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Informativo STJ 659 Comentado

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Sumário

Sumário. 1

DIREITO ADMINISTRATIVO.. 3

1.     (Im)Possibilidade de terceirização de serviços jurídicos pela CEF. 3

1.1.      Situação FÁTICA. 3

1.2.      Análise ESTRATÉGICA. 4

DIREITO CIVIL. 4

2.     Inércia do locador e reajuste dos aluguéis pretéritos 4

2.1.      Situação FÁTICA. 5

2.2.      Análise ESTRATÉGICA. 5

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. 6

3.     (In)Admissibilidade do incidente de assunção de competência no âmbito do STJ fora do rol do art. 947 CPC/15. 6

3.1.      Situação FÁTICA. 7

3.2.      Análise ESTRATÉGICA. 7

4.     (In)Admissibilidade da técnica de ampliação do colegiado quando não há unanimidade no juízo de admissibilidade recursal 8

4.1.      Situação FÁTICA. 8

4.2.      Análise ESTRATÉGICA. 9

5.     Perda do poder familiar, parentesco e legitimidade. 10

5.1.      Situação FÁTICA. 10

5.2.      Análise ESTRATÉGICA. 11

DIREITO EMPRESARIAL. 12

6.     Competência do juízo falimentar em ação pendente de decisão no juízo arbitral sobre eventual descumprimento de obrigações entre as partes 12

6.1.      Situação FÁTICA. 12

6.2.      Análise ESTRATÉGICA. 12

DIREITO INTERNACIONAL e PENAL. 14

7.     Tipificação do crime contra a humanidade e lei em sentido formal 14

7.1.      Situação FÁTICA. 14

7.2.      Análise ESTRATÉGICA. 15

DIREITO TRIBUTÁRIO.. 19

8.     Aquisição de bens para revenda e possibilidade de desconto de créditos PIS e COFINS sobre o ICMS recolhido pelo substituto. 19

8.1.      Situação FÁTICA. 20

8.2.      Análise ESTRATÉGICA. 20

DIREITO AMBIENTAL. 22

9.     Apreensão de bem utilizado para prática e infração ambiental e boa-fé. 22

9.1.      Situação FÁTICA. 22

9.2.      Análise ESTRATÉGICA. 22

DIREITO PENAL. 24

10.       Presídio, tráfico de drogas e majorante do art. 40, III, da Lei n. 11.343/2006. 24

10.1.     Situação FÁTICA. 24

10.2.     Análise ESTRATÉGICA. 24

11.       Indulto natalino e ressalvas ao regime de cumprimento de pena. 25

11.1.     Situação FÁTICA. 26

11.2.     Análise ESTRATÉGICA. 26

DIREITO PROCESSUAL PENAL. 28

12.       Honorários dos advogados dativos e tabela da OAB. 28

12.1.     Situação FÁTICA. 29

12.2.     Análise ESTRATÉGICA. 29

13.       Substituição do relator quando vencido quanto à mera admissibilidade da acusação na fase do artigo 6º da Lei n. 8.038/1990. 31

13.1.     Situação FÁTICA. 32

13.2.     Análise ESTRATÉGICA. 32

14.       Competência para julgamento de crime contra vida cometido quando do crime de roubo armado contra órgãos, autarquias ou empresas públicas da União. 34

14.1.     Situação FÁTICA. 34

14.2.     Análise ESTRATÉGICA. 35

15.       (I)Licitude da  prova obtida por meio de revista íntima realizada com base unicamente em denúncia anônima. 36

15.1.     Situação FÁTICA. 36

15.2.     Análise ESTRATÉGICA. 37

16.       Caráter da perícia antropológica diante de infração penal cometida por indígena. 38

16.1.     Situação FÁTICA. 38

16.2.     Análise ESTRATÉGICA. 38

PARA TESTAR SEU CONHECIMENTO.. 40

17.       QUESTÕES. 40

17.1.     Questões objetivas: CERTO ou ERRADO. 40

17.2.     Gabarito. 41

DIREITO ADMINISTRATIVO

1.      (Im)Possibilidade de terceirização de serviços jurídicos pela CEF

RECURSO ESPECIAL

Não é ilegal a terceirização de serviços jurídicos pela Caixa Econômica Federal.

REsp 1.318.740-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Rel. Acd. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por maioria, julgado em 16/10/2018, DJe 05/11/2019

1.1. Situação FÁTICA.

O Ministério Público Federal ajuizou Ação Civil Pública contra a Caixa Econômica Federal para condená-la à obrigação de não fazer, consistente na abstenção de terceirizar, por qualquer meio, a sua atividade jurídica em determinada circunscrição judiciária. No entender do MPF, não obstante a existência de cadastro de reserva de candidatos aprovados para o concurso público de provimento do cargo de “Advogado Júnior”, a Caixa Econômica Federal emitiu Edital de Pré-Qualificação de Sociedades de Advogados 2/2005 com intuito da contratação de advogados da iniciativa privada, em detrimento do cargo de provimento efetivo.

Já em segundo grau, o Tribunal Regional Federal competente entendeu que não haveria ilegalidade na terceirização pela Caixa Econômica Federal de serviços jurídicos não relacionados a questões estratégicas da instituição, por não se vincularem a atividade-fim do órgão.

Inconformado, o MPF interpôs recurso especial no qual sustentou que a contratação de pessoal da CEF deve ser por concurso público, excepcionando-se apenas quando se tratar de necessidade temporária de excepcional interesse público e em relação a serviços não essenciais. Ainda, defendeu que a eficiência administrativa não pode ser vista somente sob o ponto de vista puramente econômico.

1.2. Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.  Questão JURÍDICA.

CF/88:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:  

1.2.2.     Possível a terceirização?

R: SIM.

Observando-se o disposto no art. 37 da Constituição Federal, inserindo a atividade da Caixa Econômica Federal em um modelo da administração pública, tem-se que é importante que a Caixa Econômica ou qualquer outra empresa pública prestigie a ECONOMICIDADE.

Esse tipo de contratação de terceirizados enseja a possibilidade não de prejuízo, não de acarretar um custo operacional da empresa pública mais elevado, mas, ao contrário, ela reduz o custo da empresa pública para se manter em um ambiente competitivo.

A terceirização de algumas atividades, vai ao encontro da finalidade da Caixa Econômica Federal, que é um organismo com características de administração pública, mas com uma atuação peculiar em uma área que é difícil, a atividade bancária. Dessa forma, limitar a atividade da advocacia, dentro da Caixa Econômica Federal, somente permitindo que ela atue com profissionais concursados é retirar a capacidade concorrencial da Caixa. 

1.2.3.  Resultado final.

Não é ilegal a terceirização de serviços jurídicos pela Caixa Econômica Federal.

DIREITO CIVIL

2.      Inércia do locador e reajuste dos aluguéis pretéritos

RECURSO ESPECIAL

A inércia do locador em exigir o reajuste dos aluguéis por longo período de tempo suprime o direito à cobrança de valores pretéritos, mas não impede a atualização dos aluguéis a partir da notificação extrajudicial encaminhada ao locatário.

REsp 1.803.278-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/10/2019, DJe 05/11/2019

2.1. Situação FÁTICA.

Avan Lojas de Departamento Ltda (locatário) ajuizou ação declaratória de inexistência de dívida contra Alvo Participações S.A. (locador) postulando o reconhecimento da ausência de débito passado ou futuro decorrente do contrato de locação firmado entres as partes, especificamente a título de ‘reajuste automático’.

O magistrado de primeiro grau julgou procedentes os pedidos para declarar a inexistência de dívida e a inexigibilidade do reajuste anual dos aluguéis. Em apelação, o Tribunal de Justiça local reformou parcialmente a decisão para reconhecer a existência da dívida relativa ao reajuste do valor locatício a partir o recebimento da notificação enviada ao locador.

Inconformadas, as partes interpuseram recurso especial no qual o locador defende a inaplicabilidade da supressio no tocante aos reajustes anuais previstos no contrato de locação, que, por equívoco, não foram cobrados pelo locador durante o período de 5 anos e o locatário sustenta que a inércia da recorrida (locadora) em aplicar os reajustes contratuais acarreta também a incidência de supressio em relação aos valores cobrados após a notificação extrajudicial.

Cinge-se a controvérsia a definir se, não tendo exercido o direito de reajustar os aluguéis durante o período de 5 anos, com base em cláusula contratual expressa, pode o locador exigir o pagamento de tais valores, inclusive de retroativos, após realizada a notificação do locatário

2.2. Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.     Possível a cobrança dos valores pretéritos?

R: NÃO, somente o devido após a notificação extrajudicial.

Primeiramente, que negócio é esse de supressio???

É a omissão qualificada no tempo, que gera expectativa de não exercício do direito. A configuração da supressio exige TRÊS requisitos: a) inércia do titular do direito subjetivo, b) decurso de tempo capaz de gerar a expectativa de que esse direito não mais seria exercido e c) deslealdade em decorrência de seu exercício posterior, com reflexos no equilíbrio da relação contratual.

No caso, o locador não gerou a expectativa no locatário de que não mais haveria a atualização do valor do aluguel durante todo o período da locação comercial (vinte anos), mas que apenas não seria exigida eventual diferença no valor já pago nos cinco anos anteriores à notificação extrajudicial.

