Artigo

Relação Jurídico-Tributária: o Fato Gerador

Conceitos Iniciais

O objetivo deste texto se destina a apresentar e explicar a relação jurídico-tributária, apresentando um de seus elementos: o fato gerador.

A relação jurídico-tributária é a relação fundamental no direito tributário, composta de uma sequência de eventos que consolidam o vínculo entre o ente estatal (quem possui a competência para exigir o tributo) e o sujeito passivo (aquele que deve pagar o tributo).

Neste texto, com o objetivo de tornar mais fácil a identificação e compreensão dos conceitos, o foco será em dois elementos primordiais da relação jurídico-tributária: a hipótese de incidência e o fato gerador. Tais elementos são fundamentais para que essa relação jurídico-tributária ocorra no mundo real.

O direito tributário brasileiro é regido pela Constituição Federal de 1988 (CF/88) e também pela lei n. 5.172/1966, conhecida como o Código Tributário Nacional (CTN).

A hipótese de incidência: o fato gerador em abstrato

A hipótese de incidência é situação ou circunstância, que é prevista em lei – ainda de forma abstrata – que descreve um fato ou fatos que, uma vez ocorridos no mundo real, acarretará a criação desta relação tributária, através do nascimento da obrigação tributária.

A hipótese de incidência é a previsão de um acontecimento, que, uma vez concretizada, impõe que essa ocorrência tenha o condão de exigir da pessoa ou grupo de pessoas que ela pague o tributo, que passa a ser exigível desta pessoa, já que ela fez parte do acontecimento narrado na lei.

Obviamente, a lei prevê esta situação em primeiro lugar, para, depois que esta situação ocorra, estejam configuradas as condições para a cobrança do tributo. A lei, neste caso, possui um caráter prospectivo, pois, de outra forma, violaria o princípio da irretroatividade. A hipótese de incidência também é chamada de fato gerador em abstrato, já que trata de uma previsão de conduta ou acontecimento que ainda não ocorreu.

Desta maneira, o legislador, ao criar a lei, estabelece a descrição de uma circunstância, de um fato tributário que resultará, uma vez que ocorra, na obrigação do sujeito passivo de pagar um tributo ao sujeito ativo.

A hipótese de incidência é um esboço sobre um fato tributável - que ainda irá acontecer
A hipótese de incidência é um esboço sobre um fato tributável – que ainda irá acontecer

Fato gerador: em concreto

O fato gerador é uma evolução da hipótese de incidência, pois ocorre no mundo dos fatos. O acontecimento previsto na lei se verifica no mundo real. O fato gerador também é chamado de fato gerador em concreto, pois ocorre a adequação da circunstância que ocorre com o texto previsto na lei.

Essa adequação, este ajuste perfeito entre a situação descrita em lei e o que se vê no mundo real se chama consunção. Ou seja, quando se fala em uma das espécies de tributo, o Imposto de Renda, quando uma pessoa ganha uma renda ou provento, isso coincide com a situação prevista em lei – estabelecendo a perfeita consunção e concretizando o fato imponível, que gera, para a pessoa que materializa esse fato a obrigação de pagar o tributo (nesse caso, o Imposto de Renda).

E existem três tipos de fato gerador: o instantâneo, o complexivo e o periódico ou continuado.

O fato gerador instantâneo é aquele que surge de um simples ato, negócio ou operação singular.previsão na lei, e o fato gerador instantâneo se inicia e se encerra em um só instante. Um bom exemplo de fato gerador instantâneo é o Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços, o ICMS, estadual, quando ocorre uma venda de qualquer produto. O momento da venda representa o fato gerador complexivo.

Outro exemplo é o Imposto sobre Transmissões de Bens Imóveis Intervivos, o ITBI, municipal. O momento do registro da transmissão da propriedade é o instante em que se considera ocorrido o fato gerador deste imposto.

O fato gerador complexivo ou periódico é o fato gerador que possui sua realização ao longo de um espaço de tempo. Portanto, não são de curtos instantes, mas de um espaço de tempo determinado, em que ocorrem todos os acontecimentos que, agregados, somados, irão concretizar o fato gerador.

O exemplo mais ilustrativo do fato gerador complexivo ou periódico é, sem dúvida, o fato gerador do Imposto de Renda (IR), principalmente na sua modalidade para as pessoas físicas, pois a doutrina majoritária compreende ele ocorrido ao longo de um exercício (ano civil), concluído em seu respectivo dia 31 de dezembro. No caso da pessoa jurídica o IR também é considerado complexivo, pois no lucro real ele deve ser apurado em um trimestre.   

