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Revisão STF (Parte 1) 2023.1

O STF está de recesso, mas nós não paramos no meio da estrada, não é?! Bora revisar o que o STF de mais importante decidiu no primeiro semestre de 2023. Nessa Parte 1 da nossa revisão temos Direito Constitucional, Administrativo, Processo Civil e Processo Penal.

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DIREITO CONSTITUCIONAL

1.      Art. 127 da LEP: perda de dias remidos por falta grave e revisão ou cancelamento do enunciado da súmula vinculante 9

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

1. A revogação ou modificação do ato normativo em que se fundou a edição de enunciado de súmula vinculante acarreta, em regra, a necessidade de sua revisão ou cancelamento pelo Supremo Tribunal Federal, conforme o caso. 2. É constitucional a previsão legislativa de perda dos dias remidos pelo condenado que comete falta grave no curso da execução penal.

RE 1.116.485/RS, relator Ministro Luiz Fux julgamento virtual finalizado em 28.2.2023 (Info 1084)

1.1.                       Situação FÁTICA.

A Defensoria Pública do RS interpôs RE alegando a necessidade da revisão da Súmula Vinculante 9, em virtude da superveniência da Lei 12.433/2011, que, ao alterar o art. 127 da Lei de Execução Penal, permite ao juiz, nos casos de cometimento de falta grave, revogar até 1/3 do tempo remido, reiniciando-se a contagem a partir da data da infração disciplinar. Para tanto, o juiz deverá observar a natureza, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato, bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão, conforme o art. 57 da LEP.

1.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.                        Questão JURÍDICA.

Lei 11.417/2006:

Art. 5º Revogada ou modificada a lei em que se fundou a edição de enunciado de súmula vinculante, o Supremo Tribunal Federal, de ofício ou por provocação, procederá à sua revisão ou cancelamento, conforme o caso.”

LEP/1984: “Art. 127.  Em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar

1.2.2.                        Se a lei for alterada, a súmula pode ser revista?

R: Até pode, mas aqui não é o caso…

Em regra, deve-se revisar ou cancelar enunciado de súmula vinculante quando ocorrer a revogação ou a alteração da legislação que lhe serviu de fundamento. Contudo, o STF pode concluir, com base nas circunstâncias do caso concreto, pela desnecessidade de tais medidas.

O papel de última instância decisória e a função de órgão soberano sobre a interpretação constitucional não foram conferidos constitucionalmente ao STF de forma isolada e absoluta. Em um ambiente democrático, não se deve atribuir a qualquer órgão, seja do Poder Judiciário, seja do Poder Legislativo, a faculdade de pronunciar a última palavra sobre o sentido da Constituição. Com efeito, visando promover o avanço e o aperfeiçoamento de soluções democráticas às questões de interesse público, a interpretação constitucional deve perpassar por um processo de construção plural entre os Poderes estatais — Legislativo, Executivo e Judiciário — e os diversos segmentos da sociedade civil organizada.

O Poder Legislativo possui a prerrogativa de superar entendimentos vinculantes firmados pela Corte, mas, a depender do instrumento normativo adotado pelo Congresso Nacional, o caso concreto pode demandar posturas distintas por parte do STF. Nesse contexto, o art. 5º da Lei 11.417/2006, que regulamentou o art. 103-A da CF/1988, ofereceu solução para as hipóteses em que haja modificação ou revogação do diploma legislativo em que a edição da Súmula Vinculante tenha se fundado.

Assim, na hipótese de manifesta dúvida sobre a constitucionalidade da lei superveniente de conteúdo divergente e da medida legislativa adotada, o Poder Judiciário, quando provocado, pode se debruçar novamente sobre a questão, de modo a estabelecer a prevalência ou não do conteúdo da Súmula Vinculante no caso concreto, com a manutenção de seus efeitos.

1.2.3.                        Resultado final.

Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 477 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário. Nos termos do art. 5º da Lei 11.417/2006, o Tribunal resolveu aguardar o julgamento das Propostas de Súmula Vinculante 60 e 64 para que se delibere quanto à oportunidade da revisão ou cancelamento da SV 9, via adequada para apreciação da questão.

2.      Remoção entre juízes vinculados a tribunais de justiça distintos

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

É inconstitucional — por violar a competência da União para dispor sobre a magistratura brasileira, tanto na justiça estadual como na justiça federal — norma estadual que permite a remoção entre juízes de direito vinculados a diferentes tribunais de justiça.

ADI 6.782/RN, relator Ministro Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em 3.3.2023 (Info 1085)

2.1.                       Situação FÁTICA.

O PGR ajuizou a ADI 6782 em face de dispositivos de legislação do Acre que permitia a remoção, por permuta, entre magistrados vinculados a Tribunais de Justiça de diferentes estados.

2.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.                        Questão JURÍDICA.

CF/1988: “Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios

2.2.2.                        A norma é constitucional?

R: Nooops!!!!

Até o advento da lei complementar de iniciativa do STF, o Estatuto da Magistratura continua a ser disciplinado pela Lei Complementar 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN).

As disposições da LOMAN constituem um regime jurídico único dos magistrados do País. Assim, como o Poder Judiciário é nacional, os seus membros devem se submeter a regras uniformes, de modo que, para preservar a independência assegurada constitucionalmente ao Poder Judiciário, as normas da LOMAN vinculam o legislador e o judiciário estaduais.