Nesse contexto, impedir o locador de reajustar os aluguéis pode provocar manifesto desequilíbrio no vínculo contratual, dado o congelamento do valor pelo tempo restante da relação locatícia. Em vista disso, a aplicação da boa-fé objetiva não pode chancelar desajustes no contrato a ponto de obstar o aumento do valor do aluguel pelo tempo de vinte anos. Não é razoável supor que o locatário tivesse criado a expectativa de que o locador não fosse mais reclamar o aumento dos aluguéis.

Assim, o decurso do tempo não foi capaz de gerar a confiança de que o direito não seria mais exercitado em momento algum do contrato de locação. Nesse cenário, suprimir o direito do locador de pleitear os valores PRETÉRITOS, inclusive em decorrência do efeito liberatório da própria quitação, e permitir a atualização dos aluguéis após a notificação extrajudicial é a medida que mais se coaduna com a boa-fé objetiva.

2.2.2.  Resultado final.

A inércia do locador em exigir o reajuste dos aluguéis por longo período de tempo suprime o direito à cobrança de valores pretéritos, mas não impede a atualização dos aluguéis a partir da notificação extrajudicial encaminhada ao locatário.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

3.      (In)Admissibilidade do incidente de assunção de competência no âmbito do STJ fora do rol do art. 947 CPC/15

AGRAVO INTERNO NA PETIÇÃO

É inadmissível incidente de assunção de competência no âmbito do STJ fora das situações previstas no art. 947 do CPC/2015.

AgInt na Pet 12.642-SP, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 14/08/2019, DJe 19/08/2019

3.1. Situação FÁTICA.

Em determinado processo foi proferida decisão que indeferiu liminarmente a petição em que se buscava a instauração de incidente de assunção de competência para se fixar a tese de que compete aos Colégios Recursais o processamento e julgamento de ações rescisórias ajuizadas para desconstituir decisões proferidas pelos Juizados Especiais Estaduais.

Inconformado, o peticionante interpôs agravo interno no qual sustentou a necessidade de se conferir uma interpretação ampliativa das hipóteses de cabimento previstas no art. 947 do CPC/2015, haja vista a ausência de outro instrumento processual hábil a conferir efetividade à jurisprudência do STJ no âmbito dos Juizados Especiais.

3.2. Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.  Questão JURÍDICA.

Código de Processo Civil 2015:

Art. 947. É admissível a assunção de competência quando o julgamento de recurso, de remessa necessária ou de processo de competência originária envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem repetição em múltiplos processos.

§ 1º Ocorrendo a hipótese de assunção de competência, o relator proporá, de ofício ou a requerimento da parte, do Ministério Público ou da Defensoria Pública, que seja o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar.

§ 2º O órgão colegiado julgará o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária se reconhecer interesse público na assunção de competência.

§ 3º O acórdão proferido em assunção de competência vinculará todos os juízes e órgãos fracionários, exceto se houver revisão de tese.

§ 4º Aplica-se o disposto neste artigo quando ocorrer relevante questão de direito a respeito da qual seja conveniente a prevenção ou a composição de divergência entre câmaras ou turmas do tribunal.

3.2.2.     Admissível o IAC?

R: NÃO.

O incidente de assunção de competência não pode ser interpretado como novo meio de impugnação a atrair a competência do STJ para o exame de situações que não estejam previstas na legislação processual. No caso, pretendeu-se ampliar as hipóteses de cabimento para discutir a tese de que competiria aos Colégios Recursais o julgamento de ações rescisórias no âmbito dos Juizados Especiais estaduais.

Ausentes as hipóteses expressamente elencadas no art. 947 do CPC/2015, não se estando diante de recurso, remessa necessária ou processo de competência originária deste Superior Tribunal, é inadmissível a instauração do incidente de assunção de competência no âmbito desta Corte. Saliente-se, ainda, que a competência excepcional e transitória deste Superior Tribunal de Justiça para uniformizar a jurisprudência dos Juizados Especiais estaduais, inaugurada no julgamento proferido pelo STF nos autos dos EDcl no RE 571.572/BA, regulamentada pela Resolução STJ n. 12/2009 e concretizada pelo instituto da reclamação, foi posteriormente delegada aos Tribunais de Justiça por força da Resolução STJ n. 3/2016.

Assim, NÃO é cabível a instauração do incidente de assunção de competência para a situação em referência seja porque não há previsão legal, seja porque há mecanismo processual próprio para uniformizar a jurisprudência no âmbito dos Juizados Especiais dos Estados.          

3.2.3.  Resultado final.

É inadmissível incidente de assunção de competência no âmbito do STJ fora das situações previstas no art. 947 do CPC/2015.

4.      (In)Admissibilidade da técnica de ampliação do colegiado quando não há unanimidade no juízo de admissibilidade recursal

RECURSO ESPECIAL

Aplica-se a técnica de ampliação do colegiado quando não há unanimidade no juízo de admissibilidade recursal. 

REsp 1.798.705-SC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/10/2019, DJe 28/10/2019 

4.1. Situação FÁTICA.

Romeno ajuizou “ação ordinária de indenização por danos morais” contra um escritório de advocacia e seus sócios. O Juízo de Primeiro grau julgou procedente a ação contra os sócios, mas extinguiu a ação em relação ao escritório.

Em recurso de apelação interpostas por ambas as partes, o Tribunal de Justiça local negou provimento ao recurso dos réus, mas, por maioria de votos, conhecer do recurso adesivo do autor e a ele dar provimento para reconhecer a legitimidade passiva ad causam da Sociedade de Advogados e majorar os honorários advocatícios.

Inconformados, os réus interpuseram recurso especial no qual sustentaram que o acórdão recorrido seria nulo, pois não houve unanimidade quanto ao cabimento da apelação adesiva, sendo de rigor a observância da regra de ampliação do colegiado.

Cinge-se a controvérsia em torno da necessidade de aplicação da técnica de ampliação do colegiado, prevista no art. 942 do CPC, na hipótese em que não há unanimidade no juízo de admissibilidade recursal.

4.2. Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.  Questão JURÍDICA.

Código de Processo Civil 2015:

Art. 942. Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores.

4.2.2.     Aplicável a técnica de ampliação do colegiado no caso?

R: SIM.

Consoante entendimento de ambas as Turmas que compõem a Segunda Seção do STJ, diferentemente dos embargos infringentes regulados pelo CPC/1973, a nova técnica de ampliação do colegiado é de observância automática e obrigatória sempre que o resultado da apelação for não unânime e não apenas quando ocorrer a reforma de sentença.

Ademais, o art. 942 do CPC/2015 não determina a ampliação do julgamento apenas em relação às questões de mérito, incluindo também as questões preliminares relativas ao juízo de admissibilidade do recurso.

No caso, o Tribunal de origem, ao deixar de ampliar o quórum, diante da ausência de unanimidade com relação à preliminar de não conhecimento da apelação interposta de forma adesiva, inobservou o enunciado normativo inserto no art. 942 do CPC/2015, sendo de rigor declarar a nulidade por error in procedendo.

4.2.3.  Resultado final.

Aplica-se a técnica de ampliação do colegiado quando não há unanimidade no juízo de admissibilidade recursal.

5.      Perda do poder familiar, parentesco e legitimidade

RECURSO ESPECIAL

A existência de vínculo familiar ou de parentesco não constitui requisito para a legitimidade ativa do interessado na requisição da medida de perda ou suspensão do poder familiar.

REsp 1.203.968-MG, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 10/10/2019, DJe 23/10/2019

5.1. Situação FÁTICA.

Cleuza ajuizou ação de adoção cumulada com pedido de extinção do poder familiar em face da mãe biológica Vanusa, objetivando com a medida o deferimento liminar de guarda provisória da menor Suzicleide e, consequentemente, a sua adoção.

Conforme a autora, a adotanda encontra-se em companhia e guarda fática desta desde os nove meses de vida, quando Vanusa a deixou aos cuidados de Cleuza dada a ausência de condições econômico-financeiras para manter a filha e o não conhecimento da identidade do pai biológico da menor.

O juízo de primeiro grau, acolhendo as conclusões do estudo social e o parecer do Parquet, julgou procedentes os pedidos da inicial, destituindo o poder familiar da genitora e deferindo a adoção à autora. Inconformada, a mãe biológica demandada interpôs recurso de apelação.

O Tribunal de Justiça local, por maioria, de ofício, julgou extinta a ação, sem resolução do mérito, em razão da ilegitimidade ativa da autora que, por não possuir vínculo com a criança, estaria desautorizada a propor a demanda.

Irresignada, Cleuza interpôs recurso especial sustentou que em casos como o ora em exame, nos quais a finalidade é o bem-estar da menor, o rigorismo formal da lei deve ser atenuado, sobretudo porque a destituição do poder familiar na hipótese emana do manifesto abandono da adotanda por sua mãe biológica.

5.2. Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.  Questão JURÍDICA.

Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 155. O procedimento para a perda ou a suspensão do pátrio poder poder familiar terá início por provocação do Ministério Público ou de quem tenha legítimo interesse

5.2.2.     Há legitimidade na causa?

R: Mas CLARO que SIM.

No procedimento para a perda ou a suspensão do poder familiar, depreende-se do art. 155 do ECA uma legitimação ativa CONCORRENTE atribuída ao Ministério Público e a quem tenha o legítimo interesse.

O legislador ordinário não procurou definir quem teria, em tese, o “legítimo interesse” para pleitear a medida, tampouco fixou requisitos estanques para a legitimação ativa, tratando-se de efetivo conceito jurídico indeterminado.

Em virtude disso, o legítimo interesse deve ser analisado com prudência, a partir do caso concreto, sendo desarrazoado estabelecer, de plano, que o adotante, por não possuir vínculo familiar com o menor, independentemente das circunstâncias fáticas que permeiam a situação, seja considerada parte ilegítima para o pedido.

