoa jurídica. A rigor, a responsabilidade pessoal descrita no artigo 9º, § 3º, do Decreto-Lei n. 406/1968 é aquela descrita nas leis de regência de cada profissão.

Desse modo, quando os serviços prestados forem de caráter exclusivamente intelectual, não se pode a partir da forma de constituição societária, avaliar o caráter empresarial da sociedade, como o único elemento para se definir se ela faz jus ao benefício da alíquota fixa de ISSQN, porquanto existem sociedades limitadas que não são empresárias, conforme preveem expressamente os artigos 982 e 983 do Código Civil.

Assim, a fruição do direito à tributação privilegiada do ISSQN depende, basicamente, da análise da atividade efetivamente exercida pela sociedade, para saber se ela se enquadra dentre aquelas elencadas no § 3º do art. 9º do Decreto-lei n. 406/1968 (itens 1, 4, 8, 25, 52, 88, 89, 90, 92 da lista anexa à LC n. 56/1987), bem como se perquirir se a atividade intelectual, científica, literária ou artística desempenhada pela pessoa jurídica não constitua elemento de empresa, ou melhor, nos termos do artigo 966 do Código Civil, que os fatores de produção, circulação e de organização empresarial não se sobreponham à atuação profissional e direta dos sócios na condução do objeto social da empresa, sendo irrelevante para essa finalidade o fato de a pessoa jurídica ter se constituído sob a forma de responsabilidade limitada.

7.2.3.  Resultado final.

Sociedades simples fazem jus ao recolhimento do ISSQN na forma privilegiada previsto no art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei n. 406/1968 quando a atividade desempenhada não se sobrepuser à atuação profissional e direta dos sócios na condução do objeto social da empresa, sendo irrelevante para essa finalidade o fato de a pessoa jurídica ter se constituído sob a forma de responsabilidade limitada.

DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

8.      (Im)Possibilidade da rescisão de sentença concessiva de adoção ao fundamento de que o adotado, à época da adoção, não a desejava verdadeiramente

RECURSO ESPECIAL

É possível, mesmo ante a regra da irrevogabilidade da adoção, a rescisão de sentença concessiva de adoção ao fundamento de que o adotado, à época da adoção, não a desejava verdadeiramente e de que, após atingir a maioridade, manifestou-se nesse sentido.

REsp 1.892.782/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 06/04/2021.(Info 691)

8.1. Situação FÁTICA.

Henrique e Eliane requereram a adoção de Marcelo, menor com quem já tinham relacionamento em virtude de apadrinhamento afetivo. A adoção foi deferida em razão do relatório psicológico favorável e prévio vínculo afetivo.

Algum tempo depois, o casal ajuizou ação rescisória objetivando a rescisão da sentença concessiva da adoção. Conforme o casal, Marcelo não teria demonstrado interesse em realmente ser filho deles, tampouco ir à escola ou ter atividades complementares. Ainda, Marcelo fugiu de casa e deixou uma carta na qual afirmou que não queria mais ser adotado e tampouco frequentar o colégio.

O MP ficou sabendo da situação e ajuizou uma “Medida de Proteção c/c Manutenção de Acolhimento Institucional”. Durante este procedimento, Marcelo foi ouvido por uma psicóloga e afirmou que somente concordara com a adoção anterior em razão do medo do fechamento do abrigo no qual vivia anteriormente, e não por realmente querer viver com o casal.

8.2. Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.  Questão JURÍDICA.

ECA:

Art. 39. A adoção de criança e de adolescente reger-se-á segundo o disposto nesta Lei.

§ 1 o A adoção é medida excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa, na forma do parágrafo único do art. 25 desta Lei.

 Art. 45. A adoção depende do consentimento dos pais ou do representante legal do adotando.

§ 2º. Em se tratando de adotando maior de doze anos de idade, será também necessário o seu consentimento.