Mas isso não quer dizer que pode permuta, por que o Poder é nacional. Ao contrário! Não se pode admitir que este ou aquele estado admitam tal modalidade de remoção. Logo, passou em um concurso de magistratura estadual, fica naquela estado. Se quiser ir para outro, faz concurso de novo!

2.2.3.                        Resultado final.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade do trecho “permitindo-se a remoção entre juízes vinculados a Tribunais de Justiça distintos, por resolução própria do Tribunal com a definição dos requisitos mínimos”, constante do art. 76, caput, da Lei Complementar 643/2018 do Estado do Rio Grande do Norte.

3.      Requisição de instauração de inquérito policial pela Defensoria Pública

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

É inconstitucional norma estadual que confere à Defensoria Pública o poder de requisição para instaurar inquérito policial.

ADI 4.346/MG, relator Ministro Roberto Barroso, redator do acórdão Ministro Alexandre de Moraes, julgamento virtual finalizado em 10.3.2023 (Info 1086)

3.1.                       Situação FÁTICA.

A Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) ajuizou no STF a ADI nº 4346, impugnando dispositivos de lei mineira que torna privativa da Defensoria Pública a assistência jurídica aos necessitados e inclui entre as atribuições da Defensoria a requisição e instauração de inquérito policial.

A Conamp alega que os dispositivos impugnados ofendem os artigos 5º, incisos LV e LXXIV; o artigo 22, I; o caput do artigo 127 e os incisos I, III e VI do artigo 129, todos da CF.

3.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.                        Questão JURÍDICA.

CPP/1941: “Art. 5º Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: I – de ofício; II – mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.

3.2.2.                        A norma é constitucional?

R: Nooops!!!!

Não pode ser estendida à requisição de instauração de inquérito policial o raciocínio inerente ao reconhecimento da constitucionalidade do poder concedido à Defensoria Pública de requisitar, de qualquer autoridade e de seus agentes, certidões, exames, perícias, vistorias, diligências, processos, documentos, informações, esclarecimentos e demais providências necessárias ao exercício de suas atribuições.

O poder de requisitar a instauração de inquérito policial está intrinsecamente ligado à persecução penal no País, o que exige uma disciplina uniforme em todo o território nacional. Nesse contexto, o Código de Processo Penal — norma editada no exercício da competência privativa da União para legislar sobre direito processual (CF/1988, art. 22, I) — já delimitou essa atribuição, conferindo-a SOMENTE à autoridade judiciária ou ao Ministério Público.

3.2.3.                        Resultado final.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, conheceu em parte da ação e, nessa extensão, por maioria, a julgou parcialmente procedente apenas para declarar a inconstitucionalidade da expressão “a instauração de inquérito policial”, constante do art. 45, XXI, da Lei Complementar 65/2003 do Estado de Minas Gerais.

4.      Vinculação da remuneração do Ministério Público com a da Magistratura

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

A vinculação entre os subsídios dos membros do Ministério Público, ou de função essencial à Justiça, e a remuneração da magistratura é vedada pelo art. 37, XIII, da Constituição Federal de 1988.

ADI 570/PE, relator Ministro Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 10.3.2023 (Info 1086)

4.1.                       Situação FÁTICA.

A Associação dos Magistrados Brasileiros-AMB ajuizou a ADI 570 por meio da qual requer a declaração da inconstitucionalidade dos dispositivos das Leis estaduais nº 10.437 e nº 10.438, ambas do estado de Pernambuco, por violarem o artigo 37, incisos IX, XI e XIII, da CF, pois concediam gratificações aos membros do Ministério Público e equiparavam seus vencimentos aos dos magistrados daquele estado em caso de reajuste. Além disso, faziam o mesmo com diversos cargos de procuradores, auditores etc., para que tivessem equiparação aos membros da magistratura e do MP.

4.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.                        Questão JURÍDICA.

CF/1988:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…) XIII – é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”

4.2.2.                        Possível a vinculação?

R: Nooops!!!!

Tanto a disciplina constitucional originária quanto a nova redação trazida pela EC 19/1998 vedam a vinculação remuneratória entre cargos públicos cujas atribuições sejam distintas, como é o caso de magistrados e membros do Ministério Público.

Por outro lado, é possível estabelecer gratificação por exercício de função essencial à Justiça, em favor de membro do Ministério Público com base no mesmo percentual e na mesma forma da gratificação dada ao magistrado, uma vez que o percentual incide sobre o vencimento base de cada qual e constitui apenas um parâmetro de cálculo.

4.2.3.                        Resultado final.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, (i) julgou parcialmente procedente a ação para declarar inconstitucionais o art. 3º da Lei 10.437/1990 e o caput do art. 3º da Lei 10.438/1990, ambas do Estado de Pernambuco; e (ii) julgou improcedente a ação com relação à parte final do art. 2º dos referidos diplomas legais.

5.      Responsabilidade civil do Estado e morte de cidadão em ação policial armada

AGRAVO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO

No caso de vítima atingida por projétil de arma de fogo durante uma operação policial, é dever do Estado, em decorrência de sua responsabilidade civil objetiva, provar a exclusão do nexo causal entre o ato e o dano, pois ele é presumido.