Assim sendo, é permitido ao julgador agir com certa discricionariedade para estabelecer quem, na hipótese em concreto, com amparo nos princípios da proteção integral e melhor interesse da criança possui o legítimo interesse para requerer a destituição do poder familiar.

5.2.3.  Resultado final.

A existência de vínculo familiar ou de parentesco não constitui requisito para a legitimidade ativa do interessado na requisição da medida de perda ou suspensão do poder familiar.

DIREITO EMPRESARIAL

6.      Competência do juízo falimentar em ação pendente de decisão no juízo arbitral sobre eventual descumprimento de obrigações entre as partes

CONFLITO DE COMPETÊNCIAS

Compete ao Juízo falimentar decidir sobre os bens do falido dados em garantia em favor de sociedade empresária em recuperação judicial ainda que pendente decisão no juízo arbitral sobre eventual descumprimento de obrigações entre as partes.

CC 166.591-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 23/10/2019, DJe 28/10/2019

6.1. Situação FÁTICA.

As empresas QGER e SEOB firmaram 5 (cinco) contratos de construção, montagem e manutenção de parques eólicos, aos quais vincularam contratos de garantia e manutenção das usinas energéticas. Porém, em determinado momento, SEOB teria inadimplido esses pactos, o que deu origem a um primeiro procedimento arbitral na Câmara de Comércio Brasil-Canadá.

Depois de descumprido o que fora acordado junto ao juízo arbitral, SEOB requereu sua autofalência no Juízo cearense, tendo sido deferida anteriormente, à QGER, a recuperação judicial no Juízo de São Paulo – SP. Nos autos da falência, a massa falida postulou e obteve a ordem de arrecadação dos valores prestados por SEOB como garantia à QGER.

O Juízo paulista, num primeiro momento, também procedeu à constrição dos referidos bens e, posteriormente, por entender que a propriedade deles era controversa, sobrestou sua decisão até que a titularidade dos valores constritos e das pás fosse apreciada em sede de procedimento arbitral ao qual teriam se submetido as partes, bem como suscitou o conflito de competências, ante a decisão do Juízo de Fortaleza, que entendeu serem os bens pertencentes à massa falida

6.2. Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei n. 11.101/2005:

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.

§ 1º Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida.

6.2.2.     A quem compete decidir sobre os bens?

R: JUÍZO FALIMENTAR.

O conflito de competência decorre da divergência entre o Juízo que processa a autofalência da suposta devedora, o qual se considera competente e afirma que os bens dados em garantia são de propriedade da massa falida, e o Juízo onde tramita a recuperação judicial da credora, que não libera os referidos bens por entender que compete ao Juízo arbitral, em primeiro lugar, decidir sobre o mérito do descumprimento das obrigações.

O art. 6º, caput e § 1º, da Lei n. 11.101/2005 estabelece que a decretação da falência suspende o curso de todas as ações e execuções contra o devedor, prosseguindo, no juízo no qual estiver se processando, a ação que demandar quantia ilíquida. No caso, a arrecadação dos bens em favor da massa falida não impede seja processada no Juízo arbitral eventual demanda na qual se discuta o descumprimento de obrigações contratuais e créditos ilíquidos.

 Havendo somente decisão do Juízo falimentar afirmando que os bens pretendidos por suposta credora pertencem à massa falida compete ao juízo da falência decidir sobre a destinação dos bens, que estão vinculados à execução concursal, inclusive sobre eventuais atos constritivos incidentes sobre o patrimônio da falida.

Considerando que a devedora, que requereu a própria falência, entregou os bens tratados neste conflito somente a título de garantia, sendo detentora da propriedade, diversos são os dispositivos da Lei n. 11.101/2005 que justificam a competência do Juiz do processo falimentar para decidir a respeito da destinação a ser dada ao depósito efetuado e aos bens entregues para a realização da perícia.

Eventualmente se o Juízo arbitral reconhecer que a empresa falida é devedora de algum valor à sociedade que postula os bens dados em garantia, haverá formação de crédito em favor da empresa credora, a ser habilitado na falência, para fins de execução concursal.

6.2.3.  Resultado final.

Compete ao Juízo falimentar decidir sobre os bens do falido dados em garantia em favor de sociedade empresária em recuperação judicial ainda que pendente decisão no juízo arbitral sobre eventual descumprimento de obrigações entre as partes.

DIREITO INTERNACIONAL e PENAL

7.      Tipificação do crime contra a humanidade e lei em sentido formal

RECURSO ESPECIAL

(1) É necessária a edição de lei em sentido formal para a tipificação do crime contra a humanidade trazida pelo Estatuto de Roma, mesmo se cuidando de Tratado internalizado.  (2) O disposto na Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade não torna inaplicável o art. 107, inciso IV, do Código Penal.

REsp 1.798.903-RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, por maioria, julgado em 25/09/2019, DJe 30/10/2019 

7.1. Situação FÁTICA.

O MPF ofertou denúncia contra quatro acusados de envolvimento em episódio conhecido como atentado a bomba no Riocentro, ocorrido no dia 30/4/1981. Segundo relata o órgão acusatório, os investigados, que trabalhavam no DOI (Destacamento de Operações de Informações) e no SNI (Serviço Nacional de Informações), teriam se associado, no início do ano de 1980, de maneira estável e permanente, a fim de praticar diversos delitos em “contexto de um ataque estatal sistemático e generalizado dos agentes do Estado contra a população brasileira”.

A denúncia assenta que o intuito dos acusados era forjar um ato terrorista subversivo da esquerda armada, atribuindo o atentado a bomba falsamente a uma organização da militância contra o regime de exceção, e assim justificar um novo endurecimento da ditadura militar brasileira diante da “ameaça comunista”.

A acusação foi recebida pela Juíza de primeiro grau que entendeu pela não ocorrência da prescrição por entender que se tratava de crime contra a humanidade e, portanto, imprescritível. Porém, a defesa dos acusados impetrou Habeas Corpus e o acórdão reconheceu a inexistência de crime contra a humanidade, e a incidência da prescrição da pretensão punitiva.

Inconformado, o MPF impetrou recurso especial no qual sustentou a violação dos arts. 107, IV, 347 e 348 do Código Penal, por considerar que os fatos narrados na inicial acusatória – suposto envolvimento dos acusados em episódio conhecido publicamente como atentado a bomba no Riocentro, ocorrido no dia 30/4/1981 – configuram crimes contra a humanidade e, por isso mesmo, são imprescritíveis, em consonância com as normas internacionais e o posicionamento das Cortes do Direito Internacional.

Cinge-se a controvérsia acerca aplicação do conceito do Direito Internacional sobre crime contra a humanidade (ou de lesa-humanidade) – e sua consequente imprescritibilidade – às ações delitivas principais e circundantes ao atentado a bomba no Centro de Convenções Riocentro, no Rio de Janeiro, em 1981, com aventada possibilidade de persecução penal contra os autores dos crimes de homicídio qualificado tentado, fabrico, posse e transporte de explosivos, associação criminosa, fraude processual e favorecimento pessoal.

7.2. Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.  Questão JURÍDICA.

Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional:

Artigo 7o

Crimes contra a Humanidade

1. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por “crime contra a humanidade”, qualquer um dos atos seguintes, quando cometido no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque:

a) Homicídio;

b) Extermínio;

c) Escravidão;

d) Deportação ou transferência forçada de uma população;

e) Prisão ou outra forma de privação da liberdade física grave, em violação das normas fundamentais de direito internacional;

f) Tortura;

g) Agressão sexual, escravatura sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de violência no campo sexual de gravidade comparável;

h) Perseguição de um grupo ou coletividade que possa ser identificado, por motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais, religiosos ou de gênero, tal como definido no parágrafo 3o, ou em função de outros critérios universalmente reconhecidos como inaceitáveis no direito internacional, relacionados com qualquer ato referido neste parágrafo ou com qualquer crime da competência do Tribunal;

i) Desaparecimento forçado de pessoas;

j) Crime de apartheid;

k) Outros atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental.

2. Para efeitos do parágrafo 1o:

a) Por “ataque contra uma população civil” entende-se qualquer conduta que envolva a prática múltipla de atos referidos no parágrafo 1o contra uma população civil, de acordo com a política de um Estado ou de uma organização de praticar esses atos ou tendo em vista a prossecução dessa política;

b) O “extermínio” compreende a sujeição intencional a condições de vida, tais como a privação do acesso a alimentos ou medicamentos, com vista a causar a destruição de uma parte da população;

c) Por “escravidão” entende-se o exercício, relativamente a uma pessoa, de um poder ou de um conjunto de poderes que traduzam um direito de propriedade sobre uma pessoa, incluindo o exercício desse poder no âmbito do tráfico de pessoas, em particular mulheres e crianças;

d) Por “deportação ou transferência à força de uma população” entende-se o deslocamento forçado de pessoas, através da expulsão ou outro ato coercivo, da zona em que se encontram legalmente, sem qualquer motivo reconhecido no direito internacional;

e) Por “tortura” entende-se o ato por meio do qual uma dor ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são intencionalmente causados a uma pessoa que esteja sob a custódia ou o controle do acusado; este termo não compreende a dor ou os sofrimentos resultantes unicamente de sanções legais, inerentes a essas sanções ou por elas ocasionadas;

f) Por “gravidez à força” entende-se a privação ilegal de liberdade de uma mulher que foi engravidada à força, com o propósito de alterar a composição étnica de uma população ou de cometer outras violações graves do direito internacional. Esta definição não pode, de modo algum, ser interpretada como afetando as disposições de direito interno relativas à gravidez;

g) Por “perseguição” entende-se a privação intencional e grave de direitos fundamentais em violação do direito internacional, por motivos relacionados com a identidade do grupo ou da coletividade em causa;

h) Por “crime de apartheid” entende-se qualquer ato desumano análogo aos referidos no parágrafo 1°, praticado no contexto de um regime institucionalizado de opressão e domínio sistemático de um grupo racial sobre um ou outros grupos nacionais e com a intenção de manter esse regime;

i) Por “desaparecimento forçado de pessoas” entende-se a detenção, a prisão ou o seqüestro de pessoas por um Estado ou uma organização política ou com a autorização, o apoio ou a concordância destes, seguidos de recusa a reconhecer tal estado de privação de liberdade ou a prestar qualquer informação sobre a situação ou localização dessas pessoas, com o propósito de lhes negar a proteção da lei por um prolongado período de tempo.