CPC/2015:

Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:

VI – for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória;

8.2.2.     Possível a rescisão da sentença de adoção?

R: É… Possível…

A interpretação SISTEMÁTICA e TELEOLÓGICA do disposto no § 1º do art. 39 do ECA conduz à conclusão de que a irrevogabilidade da adoção não é regra absoluta, podendo ser afastada sempre que, no caso concreto, verificar-se que a manutenção da medida não apresenta reais vantagens para o adotado, tampouco é apta a satisfazer os princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança e do adolescente.

Por outro lado, a sentença concessiva de adoção, ainda quando proferida em procedimento de jurisdição voluntária, pode ser encoberta pelo manto protetor da coisa julgada material e, como consectário lógico, figurar como objeto de ação rescisória.

Nesse contexto, se extrai do Relatório Psicológico que não houve, de fato, consentimento do adotando com relação à adoção, conforme exige o § 2º do art. 45 do ECA. Não se trata de vedada alegação de fato novo, mas sim de prova pericial nova que se refere à existência ou inexistência de ato jurídico anterior à sentença, qual seja, o consentimento do adolescente.

No caso, subsome-se ao previsto no inciso VI do art. 966 do CPC/2015, porquanto admitiu o magistrado singular, ao deferir a adoção, que houve o consentimento do adotando, conforme exigido pelo § 2º do art. 45 do ECA, o que, posteriormente, revelou-se falso.

Passando ao largo de qualquer objetivo de estimular a revogabilidade das adoções, situações como a vivenciada pelos adotantes e pelo adotado demonstram que nem sempre as presunções estabelecidas dogmaticamente, suportam o crivo da realidade, razão pela qual, em caráter EXCEPCIONAL, é dado ao julgador demover entraves legais à plena aplicação do direito e à tutela da dignidade da pessoa humana.

8.2.3.  Resultado final.

É possível, mesmo ante a regra da irrevogabilidade da adoção, a rescisão de sentença concessiva de adoção ao fundamento de que o adotado, à época da adoção, não a desejava verdadeiramente e de que, após atingir a maioridade, manifestou-se nesse sentido.

DIREITO DO CONSUMIDOR

9.      Alienação de terrenos a consumidores de baixa renda em loteamento irregular e dano moral coletivo

RECURSO ESPECIAL

A alienação de terrenos a consumidores de baixa renda em loteamento irregular, tendo sido veiculada publicidade enganosa sobre a existência de autorização do órgão público e de registro no cartório de imóveis, configura lesão ao direito da coletividade e dá ensejo à indenização por dano moral coletivo.

REsp 1.539.056/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 06/04/2021.(Info 691)

9.1. Situação FÁTICA.

A Imobiliária Tranqueira Ltda iniciou um empreendimento imobiliário que consistia na venda de terrenos para pessoas de baixa renda. Foram feitos vários anúncios no sentido de que o empreendimento era regular e devidamente autorizado pelo Município.

Ocorre que nada disso era verdade. Após a compra, os adquirentes descobriram que o loteamento estaria em situação irregular e não seria possível fazer o registro da propriedade.

O Ministério Público entrou na parada e requereu a condenação dos réus ao pagamento de danos morais aos compradores e a ainda danos morais coletivos. No entanto, tanto o Juízo de Primeiro Grau quanto o Tribunal local entenderam que não caberia o dano moral coletivo em razão da impossibilidade de reconhecimento do prejuízo moral transindividual.

9.2. Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei n. 6.766/1979:

Art. 50. Constitui crime contra a Administração Pública.

I – dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, sem autorização do órgão público competente, ou em desacordo com as disposições desta Lei ou das normas pertinentes do Distrito Federal, Estados e Municipíos;

II – dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem observância das determinações constantes do ato administrativo de licença;

III – fazer ou veicular em proposta, contrato, prospecto ou comunicação ao público ou a interessados, afirmação falsa sobre a legalidade de loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, ou ocultar fraudulentamente fato a ele relativo.