ARE 1.382.159 AgR/RJ, relator Ministro Nunes Marques, redator do acórdão Ministro Gilmar Mendes (Info 1089)

5.1.                       Situação FÁTICA.

Um menino dormia em sua casa quando foi atingido na cabeça por uma bala perdida. A situação ocorreu durante uma operação na favela carioca. A família ajuizou ação em face do estado carioca requerendo indenização. Ocorre que, de alguma forma, o projétil não foi encontrado, razão pela qual o RJ sustenta que seria impossível atribuir a responsabilidade da morte ao estado, já que não haveria como provar que o tiro teria sido efetuado por policiais.

5.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.                        Questão JURÍDICA.

 CPC/2015: “Art. 373. O ônus da prova incumbe: (…) II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

5.2.2.                        Há responsabilidade estatal?

R: Yeaph!!!!

No contexto de incursões policiais, comprovado o confronto armado entre agentes estatais e criminosos (ação), e a lesão ou morte de cidadão (dano) por disparo de arma de fogo (nexo), o Estado deve comprovar a ocorrência de hipóteses interruptivas da relação de causalidade.

A ação de agentes estatais — munidos de armamento letal, em área urbana densamente povoada, deflagrando ou reagindo a confronto com criminosos — impõe ao ente estatal a demonstração da conformidade da intervenção das forças de segurança pública, visto que possui condições de elucidar as causas e circunstâncias do evento danoso.

A atribuição desse ônus probatório é decorrência lógica do monopólio estatal do uso da força e dos meios de investigação. O Estado possui os meios para tanto — como câmeras corporais e peritos oficiais —, cabendo-lhe averiguar as externalidades negativas de sua ação armada, coligindo evidências e elaborando os laudos que permitam a identificação das reais circunstâncias da morte de civis desarmados dentro de sua própria residência.

Na espécie, a perícia foi inconclusiva sobre a origem do disparo. A vítima foi alvejada por projétil de arma de fogo dentro de sua própria casa, enquanto deitado na cama com sua mãe, quando ocorria incursão de agentes estatais armados, com disparos de armas de fogo. Assim, ausente a comprovação pelo Estado de caso fortuito, força maior, culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro ou outra circunstância interruptiva do nexo causal, mostra-se inafastável o dever de indenizar.

5.2.3.                        Resultado final.

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma, por maioria, deu provimento ao agravo interno e ao recurso extraordinário com agravo para julgar procedentes, em parte, os pedidos e condenar o Estado do Rio de Janeiro ao pagamento de compensação por danos morais a parentes da vítima.

6.      Poderes Judiciário e Legislativo estaduais: representação judicial extraordinária e atribuições do Procurador-Geral da Assembleia Legislativa e dos consultores jurídicos do Poder Judiciário

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

É constitucional a instituição de órgãos, funções ou carreiras especiais voltadas à consultoria e assessoramento jurídicos dos Poderes Judiciário e Legislativo estaduais, admitindo-se a representação judicial extraordinária exclusivamente nos casos em que os referidos entes despersonalizados necessitem praticar em juízo, em nome próprio, atos processuais na defesa de sua autonomia, prerrogativas e independência face aos demais Poderes, desde que a atividade desempenhada pelos referidos órgãos, funções e carreiras especiais remanesça devidamente apartada da atividade-fim do Poder estadual a que se encontram vinculados.

ADI 6.433/PR, relator Ministro Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em 31.3.2023 (Info 1089)

6.1.                       Situação FÁTICA.

A Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal (Anape) ajuizou no STF a ADI 6433 em que contesta dispositivos da Emenda Constitucional 44/2019 do Estado do Paraná, que trata da atuação da Procuradoria da Assembleia Legislativa e da Consultoria Jurídica do Tribunal de Justiça local.

Segundo a associação, a emenda amplia as atribuições do procurador-geral da Assembleia Legislativa, ao incluir sua atuação no processo judicial que versar sobre ato praticado pelo Poder Legislativo ou por sua administração. A entidade alega que isso usurpa as atribuições das carreiras exclusivas dos procuradores dos estados (artigo 132 da CF). Argumenta ainda que a criação de atribuições da Consultoria Jurídica do TJ não poderia ser feita por iniciativa parlamentar, mas do próprio Tribunal, conforme previsão constitucional.

6.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.                        A norma encontra respaldo na CF?

R: Yeaph!!!!

É constitucional a instituição de órgãos, funções ou carreiras especiais para consultoria e assessoramento jurídicos do Poder Legislativo ou do Poder Judiciário estaduais, admitindo-se a representação judicial extraordinária apenas nos casos em que o Poder estadual correspondente precise defender em juízo, em nome próprio, sua autonomia, prerrogativas e independência em face dos demais Poderes.

O STF reconhece a validade da estruturação de órgãos e carreiras especiais voltados à consultoria e ao assessoramento jurídicos de assembleias legislativas e tribunais de justiça estaduais, bem assim a possibilidade de instituição de carreiras especiais para a representação judicial dos aludidos entes despersonalizados nas situações em que precisem praticar em juízo, em nome próprio, atos processuais na defesa de sua autonomia, prerrogativas e independência em face dos demais Poderes.