3. Para efeitos do presente Estatuto, entende-se que o termo “gênero” abrange os sexos masculino e feminino, dentro do contexto da sociedade, não lhe devendo ser atribuído qualquer outro significado.

CF/1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.            (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Código Penal:

Art. 107 – Extingue-se a punibilidade:

IV – pela prescrição, decadência ou perempção;

7.2.2.     Vale criar crime por tratado internacional?

R: NÃO.

O conceito de crime contra a humanidade se encontra positivado no art. 7º do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, o qual foi adotado em 17/07/1998, porém apenas passou a vigorar em 01/07/2002, quando conseguiu o quórum de 60 países ratificando a convenção, sendo internalizado por meio do Decreto n. 4.388/2002.

No Brasil, no entanto, ainda não há lei que tipifique os crimes contra a humanidade, embora esteja em tramitação o Projeto de Lei n. 4.038/2008, que “dispõe sobre o crime de genocídio, define os crimes contra a humanidade, os crimes de guerra e os crimes contra a administração da justiça do Tribunal Penal Internacional, institui normas processuais específicas, dispõe sobre a cooperação com o Tribunal Penal Internacional, e dá outras providências”.

Nesse contexto, o Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de se manifestar no sentido de que NÃO é possível utilizar tipo penal descrito em tratado internacional para tipificar condutas internamente, sob pena de se violar o princípio da legalidade – art. 5º, XXXIX, da CF/1988 segundo o qual “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal” – art. 5º, XXXIX, da CF/1988.

Assim, tanto no Supremo Tribunal Federal como também no Superior Tribunal de Justiça, não obstante a tendência em se admitir a configuração do crime antecedente de organização criminosa – antes da entrada em vigor da Lei n. 12.850/2013 – para configuração do crime de lavagem de dinheiro, em virtude da internalização da Convenção de Palermo, por meio Decreto n. 5.015/2004, prevaleceu o entendimento no sentido de que a definição de organização criminosa contida na referida convenção não vale para tipificar o art. 1º, inciso VII, da Lei n. 9.613/1998 – com redação anterior à Lei n. 12.683/2012. De igual modo, NÃO se mostra possível internalizar a tipificação do crime contra a humanidade trazida pelo Estatuto de Roma, mesmo se cuidando de Tratado internalizado por meio do Decreto n. 4.388/2002, porquanto não há lei em sentido formal tipificando referida conduta. 

7.2.3.     Não sem imprescritibilidade na espécie?

R: NÃO mesmo.

A Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade foi adotada pela Resolução n. 2.391 da Assembleia Geral da ONU, em 26/11/1968, e entrou em vigor em 11/11/1970. Contudo, mencionada Convenção NÃO foi ratificada pelo Brasil.

 Prevalece na jurisprudência que “os tratados em geral, inclusive os de direitos humanos, somente podem ser aplicados na ordem jurídica brasileira depois de serem promulgados na ordem interna”.

A depender da forma como o tratado internacional de direitos humanos for incorporado, ele pode ter status constitucional ou supralegal. De fato, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 466.343/SP, o Supremo Tribunal Federal concluiu que o art. 5º, § 3º, da Constituição Federal revela que os tratados sobre direitos humanos, que não foram aprovados naqueles termos, não possuem status constitucional.

Embora se tratem de normas infraconstitucionais, posicionam-se acima das leis, assumindo posição de supralegalidade. Na hipótese, entretanto, a referida Convenção não foi ratificada pelo Brasil, não sendo internalizada nem como norma supralegal.

No presente julgamento se discute sua observância independentemente de ratificação, por se tratar de norma jus cogens, ou seja, conforme disposto no art. 53 da Convenção de Viena: norma aceita e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados como um todo, como norma da qual nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma ulterior de Direito Internacional geral da mesma natureza.

Independentemente do status que se atribua à Convenção analisada, que, no julgamento da Extradição n. 1.362/DF, considerou-se inaplicável o jus cogens, prevalecendo o entendimento no sentido de que a qualificação do crime como de lesa-humanidade não afasta a sua prescrição, porquanto: (a) o Brasil não subscreveu a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade, nem aderiu a ela; e (b) apenas lei interna pode dispor sobre prescritibilidade ou imprescritibilidade da pretensão estatal de punir (ADPF 153, Relator(a): Min. Eros Grau, voto do Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJe de 06/08/2010).

Ainda que se admita o jus cogens, na contramão do que decidido pelo Supremo Tribunal Federal, o controle de convencionalidade exercido pelo STJ, com a finalidade de aferir se a legislação infraconstitucional está em dissonância com o disposto no tratado internacional sobre direitos humanos, deve se harmonizar com os princípios e garantias constitucionais. Com efeito, não se pode perder de vista que o tratado possui status supralegal, porém infraconstitucional, porquanto não internalizado nos termos do art. 5º, § 3º, da CF/1988. Conclusão em sentido contrário violaria não apenas o disposto no referido dispositivo da Constituição da República, mas também a jurisprudência consolidada do STF sobre o status dos tratados sobre direitos humanos, bem como inviabilizaria o exame dos temas pelo STJ.

Não se coaduna com a ordem constitucional vigente, admitir a paralisação da eficácia da norma que disciplina a prescrição, com o objetivo de tornar imprescritíveis crimes contra a humanidade, por se tratar de norma de direito penal que demanda, da mesma forma, a existência de lei em sentido formal. Ademais, se deve igual observância ao princípio da irretroatividade.

 Portanto, NÃO é possível tornar inaplicável o disposto no art. 107, IV, do CP, em face do disposto na Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade, sob pena de se vulnerar o princípio constitucional da legalidade e da irretroatividade, bem como a própria segurança jurídica, com consequências igualmente graves, em virtude da mitigação de princípios relevantes à própria consolidação do Estado Democrático de Direito. 

7.2.4.  Resultado final.

É necessária a edição de lei em sentido formal para a tipificação do crime contra a humanidade trazida pelo Estatuto de Roma, mesmo se cuidando de Tratado internalizado.

O disposto na Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade não torna inaplicável o art. 107, inciso IV, do Código Penal. 

DIREITO TRIBUTÁRIO

8.      Aquisição de bens para revenda e possibilidade de desconto de créditos PIS e COFINS sobre o ICMS recolhido pelo substituto

RECURSO ESPECIAL

É possível o desconto de créditos existentes de contribuição ao PIS e da COFINS, pelo contribuinte substituído, sobre o ICMS recolhido pelo substituto, no regime de substituição tributária progressiva do imposto estadual (ICMS-ST), na aquisição de bens para revenda. 

REsp 1.428.247-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, Rel. Acd. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, por maioria, julgado em 15/10/2019, DJe 29/10/2019 

8.1. Situação FÁTICA.

Determinado supermercado impetrou mandado de segurança objetivando declaração de que os valores recolhidos a título de ICMS-ST, por ocasião das mercadorias a serem revendidas, quando não recuperáveis, deveriam ser qualificados como custo de aquisição da mercadoria, logo, deveriam fazer parte da base de cálculo dos créditos a serem abatidos das mesmas contribuições.

A segurança foi inicialmente negada por entender o Juízo Federal que os valores pagos pela substituída na aquisição das mercadorias seria parte do faturamento da sociedade empresária, ao passo que os revendedores não integrariam a relação de substituição tributária.

O Tribunal Regional Federal local manteve a decisão inicial por entender que apenas o ICMS pago pelo adquirente das mercadorias destinadas à revenda daria direito aos créditos da contribuição para o PIS e COFINS.

8.2. Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei n. 10.637/2002:

Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:

§ 2o Não dará direito a crédito o valor:

II – da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição.

Lei n. 11.033/2004:

Art. 17. As vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações.

8.2.2.     Possível o requerido desconto?

R: SIM.

Os arts. 3º, § 2º, II, das Leis n. 10.637/2002 e 10.833/2003, de idêntica redação, vedam a concessão de créditos de contribuição ao PIS e da COFINS sobre valores de “aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição”.

Todavia, a Primeira Turma desta Corte assentou que a disposição do art. 17 da Lei n. 11.033/2004, a qual assegura a manutenção dos créditos existentes de contribuição ao PIS e da COFINS, ainda que a revenda não seja tributada, não se aplica apenas às operações realizadas com os destinatários do benefício fiscal do REPORTO, assentando, como corolário, a revogação tácita do art. 3º, § 2º, II, de ambas as Leis n. 10.637/2002 e 10.833/2003.