Pena: Reclusão, de 1(um) a 4 (quatro) anos, e multa de 5 (cinco) a 50 (cinqüenta) vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Parágrafo único – O crime definido neste artigo é qualificado, se cometido.

I – por meio de venda, promessa de venda, reserva de lote ou quaisquer outros instrumentos que manifestem a intenção de vender lote em loteamento ou desmembramento não registrado no Registro de Imóveis competente.

II – com inexistência de título legítimo de propriedade do imóvel loteado ou desmembrado, ressalvado o disposto no art. 18, §§ 4o e 5o, desta Lei, ou com omissão fraudulenta de fato a ele relativo, se o fato não constituir crime mais grave.                         (Redação dada pela Lei nº 9.785, de 1999)

Pena: Reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa de 10 (dez) a 100 (cem) vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Art. 51. Quem, de qualquer modo, concorra para a prática dos crimes previstos no artigo anterior desta Lei incide nas penas a estes cominadas, considerados em especial os atos praticados na qualidade de mandatário de loteador, diretor ou gerente de sociedade.

Constituição Federal de 1988:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

9.2.2.     Possível a indenização por dano moral coletivo?

R: SIM!!!

O dano moral transindividual – conhecido como “dano moral coletivo” -, caracteriza-se pela prática de conduta antijurídica que, de forma absolutamente injusta e intolerável, viola valores éticos essenciais da sociedade, implicando um dever de reparação, que tem por escopo prevenir novas condutas antissociais (função dissuasória), punir o comportamento ilícito (função sancionatório-pedagógica) e reverter, em favor da comunidade, o eventual proveito patrimonial obtido pelo ofensor (função compensatória indireta).

Tal categoria de dano moral é aferível, portanto, in re ipsa, ou seja, reclama a mera apuração de uma conduta ilícita que, de maneira injusta e intolerável, viole valor ético-jurídico fundamental da sociedade, revelando-se despicienda a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral.

No presente caso, a pretensão reparatória de dano moral coletivo – deduzida pelo Ministério Público estadual na ação civil pública – tem por causas de pedir a alienação de terrenos em loteamento irregular (ante a violação de normas de uso e ocupação do solo) e a veiculação de publicidade enganosa a consumidores de baixa renda, que teriam sido submetidos a condições precárias de moradia.

As instâncias ordinárias reconheceram a ilicitude da conduta dos réus que, utilizando-se de ardil e omitindo informações relevantes para os consumidores/adquirentes, anunciaram a venda de terrenos em loteamento irregular – com precárias condições urbanísticas – como se o empreendimento tivesse sido aprovado pela Municipalidade e devidamente registrado no cartório imobiliário competente; nada obstante, o pedido de indenização por dano moral coletivo foi julgado improcedente.

No afã de resguardar os direitos básicos de informação adequada e de livre escolha dos consumidores – protegendo-os, de forma efetiva, contra métodos desleais e práticas comerciais abusivas -, é que o Código de Defesa do Consumidor procedeu à criminalização das condutas relacionadas à fraude em oferta e à publicidade abusiva ou enganosa.

Os objetos jurídicos tutelados pelas citadas normas penais compreendem, os direitos de livre escolha e de informação adequada dos consumidores, cuja higidez da manifestação de vontade deve ser assegurada, de modo a atender o valor ético-jurídico encartado no princípio constitucional da dignidade humana, conformador do próprio conceito de Estado Democrático de Direito, que não se coaduna com a permanência de profundas desigualdades, tais como a existente entre o fornecedor e a parte vulnerável no mercado de consumo.

Ambos os crimes são de mera conduta, não reclamando a consumação do resultado lesivo – efetivo comprometimento da manifestação da vontade do consumidor -, donde se extrai, a evidente intolerabilidade da lesão ao direito transindividual da coletividade ludibriada, não informada adequadamente ou exposta à oferta fraudulenta ou à publicidade enganosa ou abusiva.