Nas hipóteses em que admitida, a atividade de representação judicial extraordinária a ser desempenhada pelos órgãos, funções ou carreiras especiais deve permanecer devidamente apartada da atividade-fim do Poder estadual ao qual vinculados.

A constitucionalidade da prática pressupõe o atendimento de normas de procedimento destinadas a garantir a efetiva observância do regramento constitucional da advocacia pública, sobretudo o princípio da moralidade administrativa (CF/1988, art. 37) e as normas que regem o exercício da advocacia de Estado (CF/1988, arts. 131 a 133).

Nesse sentido, para evitar potenciais conflitos de interesse incompatíveis com a administração da Justiça, os estados devem observar a diretriz do art. 28, IV, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da OAB), segundo a qual a advocacia é incompatível com as atividades desenvolvidas pelos ocupantes de cargos ou funções vinculadas à atividade jurisdicional do Poder Judiciário.

Não ofende o princípio do concurso público a mudança da denominação do cargo público efetivo de assessor jurídico para a de consultor jurídico, quando ausente efetiva transformação ou transposição de um cargo no outro.

É constitucional a mera alteração de nomenclatura de cargo público. Para que a reestruturação de cargos seja considerada adequada diante do princípio do concurso público (CF/1988, art. 37, II), é necessária a presença simultânea de três requisitos fundamentais: (i) a similitude entre as atribuições dos cargos envolvidos; (ii) a identidade dos requisitos de escolaridade entre os cargos e; (iii) a equivalência salarial entre eles.

6.2.2.                        Resultado final.

Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou parcialmente procedente a ação para: (i) declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 124-A da Constituição do Estado do Paraná, apenas para conferir-lhe interpretação conforme a Constituição Federal, a fim de limitar a atuação dos procuradores da Assembleia Legislativa aos casos em que atuem em nome do Poder Legislativo para a defesa de sua autonomia, de suas prerrogativas e de sua independência frente aos demais Poderes e; (ii) declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 243-B da Constituição do Estado do Paraná, para conferir-lhe interpretação conforme a Constituição Federal, a fim de estabelecer que: (i) apenas os Consultores Jurídicos do Poder Judiciário do Paraná encarregados das funções de defesa institucional devem desempenhar a representação extraordinária prevista pelo constituinte estadual, atividade a ser desempenhada mediante a manutenção de inscrição profissional junto ao Conselho Seccional da OAB/PR e em regime de dedicação exclusiva e integral, vedado o exercício de outra atividade que tenha relação, direta ou indireta, com o assessoramento da atividade jurisdicional do Poder Judiciário; e (ii) os demais Consultores Jurídicos do Poder Judiciário do Paraná que exerçam outras funções, em especial funções relacionadas ao assessoramento da atividade jurisdicional daquela Corte, devem permanecer apartados das atividades de representação judicial extraordinária do Poder Judiciário estadual, com inscrição profissional junto ao Conselho Seccional da OAB/PR inativa, sendo-lhes vedado o exercício da referida atividade.

7.      Ordem dos Advogados do Brasil e dever de prestar contas ao Tribunal de Contas da União

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

O Conselho Federal e os Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil não estão obrigados a prestar contas ao Tribunal de Contas da União nem a qualquer outra entidade externa.

RE 1.182.189/BA, relator Ministro Marco Aurélio, redator do acórdão Ministro Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 24.4.2023 (Info 1091)

7.1.                       Situação FÁTICA.

O MPF interpôs RE para questionar acórdão do TRF-1 que, com fundamento no decidido pelo Supremo na ADI 3026 – na qual a Corte atribuiu à OAB natureza jurídica diferenciada em razão do reconhecimento de sua autonomia e de sua finalidade institucional –, afastou a obrigação da entidade de prestar contas ao TCU. O TRF-1 assentou que a natureza das finalidades institucionais exige gestão isenta da ingerência do Poder Público.

No RE, o MPF sustenta que a decisão do TRF-1 ofende o artigo 70, parágrafo único, da Constituição Federal, segundo o qual “prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária”. Argumenta que, no julgamento da ADI 3026, a análise do STF se restringiu ao tema da vinculação da OAB à realização de concurso público para contratação de pessoal, sem afastar a incidência do regime administrativo em relação aos demais aspectos, como o dever de prestar contas. 

7.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.                        Questão JURÍDICA.

CF/1988: “Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.”

 Lei 8.906/1994: “Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade: I – defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas; II – promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil. § 1º A OAB não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico.

7.2.2.                        OAB presta contas ao TCU?

R: Nooops!!!! E nem a outra entidade externa!!!

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) não se sujeita à prestação de contas perante o Tribunal de Contas da União (TCU) e a ausência dessa obrigatoriedade não representa ofensa ao art. 70, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988, já que inexiste previsão expressa em sentido diverso.

O STF já afastou a sujeição da OAB aos ditames impostos à Administração Pública direta e indireta, dada a sua categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas, na medida em que é uma instituição com natureza jurídica própria e dotada de autonomia e independência.

Nesse contexto, considerada a sua função institucional, a OAB exerce serviço público independente, que não se confunde com serviço estatal, e cujo controle pode ser realizado por vias diversas da do TCU. Assim, é necessário conferir o mais alto grau de liberdade para que a OAB tenha condições de cumprir suas funções constitucionalmente privilegiadas, tendo em vista que os advogados são indispensáveis à administração da Justiça (CF/1988, art. 133).