Por conseguinte, o direito ao creditamento independe da ocorrência de tributação na etapa anterior, vale dizer, NÃO está vinculado à eventual incidência da contribuição ao PIS e da COFINS sobre a parcela correspondente ao ICMS-ST na operação de venda do substituto ao substituído.

 Nesse contexto, sendo o fato gerador da substituição tributária prévio e definitivo, o direito ao crédito do substituído decorre da repercussão econômica do ônus gerado pelo recolhimento antecipado do ICMS-ST atribuído ao substituto, compondo, desse modo, o custo de aquisição da mercadoria adquirida pelo revendedor.

Anote-se ainda que, quando não verificado o fato gerador presumido ou realizado por valor inferior ao previsto, eventual recuperação do ICMS-ST caberá ao substituto, único sujeito passivo da relação jurídica tributária desse regime, o qual poderá defender, com exclusividade, “suas prerrogativas, administrativa ou judicialmente, formulando impugnações ou recursos, bem como deduzindo suas pretensões em juízo para, sobre elas, obter a prestação jurisdicional do Estado”, consoante fixado, por esta Corte, no precedente de eficácia vinculante (REsp 931.727/RS, Rel. Min. Luiz Fux, j. 26/08/2009, DJe 14/09/2009).

Desse modo, no contexto da não cumulatividade, é juridicamente ilegítimo frustrar o direito ao creditamento por supor recuperado o custo mediante eventual projeção no valor de revenda. Assim, o substituído faz jus aos créditos da contribuição ao PIS e da COFINS pretendidos, quer porque independem da incidência de tais contribuições sobre o montante do ICMS-ST recolhido pelo substituto na etapa anterior, quer porque o valor do imposto estadual antecipado caracteriza custo de aquisição. 

8.2.3.  Resultado final.

É possível o desconto de créditos existentes de contribuição ao PIS e da COFINS, pelo contribuinte substituído, sobre o ICMS recolhido pelo substituto, no regime de substituição tributária progressiva do imposto estadual (ICMS-ST), na aquisição de bens para revenda. 

DIREITO AMBIENTAL

9.      Apreensão de bem utilizado para prática e infração ambiental e boa-fé

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

A autoridade administrativa deve notificar o proprietário do veículo locado para oportunizar que comprove a sua boa-fé antes de decidir sobre a destinação do bem apreendido pela prática de infração ambiental.

AREsp 1.084.396-RO, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 19/09/2019, DJe 18/10/2019

9.1. Situação FÁTICA.

Agentes do ICMBio apreenderam um trator utilizado para “explorar ou danificar floresta ou qualquer tipo de vegetação nativa, sem aprovação prévia do órgão ambiental competente”.

O dono do bem apreendido ajuizou ação na qual busca a liberação deste. Após ampla discussão, o Tribunal Regional Federal local decidiu que a apreensão de veículo para ulterior decretação de seu perdimento somente é possível quando comprovado que sua utilização é destinada, específica e exclusivamente, ou ao menos de forma reiterada e rotineira, à prática de delitos ou infrações ambientais e ordenou a liberação do bem.

Inconformado, ICMBio interpôs recurso especial no qual sustentou que a apreensão do veículo utilizado na prática de infração ambiental encontra-se prevista na legislação, sendo descabida a restrição realizada pela de condicioná-la à demonstração de que o bem seja exclusiva, específica, reiterada ou rotineiramente empregado na prática de delitos ao meio ambiente.

9.2. Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.  Questão JURÍDICA.

Lei n. 9.605/1998:

Art. 25. Verificada a infração, serão apreendidos seus produtos e instrumentos, lavrando-se os respectivos autos.

Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º:

IV – apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração;

9.2.2.     Necessária a comprovação de uso exclusivo para infrações ambientais?

R: NÃO.

Os arts. 25 e 72, IV, da Lei n. 9.605/1998 estabelecem como efeito imediato a apreensão dos bens e instrumentos utilizados na prática do ilícito ambiental. A exigência de requisito não expressamente previsto na legislação de regência para a aplicação dessas sanções compromete a eficácia dissuasória inerente à medida, consistindo em incentivo, sob a perspectiva da teoria econômica do crime, às condutas lesivas ao meio ambiente.

Exigir que a autoridade ambiental comprove que o veículo é utilizado específica, exclusiva, reiterada ou rotineiramente para a prática de delito ambiental caracteriza verdadeira prova diabólica, tornando letra morta a legislação que ampara a atividade fiscalizatória.

Ainda que se trate de bem locado ao real infrator, a apreensão do bem não representa injusta restrição a quem não deu causa à infração ambiental, permitindo, por outro lado, trazer o risco da exploração da atividade econômica a quem a exerce. Seja em razão do conceito legal de poluidor, seja em função do princípio da solidariedade que rege o direito ambiental, a responsabilidade administrativa pelo ilícito recai sobre quem, de qualquer forma, contribuiu para a prática da infração ambiental, por ação ou omissão.

Não é possível admitir que o Judiciário comprometa a eficácia da legislação ambiental e impeça a apreensão do veículo tão somente porque o instrumento utilizado no ilícito originou-se de um contrato de locação, cessão ou de qualquer outro meio juridicamente previsto.

9.2.3.     Então pode aprender e já era?

R: NÃO é bem assim…

Após a medida de apreensão, a autoridade administrativa oportunizará o direito de defesa ao proprietário do bem antes de decidir sobre sua destinação. Cumpre ao proprietário do veículo comprovar sua boa-fé, demonstrando que, pelas circunstâncias da prática envolvida e apesar de ter tomado as precauções necessárias, não tinha condições de prever a utilização do bem no ilícito ambiental. Ademais, aquele que realiza a atividade de locação de veículos deve adotar garantias para a prevenção e o ressarcimento dos danos causados pelo locatário.

9.2.4.  Resultado final.

A autoridade administrativa deve notificar o proprietário do veículo locado para oportunizar que comprove a sua boa-fé antes de decidir sobre a destinação do bem apreendido pela prática de infração ambiental.

DIREITO PENAL

10.  Presídio, tráfico de drogas e majorante do art. 40, III, da Lei n. 11.343/2006

HABEAS CORPUS

Não é necessário que a droga passe por dentro do presídio para que incida a majorante prevista no art. 40, III, da Lei n. 11.343/2006. 

HC 440.888-MS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 15/10/2019, DJe 18/10/2019

10.1.             Situação FÁTICA.

Tonho e Edu foram condenados pelo crime de tráfico de drogas. Ambos já estavam presos quando do cometimento dos crimes que eram então cometidos por meio do uso de aparelhos celulares.

A defesa de ambos impetrou Habeas Corpus no qual sustentou que não deveria ter sido incidida a causa de aumento prevista no art. 40, inciso III, da Lei n. 11.343/06, uma vez que apesar de terem sido cometidos dentro do presídio, as drogas não teriam adentrado no sistema penitenciário.

10.2.             Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1.                Questão JURÍDICA.

Lei n. 11.343/2006:

Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se: III – a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos;

10.2.2. Correta a aplicação da majorante?

R: SIM.

O art. 40, III, da Lei n. 11.343/2006 dispõe que as penas previstas nos arts. 33 a 37 da Lei são aumentadas de um sexto a dois terços se a infração tiver sido COMETIDA nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos.

No caso, parte dos acusados de integrar associação criminosa que movimentava grandes volumes de entorpecentes entre estados diversos da federação estavam presos e organizavam a dinâmica da quadrilha por meio de telefones celulares possuídos clandestinamente. Assim, em estando os autores dos crimes incluídos no sistema penitenciário, não se pode afastar a conclusão de que seus atos foram praticados no interior do presídio, ainda que os efeitos destes atos tenham se manifestado a quilômetros de distância.

O inciso III do art. 40 da Lei n. 11.343/2006 não faz a exigência de que as drogas, objeto do crime, efetivamente passem por dentro dos locais que se busca dar maior proteção, mas apenas que o cometimento dos crimes tenha ocorrido em seu interior.

10.2.3.                Resultado final.

Não é necessário que a droga passe por dentro do presídio para que incida a majorante prevista no art. 40, III, da Lei n. 11.343/2006.

11.  Indulto natalino e ressalvas ao regime de cumprimento de pena

RECURSO ESPECIAL

O Decreto n. 9.246/2017 não traz nenhuma ressalva ao regime de cumprimento de pena quando dispõe sobre a comutação aos condenados que cumprem pena privativa de liberdade.

REsp 1.828.409-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 01/10/2019, DJe 08/10/2019

11.1.             Situação FÁTICA.

Juarez, reincidente, foi condenado a 12 anos de reclusão por roubos circunstanciados. As instâncias ordinárias declararam a comutação de suas penas, “uma vez que cumprido 1/4 da pena até 25/12/2017 e por não possuir falta grave nos 12 meses anteriores” à publicação do Decreto n. 9.246/2017.

O Ministério Público discordou da decisão por entender que houve contrariedade aos arts. 7°, I, “b” e 8°, ambos do Decreto Presidencial n. 9.246/2017, uma vez que não é cabível a comutação aos apenados do regime semiaberto.

11.2.             Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1.                Questão JURÍDICA.