Sob a mesma ótica, destaca-se precedente da Segunda Turma – da relatoria do eminente Ministro Herman Benjamin -, firmado por ocasião do julgamento do Recurso Especial 1.828.620/RO, segundo o qual “enganar o consumidor ou dele abusar vai muito além de dissabor irrelevante ou aborrecimento desprezível, de natural conduta cotidiana, aceitável na vida em sociedade”, por configurar prática flagrantemente antiética e ilegal que não poupa “nem pobres nem vulneráveis, nem analfabetos nem enfermos”.Outrossim, não é apenas à luz do CDC que se observa a configuração de dano moral transindividual inaceitável.

Com efeito, a Lei n. 6.766/1979 – que dispõe sobre o parcelamento do solo para fins urbanos – em seus artigos 50 e 51 (notadamente os contidos nos incisos I e II do caput do artigo 50) consubstanciam crimes de mera conduta, tendo por objeto jurídico o respeito ao ordenamento urbanístico e, por conseguinte, a defesa do meio ambiente ecologicamente equilibrado, valor ético social – intergeracional e fundamental – consagrado pela Constituição de 1988 (artigo 225), que é vulnerado, de forma grave, pela prática do loteamento irregular (ou clandestino).

Sendo clara a ofensa ao mínimo existencial da coletividade prejudicada pelo loteamento irregular – assim como a publicidade enganosa efetuada em detrimento dos consumidores -, tal conduta configura lesão intolerável a valor essencial da sociedade, o que torna a condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos plenamente viável.

9.2.3.  Resultado final.

A alienação de terrenos a consumidores de baixa renda em loteamento irregular, tendo sido veiculada publicidade enganosa sobre a existência de autorização do órgão público e de registro no cartório de imóveis, configura lesão ao direito da coletividade e dá ensejo à indenização por dano moral coletivo.

DIREITO EMPRESARIAL

10.  Terceiro de boa-fé e perda do crédito de natureza cambial em vista da quitação feita ao endossante (credor originário), sem resgate da cártula.

AGRAVO DE INSTRUMENTO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

O terceiro de boa-fé, endossatário, em operação de endosso-caução, não perde seu crédito de natureza cambial em vista da quitação feita ao endossante (credor originário), sem resgate da cártula.

AgInt no AREsp 1.635.968/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 06/04/2021.(Info 691)

10.1.             Situação FÁTICA.

Rodrigo emitiu um título de crédito (duplicata) em favor de Bruno no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais). Ocorre que Bruno devia R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) para Tadeu e, por tal razão, fez o endosso-caução do título para Tadeu como garantia da dívida.

Rodrigo pagou o valor devido a Bruno, mas não requereu a devolução do título. Bruno, malandramente, sumiu do mapa e ninguém mais dele teve notícias. Tadeu tentou cobrar o valor que lhe era devido pelo sumido, mas sem sucesso.

Indisposto a ficar no prejuízo, Tadeu então ajuizou execução de título extrajudicial contra Rodrigo pelo valor total do título, execução esta contestada por Rodrigo que afirma já ter pago o valor devido.

10.2.             Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1.                Questão JURÍDICA.

Código Civil de 2002:

Art. 324. A entrega do título ao devedor firma a presunção do pagamento.

Parágrafo único. Ficará sem efeito a quitação assim operada se o credor provar, em sessenta dias, a falta do pagamento.

Art. 887. O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei.

Art. 903. Salvo disposição diversa em lei especial, regem-se os títulos de crédito pelo disposto neste Código.

Art. 905. O possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada, mediante a sua simples apresentação ao devedor.

Parágrafo único. A prestação é devida ainda que o título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente.

10.2.2. Quem paga mal, paga duas vezes?

R: SIM!!!