Ademais, a Ordem gere recursos privados arrecadados de seus associados, distinguindo-se dos demais conselhos de fiscalização profissional, os quais recolhem contribuição de natureza tributária, que advém da movimentação financeira do Estado. Por essa razão, suas finanças não se submetem ao controle estatal, tampouco se enquadram no conceito jurídico de Fazenda Pública, cujo controle se sujeita às regras da Lei 4.320/1964.

7.2.3.                        Resultado final.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 1.054 da repercussão geral, desproveu o recurso extraordinário, de modo a manter o acórdão recorrido, proferido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

8.      Denúncia de tratados internacionais: necessidade da manifestação da vontade do Congresso Nacional

AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE

A denúncia pelo Presidente da República de tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional, para que produza efeitos no ordenamento jurídico interno, não prescinde da sua aprovação pelo Congresso.

ADC 39/DF, relator Ministro Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 16.6.2023 (Info 1099)

8.1.                       Situação FÁTICA.

A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) ajuizou no STF a ADC 39, que tem por objeto o Decreto 2.100/1996, no qual o então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, comunicou a renúncia do Brasil ao cumprimento da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Já a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag) sustenta que o Decreto viola o artigo 49, inciso I da Constituição da República.

A contenda é que a norma da OIT disciplina relações de direito privado entre empregadores e empregados, enquanto o artigo 49, inciso I, da CF define a competência exclusiva do Congresso Nacional para resolver definitivamente sobre tratados e convenções internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.

8.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.                        Questão JURÍDICA.

 CF/1988: “Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I – resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional; (…) Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (…) VIII – celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;

8.2.2.                        Dispensada a aprovação pelo CN?

R: Nooops!!!

Em decorrência do próprio Estado Democrático de Direito e de seu corolário, o princípio da legalidade, é necessária a manifestação de vontade do Congresso Nacional para que a denúncia de um tratado internacional produza efeitos no direito doméstico, razão pela qual é inconstitucional a denúncia unilateral pelo Presidente da República. Contudo, esse entendimento deve ser aplicado somente a partir da publicação da ata do presente julgamento, mantendo-se a eficácia das denúncias realizadas até esse marco temporal.

A exclusão das normas incorporadas ao ordenamento jurídico interno não pode ocorrer de forma automática, por vontade exclusiva do Presidente da República, sob pena de vulnerar o princípio democrático, a separação de Poderes, o sistema de freios e contrapesos e a própria soberania popular. Assim, uma vez ingressado no ordenamento jurídico pátrio mediante referendo do Congresso Nacional, a supressão do tratado internacional pressupõe também a chancela popular por meio de seus representantes eleitos.

Essa participação do Poder Legislativo ganha importância ainda mais elevada quando se tem em perspectiva normas de proteção aos direitos humanos. Na espécie, trata-se de denúncia da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, cujo intuito é proteger os trabalhadores contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa (direito social previsto no art. 7º, I, da CF/1988).

Em homenagem ao princípio da segurança jurídica, deve ser mantida a validade do Decreto 2.100/1996, por meio do qual o Presidente da República tornou pública a denúncia da Convenção 158 da OIT.

Embora, à luz do ordenamento constitucional, a denúncia de tratados internacionais dependa de anuência do Congresso Nacional para surtir efeitos internamente, a prática institucional resultou em uma aceitação tácita da denúncia unilateral por reiteradas vezes e em períodos variados da história nacional, de modo que se consubstanciou em costume consolidado pelo tempo e que vinha sendo adotado de boa-fé e com justa expectativa de legitimidade, eis que, até então, não foi formalmente invalidado.

8.2.3.                        Resultado final.

Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, julgou procedente a ação para manter a validade do Decreto 2.100/1996 e formular apelo ao legislador “para que elabore disciplina acerca da denúncia dos tratados internacionais, a qual preveja a chancela do Congresso Nacional como condição para a produção de efeitos na ordem jurídica interna, por se tratar de um imperativo democrático e de uma exigência do princípio da legalidade”.

DIREITO ADMINISTRATIVO

9.      Impedimento da aposentadoria voluntária e da exoneração a pedido de servidor estadual que responde a processo administrativo disciplinar

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

É constitucional norma estadual que impede a exoneração a pedido e a aposentadoria voluntária de servidor que responde a processo administrativo disciplinar (PAD). Contudo, é possível conceder a aposentadoria ao investigado quando a conclusão do PAD não observar prazo razoável.

ADI 6.591/DF, relator Ministro Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 2.5.2023 (Info 1092)

9.1.                       Situação FÁTICA.

Foi ajuizada a ADI 6591 em face de norma estadual baiana que impedia a exoneração a pedido e a aposentadoria voluntária de servidor que respondesse a processo administrativo disciplinar (PAD).

9.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.                        Questão JURÍDICA.

Lei 8.112/1990: “Art. 172.  O servidor que responder a processo disciplinar só poderá ser exonerado a pedido, ou aposentado voluntariamente, após a conclusão do processo e o cumprimento da penalidade, acaso aplicada. Parágrafo único. Ocorrida a exoneração de que trata o parágrafo único, inciso I do art. 34, o ato será convertido em demissão, se for o caso.