Decreto n. 9.246/2017:

Art. 3º O indulto natalino ou a comutação de pena não será concedido às pessoas condenadas por crime:

I – de tortura ou terrorismo;

II – tipificado nos art. 33, caput e § 1º , art. 34 , art. 36 e art. 37 da Lei nº 11.343, de 2006 , exceto na hipótese prevista no art. 1º, caput , inciso IV, deste Decreto;

III – considerado hediondo ou a este equiparado, ainda que praticado sem grave ameaça ou violência a pessoa, nos termos da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990 ;

IV – praticado com violência ou grave ameaça contra os militares e os agentes de segurança pública, de que tratam os art. 142 e art. 144 da Constituição , no exercício da função ou em decorrência dela;

V – tipificado nos art. 240 , art. 241 e art. 241-A , caput e § 1º, da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 ; ou

VI – tipificado nos art. 215 , art. 216-A , art. 218 e art. 218-A do Decreto-Lei nº 2.848 , de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal.

Art. 4º O indulto natalino ou a comutação não será concedido às pessoas que:

I – tenham sofrido sanção, aplicada pelo juízo competente em audiência de justificação, garantido o direito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, em razão da prática de infração disciplinar de natureza grave, nos doze meses anteriores à data de publicação deste Decreto;

II – tenham sido incluídas no Regime Disciplinar Diferenciado, em qualquer momento do cumprimento da pena;

III – tenham sido incluídas no Sistema Penitenciário Federal, em qualquer momento do cumprimento da pena, exceto na hipótese em que o recolhimento se justifique por interesse do próprio preso, nos termos do art. 3º da Lei nº 11.671, de 8 de maio de 2008 ; ou

IV – tenham descumprido as condições fixadas para a prisão albergue domiciliar, com ou sem monitoração eletrônica, ou para o livramento condicional, garantido o direito aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

§ 1º Na hipótese de a apuração da infração disciplinar não ter sido concluída e encaminhada ao juízo competente, o processo de declaração do indulto natalino ou da comutação será suspenso até a conclusão da sindicância ou do procedimento administrativo, que ocorrerá no prazo de trinta dias, sob pena de prosseguimento do processo e efetivação da declaração.

§ 2º Decorrido o prazo a que se refere o § 1º sem que haja a conclusão da apuração da infração disciplinar, o processo de declaração do indulto natalino ou da comutação prosseguirá.

Art. 8º Os requisitos para a concessão do indulto natalino e da comutação de pena de que trata este Decreto são aplicáveis à pessoa que: 

I – teve a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos;

II – esteja cumprindo a pena em regime aberto;

III – tenha sido beneficiada com a suspensão condicional do processo; ou

IV – esteja em livramento condicional.

11.2.2. Devido o benefício a Juarez? (esse nunca vai gritar Fora Temer)

R: SIM.

O indulto e a comutação, no ordenamento pátrio, não estão restritos apenas a fundamentos humanitários e costumam ser previstos anualmente, de forma coletiva, como verdadeiro instrumento de política criminal colocado à disposição do Presidente da República, segundo sua conveniência.

Segundo o STJ, o perdão das penas é ato discricionário associado ao combate ao hiperencarceramento, com vistas ao retorno do preso ao convívio social. No Decreto Presidencial n. 9.246/2017, foi concedida a comutação às pessoas condenadas a pena privativa de liberdade em 1/4, se reincidentes, e que, até 25 de dezembro de 2017, tenham cumprido 1/3 da pena.

Não houve nenhuma ressalva ou especificação do regime prisional em curso. Consta do regramento, tão somente, que o benefício não alcançaria os sentenciados por crimes elencados no art. 3° ou que não preenchessem o requisito subjetivo do art. 4°. Conquanto o indulto e a comutação coletivos tenham por finalidade combater a lotação nos presídios e propiciar que encarcerados retornem ao convívio social, o Decreto Presidencial n. 9.246/2017 incluiu como beneficiado (e não restringiu) aquele sentenciado que não estava em situação de reclusão.

Mesmo com a reinserção já estimulada por outros meios (penas substitutivas, regime aberto, livramento condicional e suspensão condicional do processo) e sem motivo humanitário, as pessoas descritas no art. 8° também foram agraciadas com o perdão. Ao incluir na previsão legal as pessoas que estão em liberdade ou bastante próximas de sua obtenção, o Presidente da República não vedou, via reversa, o benefício aos reeducandos dos regimes semiaberto e fechado. Assim, o art. 8° do Decreto n. 9.246/2017 é norma INCLUSIVA e não proibitiva.

11.2.3.                Resultado final.

O Decreto n. 9.246/2017 não traz nenhuma ressalva ao regime de cumprimento de pena quando dispõe sobre a comutação aos condenados que cumprem pena privativa de liberdade.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

12.  Honorários dos advogados dativos e tabela da OAB

RECURSO ESPECIAL

(1) As tabelas de honorários elaboradas unilateralmente pelos Conselhos Seccionais da OAB não vinculam o magistrado no momento de arbitrar o valor da remuneração a que faz jus o defensor dativo que atua no processo penal; servem como referência para o estabelecimento de valor que seja justo e que reflita o labor despendido pelo advogado. (2) Nas hipóteses em que o juiz da causa considerar desproporcional a quantia indicada na tabela da OAB em relação aos esforços despendidos pelo defensor dativo para os atos processuais praticados, poderá, motivadamente, arbitrar outro valor. (3) São vinculativas, quanto aos valores estabelecidos para os atos praticados por defensor dativo, as tabelas produzidas mediante acordo entre o Poder Público, a Defensoria Pública e a seccional da OAB. (4) Dado o disposto no art. 105, parágrafo único, II, da Constituição da República, possui caráter vinculante a Tabela de Honorários da Justiça Federal, assim como tabelas similares instituídas, eventualmente, pelos órgãos competentes das Justiças dos Estados e do Distrito Federal, na forma dos arts 96, I, e 125, § 1º, parte final, da Constituição da República.

REsp 1.656.322-SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 23/10/2019, DJe 04/11/2019 (Tema 984)

12.1.             Situação FÁTICA.

Dr. Gerúndio, advogado dativo nomeado em certo processo criminal, não conformado com o valor arbitrado a títulos de honorários advocatícios em consonância com o art. 20, § 4º, do CPC/1973 (atual art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC/2015) interpôs sucessivos recursos com o intento de que a decisão deveria ter observado o art. 22, §§1º e 2º, da Lei n. 8.906/2004 (Estatuto da OAB), ou seja, os honorários haveriam de ser fixados em conformidade com a tabela da OAB.

12.2.             Análise ESTRATÉGICA.

12.2.1.                Questão JURÍDICA.

Lei n. 8.906/1994:

Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência.

§ 1º O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado.

CF/88:

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.

§ 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.

12.2.2. A tabela é vinculante?

R: NÃO.

A indicação de ADVOGADO DATIVO, consoante o art. 22, § 1°, da Lei n. 8.906/1994, resulta em arbitramento de honorários àquele profissional, os quais devem ser suportados pelo Estado, compreendido como ente político a quem incumbia o dever de prestar a assistência judiciária.

Assim, no caso da Justiça estadual, tal incumbência é do ente federado respectivo. No que toca ao tema objeto deste Recurso, se há, de um lado, os que defendem que a remuneração do defensor dativo não se enquadra em nenhuma das hipóteses em que incidiria a Lei de Responsabilidade Fiscal, máxime porque sua atuação é imposta por determinação judicial, de outro lado é inquestionável que os gastos com pagamentos de honorários são suportados com o orçamento da Administração Pública, o que reflete, em alguma medida, o objetivo proposto pela referida lei de controle fiscal.

A condição sui generis da relação estabelecida pelo advogado e o Estado, não só por se tratar de particular em colaboração com o Poder Público, mas também por decorrer de determinação judicial, a fim de possibilitar exercício de uma garantia fundamental da parte, implica a existência, ainda que transitória, de vínculo que o condiciona à prestação de uma atividade em benefício do interesse público.

Em outras palavras, a hipótese do parágrafo primeiro do art. 22 do Estatuto da OAB abrange os casos em que não é possível celebrar, sem haver previsão legal, um contrato de honorários convencionais com o Poder Público. O parágrafo segundo, por sua vez, compreende justamente os casos em que, a despeito de possível o contrato de honorários convencionais, tal não se dá, por qualquer motivo. O arbitramento judicial é a forma de se mensurarem, ante a ausência de contratação por escrito, os honorários devidos. Apesar da indispensável provocação judicial, não se confundem com os honorários de sucumbência, porquanto não possuem natureza processual e independem do resultado da demanda proposta.

 Especificamente para essa hipótese é que o parágrafo segundo prevê, diversamente do que ocorre com o parágrafo primeiro, que os valores a serem arbitrados não poderão ser inferiores aos previstos nas tabelas da Seccionais da OAB. Assim, há um tratamento explicitamente distinto para ambos os casos.

A utilização da expressão “segundo tabela organizada”, prevista no primeiro parágrafo do art. 22 do Estatuto da OAB, deve ser entendida como REFERENCIAL, visto que não se pode impor à Administração o pagamento de remuneração com base em tabela produzida UNILATERALMENTE por entidade representativa de classe de natureza privada, como contraprestação de serviços prestados, fora das hipóteses legais de contratação pública. Já a expressão “não podendo ser inferiores”, contida no parágrafo segundo, objetiva resguardar, no arbitramento de honorários, a pretensão do advogado particular que não ajustou o valor devido pela prestação dos serviços advocatícios.

Portanto, na linha de precedentes das Seções de Direito Público, a tabela de honorários produzida pela OAB deve servir apenas como referencial, sem nenhum conteúdo vinculativo, sob pena de, em alguns casos, remunerar, com idêntico valor, advogados com diferentes dispêndios de tempo e labor, baseado exclusivamente na tabela indicada pela entidade representativa.