Registra-se, inicialmente, que “as normas das leis especiais que regem os títulos de crédito nominados, v.g., letra de câmbio, nota promissória, cheque, duplicata, cédulas e notas de crédito, continuam vigentes e se aplicam quando dispuserem diversamente do Código Civil de 2002, por força do art. 903 do Diploma civilista. Com efeito, com o advento do Diploma civilista, passou a existir uma dualidade de regramento legal: os títulos de crédito típicos ou nominados continuam a ser disciplinados pelas leis especiais de regência, enquanto os títulos atípicos ou inominados subordinam-se às normas do novo Código, desde que se enquadrem na definição de título de crédito constante no art. 887 do Código Civil” (REsp 1.633.399/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 10/11/2016, DJe 01/12/2016).

Conquanto a duplicata seja causal apenas na sua origem/emissão, sua circulação – configurada após o aceite do sacado, ou, na sua falta, pela comprovação do negócio mercantil subjacente e o protesto – rege-se pelo princípio da ABSTRAÇÃO, desprendendo-se de sua causa original, sendo por isso inoponíveis exceções pessoais a terceiros de boa-fé, como a ausência da entrega das mercadorias compradas.

Ademais, o endosso-caução tem por finalidade garantir, mediante o penhor do título, obrigação assumida pelo endossante perante o endossatário, que desse modo assume a condição de credor pignoratício do endossante. Verificado o cumprimento da obrigação por parte do endossante, o título deve ser-lhe restituído pelo endossatário, por isso não havendo, ordinariamente, propriamente a transferência do crédito representado pelo título.

No entanto, é preciso ressaltar que o endossatário pignoratício é detentor dos direitos emergentes do título, não podendo os coobrigados invocar contra ele exceções fundadas sobre relações pessoais com o endossante, pois esse, “apesar de ser ainda o proprietário do título, transmitiu os direitos emergentes do mesmo ao endossatário, como acontece no endosso comum”.Ademais, não se pode ignorar que a “quitação regular de débito estampado em título de crédito é a que ocorre com o resgate da cártula – tem o devedor, pois, o poder-dever de exigir daquele que se apresenta como credor cambial a entrega do título de crédito (o art. 324 do Código Civil, inclusive, dispõe que a entrega do título ao devedor” (REsp 1.236.701/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 05/11/2015, DJe 23/11/2015).

Por outro lado, o art. 905 do CC, caput, estabelece que o possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada, mediante a sua simples apresentação ao devedor, e o parágrafo único estipula que a prestação é devida ainda que o título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente.

Portanto, é temerário para o direito cambial, para a circulação dos títulos de crédito, que se admita a quitação de crédito cambial, sem a exigência do resgate da cártula, notadamente se ensejar prejuízo a terceiro de boa-fé.

10.2.3.                Resultado final.

O terceiro de boa-fé, endossatário, em operação de endosso-caução, não perde seu crédito de natureza cambial em vista da quitação feita ao endossante (credor originário), sem resgate da cártula.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL

11.  Pacote anticrime e exigibilidade de representação da vítima no crime de estelionato (PACIFICOU O ENTENDIMENTO DO INFO 674)

HABEAS CORPUS

A exigência de representação da vítima no crime de estelionato não retroage aos processos cuja denúncia já foi oferecida.

HC 610.201/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Terceira Seção, por maioria, julgado em 24/03/2021.(Info 691)

11.1.             Situação FÁTICA.

A Defensoria Pública impetrou Habeas Corpus em favor de Anderson,  cidadão que fora denunciado pelo crime de estelionato anteriormente à vigência da Lei 13.964/2019.

Conforme a DPE, a norma alterada pelo Pacote Anticrime passou a exigir a representação da vítima, como condição de procedibilidade, tornando-se, assim, ação pública condicionada à representação e ainda que a mudança normativa teria caráter retroativo.        

11.2.             Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1.                Questão JURÍDICA.

Código Penal:

Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.