9.2.2.                        Pode segurar o sujeito pelo cangote?

R: Pode. Mas é possível conceder a aposentadoria ao investigado quando a conclusão do PAD não observar prazo razoável!!!

A Administração Pública não possui discricionariedade para deixar de aplicar penalidades disciplinares quando os fatos se amoldarem ao tipo legal, assim como para estender, de modo desproporcional, o prazo para a conclusão do respectivo processo administrativo. Assim, é possível a cumulação de sanções — pois se revela como medida razoável e proporcional — necessárias para a observância do princípio democrático.

Nesse contexto, a indisponibilidade dos bens para o ressarcimento do dano ou a configuração de eventual inelegibilidade — penalidades aplicáveis quando o servidor é demitido — justificam a previsão do art. 172 da Lei 8.112/1990 — que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais —, e cuja redação foi replicada pela lei estadual impugnada.

Por outro lado, o tempo de espera para a conclusão do PAD pode ser demasiado e acabar atingindo, de forma reflexa, o direito à aposentadoria. Se isso ocorrer, é necessário verificar, à luz do caso concreto, o real motivo da demora: se a desídia, entre outras possibilidades, decorre do abuso do direito de defesa, pela complexidade do caso, ou pela necessidade de produção de provas.

9.2.3.                        Resultado final.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação para conferir interpretação conforme a Constituição ao art. 240 da Lei 6.677/1994 do Estado da Bahia, a fim de assentar que, em caso de inobservância de prazo razoável para a conclusão de processo administrativo disciplinar, seja possível a concessão de aposentadoria a servidor investigado.

10.  Colaboração premiada: possibilidade de utilização no âmbito de ação civil pública por ato de improbidade administrativa

 RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO

“É constitucional a utilização da colaboração premiada, nos termos da Lei 12.850/2013, no âmbito civil, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, observando-se as seguintes diretrizes: (1) Realizado o acordo de colaboração premiada, serão remetidos ao juiz, para análise, o respectivo termo, as declarações do colaborador e cópia da investigação, devendo o juiz ouvir sigilosamente o colaborador, acompanhado de seu defensor, oportunidade em que analisará os seguintes aspectos na homologação: regularidade, legalidade e voluntariedade da manifestação de vontade, especialmente nos casos em que o colaborador está ou esteve sob efeito de medidas cautelares, nos termos dos §§ 6º e 7º do artigo 4º da referida Lei 12.850/2013; (2) As declarações do agente colaborador, desacompanhadas de outros elementos de prova, são insuficientes para o início da ação civil por ato de improbidade; (3) A obrigação de ressarcimento do dano causado ao erário pelo agente colaborador deve ser integral, não podendo ser objeto de transação ou acordo, sendo válida a negociação em torno do modo e das condições para a indenização; (4) O acordo de colaboração deve ser celebrado pelo Ministério Público, com a interveniência da pessoa jurídica interessada e devidamente homologado pela autoridade judicial; (5) Os acordos já firmados somente pelo Ministério Público ficam preservados até a data deste julgamento, desde que haja previsão de total ressarcimento do dano, tenham sido devidamente homologados em Juízo e regularmente cumpridos pelo beneficiado.

ARE 1.175.650/PR, relator Ministro Alexandre de Moraes, julgamento virtual finalizado em 30.6.2023 (Info 1101)

10.1.                   Situação FÁTICA.

O Ministério Público do Paraná propôs ação civil pública por ato de improbidade administrativa contra um auditor fiscal e mais 24 pessoas físicas e jurídicas. Na Operação Publicano, revelou-se a existência de organização criminosa que obtinha vantagem patrimonial por meio de acordos (corrupção) com empresários sujeitos à fiscalização tributária na Receita Estadual.

O MP-PR requereu a indisponibilidade de valores e de bens móveis e imóveis dos acusados e a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa). A defesa de um dos auditores investigados alega que a medida se amparou em elementos colhidos em colaboração premiada, cuja utilização em ação de improbidade não seria admitida pelo artigo 17, parágrafo 1º, da Lei 8.429/1992.

10.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1.                    Questão JURÍDICA.

Lei 13.964/2019: “Art. 6º A Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, passa a vigorar com as seguintes alterações: ‘Art. 17……………………………………………………………

§ 1º As ações de que trata este artigo admitem a celebração de acordo de não persecução cível, nos termos desta Lei.”

10.2.2.                    Possível o uso da colaboração premiada em ACP por ato de improbidade?

R: Observados os requisitos fixados pelo STF, SIM!!!!

É constitucional o uso do instituto da colaboração premiada em ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público se a pessoa jurídica interessada participar como interveniente e se forem observadas as diretrizes ora fixadas pelo Supremo Tribunal Federal, cuja finalidade é favorecer a efetiva tutela do patrimônio público, da legalidade e da moralidade administrativas, e evitar a impunidade de maneira eficiente, com a priorização do combate à corrupção.

O art. 6º da Lei 13.964/2019, ao dar nova redação ao § 1º do art. 17 da Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa – LIA), introduziu uma nova espécie de justiça consensual/negocial, permitindo, de modo expresso, a celebração de acordo — de não persecução cível — no âmbito da ação civil pública por ato de improbidade administrativa. Contudo, antes mesmo da derrogação da proibição dos referidos modelos de justiça, já se verificava a possibilidade de utilização da colaboração premiada com base no restante da legislação vigente.

