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Cessão de direitos na Lei 4.320/64

Olá, nobres! Vamos abordar hoje acerca da cessão de direitos na Lei 4.320/64 e suas implicações. É um tema bem recente e que tem grandes chances de cobrança em concursos que cobram Direito Financeiro, tais como Fiscal e Controle. Vamos Juntos!!

Cessão de crédito

Contextualização da Cessão de Direitos

Pessoal, antes de iniciarmos com os dispositivos da Lei, é importante contextualizarmos como as coisas normalmente acontecem na Administração Pública.

Primeiramente, segue o conceito de cessão de créditos constante no Código Civil Brasileiro:

Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação.

Entretanto, tal artigo normalmente era aplicado apenas aos particulares e não à Administração Pública. Isso porque, o bem público é indisponível, não podendo ser cedido a terceiros sem expressa previsão legal nesse sentido.

Em que pese o conceito de crédito público ser muito abrangente, vamos conceituar usando os termos da Lei 4.320/64, Art. 39 §2:

Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multas de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, aluguéis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.

Situação dos créditos antes da Lei Complementar nº 208/2024

Nobres, após o transcurso do prazo para pagamento de um crédito em favor da União, Estados, DF ou Municípios, tais valores eram inscritos em Dívida Ativa, ou seja, gerava-se um título executivo de natureza extrajudicial que permitia a cobrança imediata, seja protestando o título em cartório, seja a inscrição em cadastro de devedores (SPC e SERASA) ou via ação de execução por meio da Promotoria ou Procuradoria do Ente.

Ocorre, pessoal, que a realidade é que os Entes (principalmente Estados e Municípios) possuem limitações operacionais para executar os diversos títulos (créditos), muitos deles prescreviam(período de 5 anos a contar da inscrição em dívida ativa) e os Entes não dispõem da mesma capacidade e instrumentos legais que o meio privado possui para “constranger” o terceiro devedor a pagar.

Foi nesse contexto em que se aprovou a Lei Complementar Nº 208/2024, permitindo que o Poder público cedesse ONEROSAMENTE seus créditos a receber a terceiros privados, mediante adiantamento desses do valor, com o desconto devido da operação financeira. É similar, por exemplo, quando você vai ao banco e solicita adiantamento do seu imposto de renda. O banco irá liberar o valor, cobrando um taxa na operação.

Aspectos da Cessão de direitos na Lei 4.320/64

Visto esses conceitos iniciais, passemos aos termos da Lei Complementar 208/2024 que acrescentou o Art 39-A na Lei 4.320/64.

Importante pontuar que como a cessão de créditos públicos é questão de Direito Financeiro, somente lei complementar poderia dispor sobre esse assunto, nos termos do Art. 163, inciso I da Constituição Federal.

Segue o Art. 39.A:

A União, o Estado, o Distrito Federal ou o Município poderá ceder onerosamente, 
nos termos desta Lei e de lei específica que o autorize, direitos originados de créditos tributários e não tributários, inclusive quando inscritos em dívida ativa, a pessoas jurídicas de direito privado ou a fundos de investimento regulamentados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Comentários. Tanto créditos tributários(impostos, taxas e contribuição de melhoria), quanto créditos não tributários (foros, laudêmios, indenizações etc) podem ser cedidos a pessoas jurídicas de direito privado. Entretanto, CADA ENTE deverá dispor sobre esse tema mediante lei específica. O disposto na Lei 4.320/64 somente autorizou a possibilidade.

§ 1º Para fins do disposto no caput, a cessão dos direitos creditórios deverá:

I – preservar a natureza do crédito de que se tenha originado o direito cedido, mantendo as garantias e os privilégios desse crédito;

II – manter inalterados os critérios de atualização ou correção de valores e os montantes representados pelo principal, os juros e as multas, assim como as condições de pagamento e as datas de vencimento, os prazos e os demais termos avençados originalmente entre a Fazenda Pública ou o órgão da administração pública e o devedor ou contribuinte;

III – assegurar à Fazenda Pública ou ao órgão da administração pública a prerrogativa de cobrança judicial e extrajudicial dos créditos de que se tenham originado os direitos cedidos;

Comentários: Nos 3(três) primeiros incisos, nobres, o legislador afirma que a natureza do crédito, mesmo com a cessão, mantem-se inalterada. Ou seja, as garantias e privilégios continuam existindo. Exemplo: Se um crédito de um município que foi garantido por uma hipoteca for transferido à pessoa privada, esse mantém a possibilidade de executar a hipoteca(manteve a garantia).

Além disso, os critérios de correção de valores e juros se mantém inalterados, isso serve para dar segurança ao devedor de que sua dívida não terá outros critérios que não os inicialmente previstos.

Por fim, a prerrogativa de cobrança judicial e extrajudicial dos créditos originais é mantida com a Fazenda Pública ou o órgão da administração pública, mesmo após a cessão dos direitos creditórios. Isso garante que o Estado continue exercendo seu poder de coerção e cobrança, preservando as garantias e privilégios inerentes ao crédito público, como privilégios de execução fiscal e acesso a procedimentos especiais.

Prosseguindo…

IV – realizar-se mediante operação definitiva, isentando o cedente de responsabilidade, compromisso ou dívida de que decorra obrigação de pagamento perante o cessionário, de modo que a obrigação de pagamento dos direitos creditórios cedidos permaneça, a todo tempo, com o devedor ou contribuinte;

V – abranger apenas o direito autônomo ao recebimento do crédito, assim como recair somente sobre o produto de créditos já constituídos e reconhecidos pelo devedor ou contribuinte, inclusive mediante a formalização de parcelamento;

Comentários: A operação de cessão de crédito é definitiva, ou seja, uma vez feita com uma empresa, por exemplo, não pode ser desfeita. Ademais, o recebedor do crédito somente pode cobrar a dívida do devedor original e não da Administração que cedeu o direito. Já o inciso V nos diz que a cessão de direito só é possível quando o produto do crédito está definitivamente constituído, mesmo se for parcelamento (causa de reconhecimento de dívida). Assim, por exemplo, se você está com um processo administrativo junto à Prefeitura de seu município discutindo o valor do IPTU, esse valor não está definitivamente constituído e, por conseguinte, não pode ser objeto de cessão de crédito.

Por fim, temos que a Lei proíbe a cessão de créditos nos últimos 90(noventa) dias do encerramento do mandado do chefe do executivo(prefeito, governador e presidente), ressalvado o caso em que o integral pagamento pela cessão dos direitos creditórios ocorra após essa data. Essa regra visa proteger o novo chefe do executivo a fim de não receber a gestão com desfalque de caixa.

Ademais, a cessão de créditos não poderá abranger percentuais que por força constitucional sejam de outro Ente da Federação. Exemplo: Uma empresa teve um crédito lançado contra si de Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) sobre o ouro extraído na cidade de Poconé-Mato Grosso. Por força constitucional, desse valor 30% pertence ao Estado (Mato Grosso) e 70% pertence ao Município de Poconé-MT. Logo, caso o Governador do MT quisesse ceder o direito de tal crédito, só poderia fazê-lo sobre os 30% do valor que lhe cabe.

Conclusão

Finalizamos aqui, nobres. É importante que leiam com calma e atenção aos dispositivos da Lei complementar Nº 208, pois há outros incisos que complementam o entendimento. Porém, com toda a explicação trazida, vocês rapidamente assimilarão.

Bons Estudos.

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