§ 5º Somente se procede mediante representação, salvo se a vítima for:          

I – a Administração Pública, direta ou indireta; 

II – criança ou adolescente;

III – pessoa com deficiência mental; ou

IV – maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz.

CPP:

Art. 25.  A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.

11.2.2. A norma retroage aos casos em que já fora oferecida a denúncia?

R: NÃO!!!

A controvérsia aborda a retroatividade ou não da Lei n. 13.964/19, também conhecida por Pacote Anticrime, no que toca ao seu aspecto alterador da natureza jurídica da ação penal no delito de estelionato (art. 171 do Código Penal). A ação que era pública incondicionada, como cediço, passou a exigir a representação da vítima, como condição de procedibilidade, tornando-se, assim, ação pública condicionada à representação.

A celeuma então se instalou em relação àquelas ações penais já instauradas: seria a norma retroativa? A representação da vítima seria também condição de prosseguibilidade? Ou em outros termos, a vítima, quando já instaurada a ação penal, precisa comparecer em juízo para apresentar a sua representação?A retroatividade da norma que previu a ação penal pública condicionada, como regra, no crime de estelionato, é desaconselhada por, ao menos, duas ordens de motivos.

A primeira é de caráter processual e constitucional, pois o papel dos Tribunais Superiores, na estrutura do Judiciário brasileiro é o de estabelecer diretrizes aos demais Órgãos jurisdicionais. Nesse sentido, verifica-se que o STF, por ambas as turmas, já se manifestou no sentido da irretroatividade da lei que instituiu a condição de procedibilidade no delito previsto no art. 171 do CP.

Em relação ao aspecto material, tem-se que a irretroatividade do art. 171, §5º, do CP, decorre da própria mens legis, pois, mesmo podendo, o legislador previu apenas a condição de procedibilidade, nada dispondo sobre a condição de prosseguibilidade. Ademais, necessário ainda registrar a importância de se resguardar a segurança jurídica e o ato jurídico perfeito (art. 25 do CPP), quando já oferecida a denúncia.

Oportuno assinalar, ainda, que prevalece, tanto neste STJ quanto no STF, o entendimento no sentido de que “a representação, nos crimes de ação penal pública condicionada, não exige maiores formalidades, sendo suficiente a demonstração inequívoca de que a vítima tem interesse na persecução penal. Dessa forma, não há necessidade da existência nos autos de peça processual com esse título, sendo suficiente que a vítima ou seu representante legal leve o fato ao conhecimento das autoridades”. (AgRg no HC 435.751/DF, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 04/09/2018).

11.2.3.                Resultado final.

A exigência de representação da vítima no crime de estelionato não retroage aos processos cuja denúncia já foi oferecida.

12.  Termo final da suspensão do prazo prescricional pela expedição de carta rogatória para citação do acusado no exterior

RECURSO ESPECIAL

O termo final da suspensão do prazo prescricional pela expedição de carta rogatória para citação do acusado no exterior é a data da efetivação da comunicação processual no estrangeiro, ainda que haja demora para a juntada da carta rogatória cumprida aos autos.

REsp 1.882.330/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 06/04/2021.(Info 691)

12.1.             Situação FÁTICA.

Juan foi denunciado por um certo crime. Uma vez que residia no Paraguai, foi expedida uma carta rogatória para a citação deste, porém, a carta foi expedida em 14/04/2005, cumprida em 01/07/2011 e devolvida com o cumprimento somente em 07/02/2013.

Após a condenação, a defesa de Juan alegou a prescrição. O MPF que alega que a prescrição teria ficado suspensa entre a data da expedição da carta rogatória e sua devolução devidamente cumprida.

A discussão é saber se o termo final da suspensão do prazo prescricional é a data da citação (2011) ou a data da devolução (2013).

12.2.             Análise ESTRATÉGICA.

12.2.1.                Questão JURÍDICA.

CPP:

Art. 368. Estando o acusado no estrangeiro, em lugar sabido, será citado mediante carta rogatória, suspendendo-se o curso do prazo de prescrição até o seu cumprimento.