Nesse contexto, atendidos os parâmetros legais, o acordo de colaboração poderá ser homologado pelo juiz, desde que não isente o colaborador de ressarcir integralmente os danos causados, ainda que a forma de como se dará a indenização possa ser objeto de negociação.

Ademais, como a LIA prevê a legitimidade ativa concorrente entre o órgão ministerial e a pessoa jurídica de direito público lesada para o ajuizamento da ação, deve ser permitida a sua participação, como interveniente, na celebração do acordo de não persecução cível. O posicionamento do interveniente não impedirá a celebração da colaboração premiada pelo Ministério Público, porém deverá ser observado e analisado pelo magistrado no momento de sua homologação.

10.2.3.                    Resultado final.

Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, ao apreciar o Tema 1.043 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário e fixou a tese jurídica supracitada.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

11.  (In)constitucionalidade de dispositivos do Código de Processo Civil de 2015

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

A edição da Lei 13.105/2015, conhecida como Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), consagrou o entendimento de que o processo não deve ser um fim em si mesmo, devendo-se buscar uma adequada mediação entre o direito nele previsto e a sua realização prática, a fim de torná-lo efetivo, exigindo-se postura interpretativa orientada a reafirmar e reforçar esse objetivo

ADI 5.492/DF, relator Ministro Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 24.4.2023 (Info 1092)

11.1.                   Situação FÁTICA.

O governador do Rio de Janeiro ajuizou no STF a ADI 5492 contra dispositivos da Lei Federal 13.105/2015, que instituiu o novo Código de Processo Civil. Para o estado, as inconstitucionalidades apontadas agridem valores fundamentais albergados pela Constituição da República. Alega que foram claramente transgredidos os limites em que cabia ao legislador ordinário atuar.

O governo estadual questiona, entre outras coisitas, a aplicação do CPC aos processos administrativos estaduais (artigo 15), a submissão dos estados-membros e o Distrito Federal ao foro de domicílio do autor da demanda jurídica, pela mera vontade deste. Isso, segundo a ADI, comprometeria a efetividade da garantia do contraditório, esvaziaria a Justiça estadual como componente da auto-organização federativa e daria margem ao abuso de direito no processo.

11.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1.                    Questão JURÍDICA.

CPC/2015: “Art. 46. A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu. (…) § 5º A execução fiscal será proposta no foro de domicílio do réu, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado. (…) Art. 52. É competente o foro de domicílio do réu para as causas em que seja autor Estado ou o Distrito Federal. Parágrafo único. Se Estado ou o Distrito Federal for o demandado, a ação poderá ser proposta no foro de domicílio do autor, no de ocorrência do ato ou fato que originou a demanda, no de situação da coisa ou na capital do respectivo ente federado.”

11.2.2.                    Tratamento uniforme?

R: Em federalismo tupiniquim, com certeza!

O caráter nacional e cogente do CPC/2015 impõe conferir tratamento uniforme a todos os jurisdicionados submetidos a processo no território brasileiro, não se permitindo que ele seja diverso em matéria processual conforme a unidade federada na qual ocorre o litígio.

11.2.3.                    E a regra que autoriza os Estados e municípios a serem demandados onde Deus quiser?

R: Já era!

É inconstitucional a regra de competência que autoriza que entes subnacionais sejam demandados em qualquer comarca do País, pois a fixação do foro deve se RESTRINGIR aos seus respectivos limites territoriais.

Deve ser conferida interpretação conforme a Constituição aos artigos 46, § 5º, e 52, parágrafo único, ambos do CPC/2015, no sentido de que a competência seja definida nos limites territoriais do respectivo estado ou do Distrito Federal, nos casos de promoção de execução fiscal e de ajuizamento de ação em que qualquer deles seja demandado.

A possibilidade de litigar em face da União em qualquer parte do País (CF/1988, art. 109, §§ 1º e 2º) é compatível com a estruturação nacional da Advocacia Pública federal. Contudo, estender essa previsão aos entes subnacionais resulta na desconsideração de sua prerrogativa constitucional de auto-organização (CF/1988, arts. 18, 25 e 125) e da circunstância de que sua atuação se desenvolve dentro dos seus limites territoriais.

11.2.4.                    Depósito de RPVs somente em bancos oficiais?

R: Limitou demais!

É inconstitucional a obrigatoriedade de os depósitos judiciais e de valores de RPVs serem realizados somente em bancos oficiais (CPC/2015, arts. 535, § 3º, II; e 840, I).

Essa determinação viola os princípios da eficiência administrativa, da livre concorrência e da livre iniciativa, assim como cerceia os entes federados, notadamente as justiças estaduais, quanto ao exercício de suas autonomias.

11.2.5.                    Vale deferir tutela de evidência?

R: Lógico!

São constitucionais os dispositivos legais (CPC/2015, arts. 9º, parágrafo único, III; e 311, parágrafo único) que, sem prévia citação do réu, admitem a concessão de tutela de evidência quando os fatos alegados possam ser demonstrados documentalmente e a tese jurídica estiver consolidada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante.