Entretanto, ao fixar os honorários, o Magistrado, a despeito do caráter não vinculativo da tabela da OAB, deve tê-la como norte para avaliação, em cada situação concreta, de todo o trabalho desempenhado pelo profissional em confronto com os valores ali estabelecidos, de modo que o resultado dessa análise constitua valor justo e que represente um equilíbrio entre aquele que é indicado pela OAB e o extraído do labor e das despesas efetivas despendidas pelo defensor dativo, se, evidentemente, a tabela não possibilite refletir a realidade constatada pelo magistrado.

Em outras palavras, nas hipóteses em que o juiz da causa considerar desproporcional a quantia indicada na tabela da OAB em relação aos esforços despendidos pelo defensor dativo para os atos processuais praticados, poderá, motivadamente, arbitrar outro valor.

Nesse contexto, as tabelas produzidas com a convergência da Defensoria Pública, Poder Público e OAB devem ser observadas, isto é, passam a ser vinculativas, visto que sua confecção, diversamente do que ocorre com a tabela geral, não se deu de maneira unilateral, mas como resultado de ACORDO FORMULADO pelas referidas entidades. 

Insta ainda consignar que, no âmbito da Justiça Federal, há tabela vinculativa de honorários de defensor dativo, por determinação contida em Resolução do CNJ e ante disposição constitucional expressa (art. 105, parágrafo único, II, da CF) e que nas Justiças dos Estados nada impede que seus órgãos competentes também assim disciplinem a questão, na forma dos arts 96, I, e 125, § 1º, parte final, da Constituição da República.

12.2.3.                Resultado final.

As tabelas de honorários elaboradas unilateralmente pelos Conselhos Seccionais da OAB não vinculam o magistrado no momento de arbitrar o valor da remuneração a que faz jus o defensor dativo que atua no processo penal; servem como referência para o estabelecimento de valor que seja justo e que reflita o labor despendido pelo advogado.

13.  Substituição do relator quando vencido quanto à mera admissibilidade da acusação na fase do artigo 6º da Lei n. 8.038/1990.

AÇÃO PENAL

Não ocorre substituição do Relator quando ele for vencido quanto à mera admissibilidade da acusação na fase do artigo 6º da Lei n. 8.038/1990.

APn 849-DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Corte Especial, por maioria, julgado em 07/08/2019, DJe 25/10/2019

13.1.             Situação FÁTICA.

Foi proposta ação penal contra Conselheiro do Tribunal de Contas de certo estado pelo cometimento do crime previsto no artigo 312, caput, c/c o artigo 327, § 2º, do CP – peculato -, cuja denúncia foi recebida pela Corte Especial do STJ, por maioria de votos, na sessão de julgamento.

Ocorre que a denúncia foi recebida contra o entendimento do Ministro relator originário e de mais dois ministros que rejeitavam a acusação e o processo foi distribuído a um novo relator que havia votado favoravelmente à admissibilidade da denúncia.

 Em petição autônoma, o denunciado questionou a Relatoria do feito, a qual, no seu entendimento, deve ser atribuída ao Ministro relator originário ou que seja feita a livre distribuição da ação penal, cancelando a designação já realizada à relatoria.

13.2.             Análise ESTRATÉGICA.

13.2.1.                Questão JURÍDICA.

Lei n. 8.038/1990:

Art. 6º – A seguir, o relator pedirá dia para que o Tribunal delibere sobre o recebimento, a rejeição da denúncia ou da queixa, ou a improcedência da acusação, se a decisão não depender de outras provas.  

§ 1º – No julgamento de que trata este artigo, será facultada sustentação oral pelo prazo de quinze minutos, primeiro à acusação, depois à defesa.

§ 2º – Encerrados os debates, o Tribunal passará a deliberar, determinando o Presidente as pessoas que poderão permanecer no recinto, observado o disposto no inciso II do art. 12 desta lei.

Código de Processo Penal:

Art. 395.  A denúncia ou queixa será rejeitada quando:

I – for manifestamente inepta;

II – faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou           

III – faltar justa causa para o exercício da ação penal.

Art. 396.  Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.

Parágrafo único.  No caso de citação por edital, o prazo para a defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído.          

Art. 396-A.  Na resposta, o acusado poderá argüir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário.

§ 1o  A exceção será processada em apartado, nos termos dos arts. 95 a 112 deste Código.

§ 2o  Não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado, não constituir defensor, o juiz nomeará defensor para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por 10 (dez) dias.

Art. 397.  Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar:          

I – a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato;

II – a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;

III – que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou

IV – extinta a punibilidade do agente.

13.2.2. Deve haver nova distribuição?

R: NÃO.

O juízo de admissibilidade da denúncia nos delitos de competência originária dos Tribunais Superiores, regido pelo artigo 6º da Lei n. 8.038/1990, é DISTINTO daquele realizado pelos juízes singulares, disciplinado pelo CPP.

“Ao contrário do que acontece nos procedimentos submetidos à Lei n. 8.038/1990, em que o recebimento da denúncia e a análise das causas de absolvição sumária são englobadas em decisão única, colegiada (artigo 6º), nos procedimentos regidos pelo CPP o recebimento da denúncia é realizado por via de ato judicial sem conteúdo decisório (artigo 396), o qual é posteriormente integrado pela decisão que analisa as causas de absolvição sumária, depois de apresentada resposta à acusação” (artigo 397 do CPP). (AP 947, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe de 16/05/2017).

Em razão de condensar situações de absolvição sumária e de mero recebimento da denúncia, a fase processual do artigo 6º da Lei n. 8.038/1990, viabiliza decisões com ou sem análise de mérito, definitivas ou não. Segundo a doutrina, “a decisão que deixa de admitir a ação penal poderá ser de simples rejeição da denúncia, presente umas das hipóteses do art. 395 do CPP; de absolvição sumária, consoante o art. 397, I a III, do CPP; ou de extinção da punibilidade, na forma do art. 397, IV, do CPP”.

Posto isso, caso vencido o Relator em posicionamento apto a produzir coisa julgada material nessa fase do artigo 6º da Lei n. 8.038/1990, ou seja, em matéria refletida sobre o mérito da causa – casos de absolvição sumária ou de extinção da punibilidade (art. 397 do CPP) – deve a Relatoria ser substituída. Em sentido contrário, se vencido o Relator sob o fundamento incapaz de produzir coisa julgada material, como no caso de ausência de justa causa (art. 395 do CPP), não ocorre a substituição da relatoria. Conclui-se para assentar que o Ministro Relator que for vencido quanto à mera admissibilidade da acusação na fase do artigo 6º da Lei n. 8.038/1990 não deve ser substituído na relatoria para a instrução da ação penal.

Nesse caso, o Ministro prolator do primeiro voto divergente fica designado apenas para lavrar o acórdão, e prevento, tão somente, para os recursos e incidentes relacionados a esse julgamento. Por outro lado, vencido em questão de mérito relacionada à definição da ação penal, o relator originário deve ser substituído pelo Ministro que primeiro proferiu o voto divergente, ainda que antecipado, independentemente da adesão posterior à divergência pelo Ministro que sucede o relator originário na ordem de julgamento. É a inteligência do artigo 101 do RISTJ (“Se não houver revisor, ou se este também tiver sido vencido, será designado para redigir o acórdão o Ministro que proferiu o primeiro voto vencedor (art. 52, II)”). 

13.2.3.                Resultado final.

          Não ocorre substituição do Relator quando ele for vencido quanto à mera admissibilidade da acusação na fase do artigo 6º da Lei n. 8.038/1990.

14.  Competência para julgamento de crime contra vida cometido quando do crime de roubo armado contra órgãos, autarquias ou empresas públicas da União.

CONFLITO DE COMPETÊNCIAS

Compete à Justiça Federal julgar crime contra a vida em desfavor de policiais militares, consumado ou tentado, praticado no contexto de crime de roubo armado contra órgãos, autarquias ou empresas públicas da União.

CC 165.117-RS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 23/10/2019, DJe 30/10/2019

14.1.             Situação FÁTICA.

Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de Anderson e Alex (dupla sertaneja?), em razão da prática do crime de homicídio qualificado tentado. Os acusados, gente do bem, teriam efetuado disparos contra policiais militares para assegurar a impunidade e a obtenção da vantagem do crime de roubo à agência dos Correios (E.C.T.) de certo município do Rio Grande do Sul.

 O juízo federal declinou da competência para a Justiça Estadual da Comarca de Taquari/RS, por entender não haver no caso, hipótese de competência federal para júri (em termos simples, bicou o processo). Explicou, nesse sentido, não haver incidência da Súmula n. 122/STJ. Isso porque, inexistiria, segundo ele, interesse na União na hipótese que envolve crime doloso contra a vida não afeta a agente federal, serviço federal ou interesse federal.

Por sua vez, o juízo estadual entendeu pela incidência da mencionada súmula. Alegou que os crimes de roubo e homicídio se encontram conexos, assim como o de receptação. Por isso, concluiu pela competência federal. A questão chegou ao STJ por meio de conflito de competências.

14.2.             Análise ESTRATÉGICA.

14.2.1.  A quem compete julgar tal crime?

R: JUSTIÇA FEDERAL.