Art. 798.  Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado.

§ 5o  Salvo os casos expressos, os prazos correrão:

a) da intimação;

Súmula 710/STF:

No processo penal, contam-se os prazos da data da intimação, e não da juntada aos autos do mandado ou da carta precatória ou de ordem.

12.2.2. Qual o termo final da suspensão?

R: A DATA DA COMUNICAÇÃO PROCESSUAL REALIZADA no estrangeiro!!!

De um lado, sustenta-se que a data de cumprimento da carta rogatória é da sua juntada aos autos, o que afastaria a prescrição, enquanto do outro lado, entende-se que tal data equivale à efetiva citação no estrangeiro, o que conduziria à extinção da punibilidade. A diferença decorre do considerável lapso temporal entre a realização da comunicação processual no estrangeiro e a juntada aos autos.

Ambas as interpretações são razoáveis, mas isso acontece justamente em razão da imprecisão do texto legal, da sua omissão legislativa em estabelecer os marcos iniciais e finais exatos para a suspensão da prescrição. Esta opção legislativa por vagueza termina aumentando a margem de discricionariedade do julgador, especialmente em caso como este, sobre o qual, ao que tudo indica, além de não haver precedente vinculante, não há jurisprudência dominante acerca do tema nos Tribunais Superiores.

Assim, diante da divergência doutrinária e jurisprudencial, deve prevalecer o entendimento de que a fluência do prazo prescricional continua não na data em que os autos da carta rogatória der entrada no cartório, mas sim naquela em que se der o efetivo cumprimento no juízo rogado.

Vale ressaltar que a questão é hermenêutica e não de integração da norma jurídica, sendo que a Súmula 710/STF estabelece que no processo penal os prazos contam-se da data da intimação, e não da juntada aos autos do mandado ou da carta precatória ou de ordem, valendo o mesmo raciocínio para a carta rogatória. Tal entendimento tem por base a regra específica do art. 798, § 5º, “a”, do CPP, que diferencia a sistemática adotada para os processos criminais em relação aos processos cíveis.

12.2.3.                Resultado final.

O termo final da suspensão do prazo prescricional pela expedição de carta rogatória para citação do acusado no exterior é a data da efetivação da comunicação processual no estrangeiro, ainda que haja demora para a juntada da carta rogatória cumprida aos autos.

13.  Requerimento da autoridade policial pela segregação cautelar ou manifestação do Ministério Público favorável à prisão preventiva e vício da inobservância da formalidade de prévio requerimento.

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM HABEAS CORPUS

O posterior requerimento da autoridade policial pela segregação cautelar ou manifestação do Ministério Público favorável à prisão preventiva suprem o vício da inobservância da formalidade de prévio requerimento.

AgRg RHC 136.708/MS, Rel. Min. Felix Fisher, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 11/03/2021.(Info 691)

13.1.             Situação FÁTICA.

Eduardo foi preso em flagrante pelo crime de tráfico de drogas. Não houve audiência de custódia e ainda assim sua prisão foi convertida em preventiva, sem que o Ministério Público fosse ouvido.

Somente após a prisão, a autoridade policial e o Ministério Público representaram pela conversão da prisão. Inconformada, a defesa de Eduardo impetrou Habeas Corpus no qual sustenta o vício da decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva ante a falta de requerimento para tanto.

13.2.             Análise ESTRATÉGICA.

13.2.1.                Questão JURÍDICA.

Constituição Federal de 1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

XXXVII – não haverá juízo ou tribunal de exceção;

XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

LVI – são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;

CPP:

Art. 565.  Nenhuma das partes poderá argüir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse.

Art. 566.  Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa.

Art. 567.  A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juiz competente.

Art. 568.  A nulidade por ilegitimidade do representante da parte poderá ser a todo tempo sanada, mediante ratificação dos atos processuais.