O fato gerador periódico ou continuado é aquele cuja formação se dá de forma duradoura e estável, bem como de forma periódica. Ele leva um período para se completar, geralmente de um ano. Desta maneira, são efetuados cortes temporais, para que ele periodicamente seja construído – como ocorre com o Imposto Predial e Territorial Urbano, o IPTU, imposto municipal, em todo o dia 1.o de janeiro de cada ano.

A consunção ocorre quando a hipótese de incidência e o fato gerador coincidem no mundo real
A consunção ocorre quando a hipótese de incidência e o fato gerador coincidem no mundo real

Aspectos da Ocorrência do Fato Gerador

Existem algumas disposições acerca da ocorrência do fato gerador no CTN. A primeira delas é sobre quando se considera ocorrido o fato gerador, no art. 116:” Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:

        I – tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios;

        II – tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.

        Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.”

O fato gerador, salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido de duas formas: na situação de fato e na situação jurídica.

A situação de fato trata da questão observável no mundo real, qual seja, em que todos os elementos necessários estejam presentes para que o fato gerador se considere ocorrido. Por exemplo, no Imposto de Importação, tais elementos são o produto estrangeiro, o importador e a entrada deste produto no território nacional – juntando tudo isso, estão concretizadas as circunstâncias materiais.

Por outro lado, existem tributos cujo fato gerador não se verifica em circunstâncias materiais, mas em situação jurídica, desde que definitivamente constituída, nos termos do direito aplicável. Isso ocorre com o ITBI, pois a situação se encontra definitivamente constituída quando for registrada a escritura de compra e venda – nesse imposto, é o que determina a lei civil.

Outras disposições sobre o fato gerador

Existem outros fatores que podem influenciar na ocorrência do fato gerador. Um desses fatores são os negócios jurídicos condicionais. Negócio jurídico condicional é aquele sujeito a um evento futuro e incerto, podendo a condição ser suspensiva ou resolutória. Seguem as especificações do artigo 117: “Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados:

        I – sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento;

        II – sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da celebração do negócio.”

Na condição suspensiva, somente com o cumprimento (implemento)da condição é que o fato gerador se concretiza. Como quando se ganha um prêmio por uma competição, somente quando se ganha a competição.

Na condição resolutória ocorre o contrário: a condição é válida desde o início, até que um evento posterior retire a validade da condição. Um exemplo disso ocorre quando se concede algo a alguém enquanto ela cumprir aqueles requisitos que ela cumpre agora – quando não houver esses requisitos, ela não reúne mais as condições.

O último fator importante sobre fato gerador está no artigo 118 do CTN: “A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se:

        I – da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos;

        II – dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos.

Existem duas considerações: o CTN define que o fato gerador deve ser definido abstraindo-se da validade jurídica dos atos praticados. O que se observa é que no mundo real, muitas vezes são realizados negócios jurídicos simulados, ou mesmo fraudes. O fato de ter sido realizada uma ilegalidade pode anular o negócio, mas isso não interfere na relação tributária.

Isso quer dizer que a análise do fato gerador é objetiva: verificar se o fato gerador ocorreu ou não, independentemente de legal ou não. É importante essa disposição, pois se a legalidade dos atos fosse a única hipótese de ocorrência do fato gerador, o traficante de drogas poderia se beneficiar de sua própria torpeza para alegar uma não-incidência do IR – punindo, indiretamente, o cidadão honesto.

Evidentemente que isso se aplica quando a ilegalidade é circunstancial ao fato gerador (a renda auferida do tráfico), mas não quando é o elemento central do fato gerador (como quando se cobrou ICMS pela circulação de drogas – a circulação de drogas é um ilícito criminal, não podendo incidir imposto sobre esta atividade) – questão já respondida inclusive em jurisprudência.

Um exemplo de negócio jurídico sob condição são os contratos
Um exemplo de negócio jurídico sob condição são os contratos

Conclusões

A relação jurídico-tributária é o liame que estabelece o vínculo entre o estado, sujeito ativo, como sujeito competente para cobrar tributos e o sujeito passivo, a pessoa física ou jurídica que deverá pagar o tributo.

Essa relação, para ser legítima, precisa estar estabelecida em lei formal. Isso significa que há a necessidade de que seja prevista uma hipótese de incidência – uma situação delineada pelo legislador, que uma vez ocorrida, irá gerar o fato gerador do tributo.

A hipótese de incidência é o pressuposto, é a premissa – é o aspecto abstrato, enquanto o fato gerador é a própria situação constituída, é o fato acontecido, é a concretização de um pré-requisito já estabelecido anteriormente.

A ocorrência do fato gerador constitui a relação tributária, conhecida como obrigação tributária, que gera ao sujeito ativo o poder de exigir do sujeito passivo o recolhimento do tributo ao qual possui direito. Estes são dois dos elementos fundamentais da relação jurídico-tributária.

Ricardo Pereira de Oliveira

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