A Terceira Seção do STJ já assentou a competência da Justiça comum estadual para julgar crimes de homicídio praticados contra Policiais Militares estaduais no exercício de suas funções, mesmo que ocorridos no contexto do crime federal de contrabando. Propõe-se aqui uma DIFERENCIAÇÃO: na situação em que o crime de homicídio ou tentativa de homicídio é praticado no contexto do delito federal de contrabando, não se questiona a competência Estadual. Entretanto, quando o crime contra a vida é executado ou tentado no contexto de crime de roubo armado contra órgãos, autarquias ou empresas públicas da União, cuja tipificação traz as elementares da violência ou da grave ameaça, impera o reconhecimento da competência do Juízo Federal. Segundo a doutrina, quando um crime ocorre para garantir a impunidade ou vantagem de outro, tem-se a conexão objetiva consequencial ou sequencial.

No caso de roubo praticado em detrimento de empresa pública federal – por exemplo, Empresa de Correios e Telégrafos, Caixa Econômica Federal -, havendo a imediata perseguição com troca de tiros, eventual homicídio, consumado ou tentado, implicará conexão consequencial entre os dois delitos.

O crime contra a vida, nessa hipótese, só existe em razão do delito contra a empresa federal e seu objetivo último é o exaurimento da infração patrimonial. Em outros termos, no mundo fenomenológico, esse homicídio orbita em torno do roubo em detrimento da empresa pública federal em total dependência deste.

14.2.2.                Resultado final.

Compete à Justiça Federal julgar crime contra a vida em desfavor de policiais militares, consumado ou tentado, praticado no contexto de crime de roubo armado contra órgãos, autarquias ou empresas públicas da União. 

15.  (I)Licitude da  prova obtida por meio de revista íntima realizada com base unicamente em denúncia anônima

RECURSO ESPECIAL

É ilícita a prova obtida por meio de revista íntima realizada com base unicamente em denúncia anônima.

REsp 1.695.349-RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 08/10/2019, DJe 14/10/2019

15.1.             Situação FÁTICA.

Janaína e Rubens foram denunciados pela suposta prática dos crimes de tráfico de drogas. Em primeiro grau, o Juiz sentenciante desclassificou a conduta imputada ao acusado Israel para o crime previsto no art. 28 da Lei n. 11.343/2006 e, em seguida, o absolveu em relação a todos os delitos a ele imputados; ainda, absolveu Janaína quanto ao crime de associação para o tráfico de drogas e condenou-a pela prática do ilícito descrito no art. 33, § 2º, da Lei n. 11.343/2006.

Inconformado com a sentença, o Ministério Público interpôs apelação ao Tribunal de origem, que negou provimento ao recurso e, de ofício, reconheceu a ilicitude da prova acerca da materialidade produzida nos autos e, consequentemente, absolveu os réus. A ilicitude seria decorrente de revista íntima realizada em Janaína com base somente em denúncia anônima feita ao presídio no dia dos fatos.

O Parquet então interpôs recurso especial no qual sustentou que o fato de a acusada haver sido submetida à revista íntima não conduz, necessariamente, à ilicitude da prova, uma vez que a busca pessoal requer apenas fundadas suspeitas, nos termos do disposto no art. 240, § 2º, do Código de Processo Penal, circunstância que teria ficado devidamente caracterizada.

15.2.             Análise ESTRATÉGICA.

15.2.1.                Questão JURÍDICA.

CF/88:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

III – ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

15.2.2. Lícita a prova decorrente?

R: NÃO.

Segundo o STJ, é inarredável a afirmação de que a revista íntima, eventualmente, constitui conduta atentatória à dignidade da pessoa humana, em razão de, em certas ocasiões, violar brutalmente o direito à intimidade, à inviolabilidade corporal e à convivência familiar entre visitante e preso.

Em verdade, a adoção de revistas íntimas vexatórias e humilhantes viola tratados internacionais de Direitos Humanos firmados pelo Brasil e contraria recomendações da Corte Interamericana de Direitos Humanos, das Organizações das Nações Unidas e da Corte Europeia de Direitos Humanos.

Para compatibilizar os direitos e deveres envolvidos na questão relativa ao controle de ingresso de visitantes em estabelecimentos penitenciários, existem, basicamente, duas correntes. A primeira considera não ser possível a realização de revista íntima em presídios, por ser ela vexatória e atentatória à dignidade da pessoa humana, valor básico ensejador dos direitos fundamentais. Ainda, invoca a proibição constitucional de se submeter qualquer pessoa a tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III).

Há, no entanto, uma segunda corrente, para a qual é possível, sim, a realização de revista íntima em estabelecimentos prisionais, com base em uma PONDERAÇÃO DE INTERESSES, pois existe a necessidade de controlar a entrada de produtos proibidos nos presídios – armas, bebidas, drogas etc. -, de forma que, por questão de segurança pública e em nome da segurança prisional, estaria autorizada a medida (desde que, obviamente, fossem tomadas as cautelas devidas, tais como a realização de revista em mulheres por agentes públicos do sexo feminino).

No caso, a acusada foi submetida à realização de revista íntima com base, tão somente, em uma denúncia anônima feita ao presídio no dia dos fatos informando que ela tentaria entrar no presídio com drogas, sem a realização de outras diligências prévias para apurar a veracidade e a plausibilidade dessa informação. Portanto, se não havia fundadas suspeitas para a realização de revista na acusada, NÃO há como se admitir que a mera constatação de situação de flagrância, posterior à revista, justifique a medida, sob pena de esvaziar-se o direito constitucional à intimidade, à honra e à imagem do indivíduo.

15.2.3.                Resultado final.

É ilícita a prova obtida por meio de revista íntima realizada com base unicamente em denúncia anônima.

16.  Caráter da perícia antropológica diante de infração penal cometida por indígena

RECURSO EM HABEAS CORPUS

Embora não possua caráter vinculante, a realização de perícia antropológica constitui-se em importante instrumento para assistir as partes nos debates em plenário e também o julgador na imposição de eventual reprimenda, podendo, no caso, ser realizado após a pronúncia do réu, sem prejuízo ao andamento processual.

RHC 86.305-RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por maioria, julgado em 01/10/2019, DJe 18/10/2019

16.1.             Situação FÁTICA.

Dois indígenas integrantes do povo Kaigang foram acusados de duplo homicídio qualificado por fatos ocorridos “enquanto faziam manifestação pacífica em reivindicação à terra ancestral”. A defesa de ambos pleiteou a tradução dos autos para o idioma dos réus, concessão de intérprete para os atos processuais e, ainda, realização de estudo antropológico, o que foi negado pelo Juízo de primeiro grau e ainda pelo Tribunal local em sede de Habeas Corpus.

Inconformados com a negativa, os defensores dos indígenas interpuseram recurso da decisão no qual alegam que a perícia antropológica, segundo o artigo 59 do Código Penal Brasileiro, em combinação com o artigo 56 do Estatuto do Índio, seria o elemento-chave para a fixação da pena do réu, incidindo a sua omissão em violação ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório.

16.2.             Análise ESTRATÉGICA.

16.2.1. Relevante a realização da perícia?

R: SIM.

Embora a perícia antropológica não possua caráter vinculante, constitui importante instrumento para assistir o julgador no processo decisório.

A respeito do tema, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Embargos de Declaração na Petição n. 3.388/RR, relativo ao processo de demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, destacou a importância da realização do estudo antropológico, dado que “a inclusão de determinada área entre as ‘terras tradicionalmente ocupadas pelos índios’ não depende de uma avaliação puramente política das autoridades envolvidas, e sim de um estudo técnico antropológico. Sendo assim, a modificação da área demarcada não pode decorrer apenas das preferências políticas do agente decisório”.

Merece também relevo, mormente no âmbito penal, a Resolução n. 287/2019 do Conselho Nacional de Justiça, a qual estabelece que, “[a]o receber denúncia ou queixa em desfavor de pessoa indígena, a autoridade judicial poderá determinar, sempre que possível, de ofício ou a requerimento das partes, a realização de perícia antropológica, que fornecerá subsídios para o estabelecimento da responsabilidade da pessoa acusada”.

Portanto, resulta acentuada a relevância do estudo antropológico para a adequada compreensão dos contornos socioculturais tanto dos fatos analisados quanto dos indivíduos a quem são imputados, de modo a auxiliar o Juízo de primeiro grau na imposição de eventual reprimenda, mormente diante do que prescreve o art. 56 do Estatuto do Índio, segundo o qual, “[n]o caso de condenação de índio por infração penal, a pena deverá ser atenuada e na sua aplicação o Juiz atenderá também ao grau de integração do silvícola”.

Ante a concreta possibilidade de virem a ser julgados e, eventualmente, condenados pela prática dos crimes de que são acusados, será fundamental, para a precisa individualização das sanções criminais, que o juiz-presidente do Tribunal do Júri tenha as informações necessárias para efetuar o juízo de reprovação que consubstancia a ideia (lato sensu) de culpabilidade.

Não se verifica, assim, prejuízo ao andamento processual que, uma vez (e se) pronunciados os réus, seja determinada a realização do Estudo Antropológico, pari passu aos atos necessários à preparação do julgamento, para o qual, então, deverá o laudo estar concluído e colocado à disposição não apenas dos juízes, leigos e togados, mas também das partes, ao escopo de auxiliá-las nos debates que se desenvolverão em sessão plenária.

16.2.2.                Resultado final.

Embora não possua caráter vinculante, a realização de perícia antropológica constitui-se em importante instrumento para assistir as partes nos debates em plenário e também o julgador na imposição de eventual reprimenda, podendo, no caso, ser realizado após a pronúncia do réu, sem prejuízo ao andamento processual.

Jean Vilbert

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