Art. 569.  As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das contravenções penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas a todo o tempo, antes da sentença final.

Art. 570.  A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argüi-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte.

Art. 571.  As nulidades deverão ser argüidas:

I – as da instrução criminal dos processos da competência do júri, nos prazos a que se refere o art. 406;

II – as da instrução criminal dos processos de competência do juiz singular e dos processos especiais, salvo os dos Capítulos V e Vll do Título II do Livro II, nos prazos a que se refere o art. 500;

III – as do processo sumário, no prazo a que se refere o art. 537, ou, se verificadas depois desse prazo, logo depois de aberta a audiência e apregoadas as partes;

IV – as do processo regulado no Capítulo VII do Título II do Livro II, logo depois de aberta a audiência;

V – as ocorridas posteriormente à pronúncia, logo depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes (art. 447);

VI – as de instrução criminal dos processos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Apelação, nos prazos a que se refere o art. 500;

VII – se verificadas após a decisão da primeira instância, nas razões de recurso ou logo depois de anunciado o julgamento do recurso e apregoadas as partes;

VIII – as do julgamento em plenário, em audiência ou em sessão do tribunal, logo depois de ocorrerem.

Art. 572.  As nulidades previstas no art. 564, Ill, d e e, segunda parte, g e h, e IV, considerar-se-ão sanadas:

I – se não forem argüidas, em tempo oportuno, de acordo com o disposto no artigo anterior;

II – se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim;

III – se a parte, ainda que tacitamente, tiver aceito os seus efeitos.

13.2.2. O requerimento posterior supre o vício?

R: Segue o jogo!

A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a dignidade da pessoa humana como ponto nuclear das suas diretrizes principiológicas e programáticas, reverenciando-a, no âmbito penal, na responsabilização por conduta penalmente imputável como decorrência da estrita observância das garantias constitucionais que as concretizam, tornando justo e legítimo o decreto condenatório.

Nesta esteira, sem esgotá-los, destacam-se os princípios que dignificam a responsabilização penal definitiva: reserva legal (art. 5º, II), juízo natural (art. 5º, XXXVII, legalidade (art. 5º, XXXIX), devido processo legal (art. 5º, LIV), contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV), legalidade das provas (art. 5º, LVI) e segurança jurídica (art. 5º, XXXVI).

Nesse aspecto, o desrespeito das normas que promovem o devido processo legal implica, em regra, nulidade do ato nas hipóteses de descumprimento da sua finalidade e da ocorrência de efetivo e comprovado prejuízo, segundo orientação dos princípios pas de nullité sans grief e da instrumentalidade.

No ponto, o princípio da instrumentalidade reforça a manutenção de determinados atos não só pela economia processual, mas pela agilidade que se deve empreender em busca do ato final do processo, a sentença, a teor dos arts. 565 a 572 do CPP.

Ressalta-se, assim, que o posterior requerimento da autoridade policial pela segregação cautelar ou manifestação do Ministério Público favorável à medida cautelar extrema suprem o vício da inobservância da formalidade de prévio requerimento, corroborando a higidez do feito e ausência de nulidade processual.

Com efeito, o referido vício pode ser superado pelo posterior requerimento da autoridade policial pela prisão preventiva, de modo que não se configura nenhuma nulidade passível de correção, observado, pois, o devido processo legal.

Ademais, a eventual concessão da ordem, no sentido de revogar a prisão preventiva seria inócua ante a possibilidade de imediata decretação de nova prisão preventiva, quando há mais de um pleito no sentido da decretação e manutenção da segregação cautelar.                                  

13.2.3.                Resultado final.

O posterior requerimento da autoridade policial pela segregação cautelar ou manifestação do Ministério Público favorável à prisão preventiva suprem o vício da inobservância da formalidade de prévio requerimento.

Deixe seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Veja os comentários
  • Nenhum comentário enviado.