Assim, inexiste qualquer ofensa ao princípio do contraditório caso haja justificativa razoável e proporcional para a postergação do contraditório e desde que se abra a possibilidade de a parte se manifestar posteriormente acerca da decisão que a afetou, ou sobre o ato do qual não participou.

11.2.6.                    Presume-se a repercussão geral de RE que impugna declaração de inconstitucionalidade?

R: Aí vale!

É constitucional presunção de repercussão geral de recurso extraordinário que impugna acórdão que tenha declarado inconstitucionalidade de tratado ou lei federal (CPC/2015, art. 1.035, § 3º, III).

Essa previsão se fundamenta, em especial, na necessidade de uniformizar a aplicação de lei federal em todo o território nacional.

11.2.7.                    Por fim, amarra a Administração Pública às teses firmadas em casos repetitivos relacionados à prestação de serviços delegados?

R: Amarrou geral!

É constitucional a determinação de vincular a Administração Pública à efetiva aplicação de tese firmada no julgamento de casos repetitivos relacionados à prestação de serviço delegado (CPC/2015, arts. 985, § 2º; e 1.040, IV).

Ao ampliar os diálogos institucionais entre as entidades públicas, essa medida assegura maior efetividade no cumprimento de decisão judicial ao mesmo tempo em que densifica direitos garantidos constitucionalmente.

11.2.8.                    Resultado final.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, em apreciação conjunta, por maioria, julgou parcialmente procedentes as ações para: 

i) declarar constitucionais a expressão “administrativos” do art. 15; a expressão “dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios” do art. 242, § 3º; a referência ao inciso II do art. 311 constante do art. 9º, parágrafo único, II, e do art. 311, parágrafo único; o art. 985, § 2º; e o art. 1.040, IV, todos do CPC/2015; 

Ii) atribuir interpretação conforme a Constituição ao art. 46, § 5º, do CPC/2015, para restringir sua aplicação aos limites do território de cada ente subnacional ou ao local de ocorrência do fato gerador; 

iii) atribuir interpretação conforme a Constituição ao art. 52, parágrafo único, do CPC/2015, para restringir a competência do foro de domicílio do autor às comarcas inseridas nos limites territoriais do estado-membro ou do Distrito Federal que figure como réu; 

iv) declarar a inconstitucionalidade da expressão “de banco oficial”, constante do art. 535, § 3º, II, do CPC/2015, e conferir interpretação conforme ao dispositivo para que se entenda que a “agência” nele referida pode ser de instituição financeira pública ou privada. Para dar cumprimento ao disposto na norma, poderá a administração do tribunal contratar banco oficial ou, caso assim opte, banco privado, hipótese em que serão observadas a realidade do caso concreto, os regramentos legais e princípios constitucionais aplicáveis e as normas do procedimento licitatório, visando à escolha da proposta mais adequada para a administração de tais recursos; e

v) declarar a inconstitucionalidade da expressão “na falta desses estabelecimentos” do art. 840, I, do CPC/2015, e conferir interpretação conforme ao preceito para que se entenda que poderá a administração do tribunal efetuar os depósitos judiciais (a) no Banco do Brasil, na Caixa Econômica Federal ou em banco do qual o estado ou o Distrito Federal possua mais da metade do capital social integralizado, ou, (b) não aceitando o critério preferencial proposto pelo legislador e observada a realidade do caso concreto, os regramentos legais e os princípios constitucionais aplicáveis, realizar procedimento licitatório visando à escolha da proposta mais adequada para a administração dos recursos dos particulares.

DIREITO PENAL

12.  Termo inicial da prescrição executória estatal: a partir do trânsito em julgado para a acusação ou para todas as partes

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO

O prazo para a prescrição da execução da pena concretamente aplicada somente começa a correr do dia em que a sentença condenatória transita em julgado para ambas as partes, momento em que nasce para o Estado a pretensão executória da pena, conforme interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal ao princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal) nas ADC 43, 44 e 54.”

ARE 848.107/DF, relator Ministro Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 30.6.2023 (Info 1101)

12.1.                   Situação FÁTICA.

O processo foi ajuizado no STF pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios para questionar acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal que reconheceu como marco inicial da contagem da PPE o prazo o trânsito em julgado para a acusação, com base no que prevê o artigo 112 (inciso I) do Código Penal.

O MPDFT entende que, com base na presunção da inocência, é impossível a execução da sentença penal condenatória antes do seu definitivo trânsito em julgado, por respeito aos princípios constitucionais previstos no artigo 5º (incisos II e LVII) da Constituição Federal.

12.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

12.2.1.                    Questão JURÍDICA.

CP/1940: “Art. 110 – A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente. § 1º A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. § 2º (Revogado pela Lei nº 12.234, de 2010). Art. 112 – No caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr: I – do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional;

12.2.2.                    Qual o termo inicial?

R: A data em que a sentença condenatória transita em julgado para AMBAS as partes!!!

É incompatível com a atual ordem constitucional— à luz do postulado da presunção de inocência (CF/1988, art. 5º, LVII) e o atual entendimento do STF sobre ele — a aplicação meramente literal do disposto no art. 112, I, do Código Penal. Por isso, é necessário interpretá-lo SISTEMICAMENTE, com a fixação do trânsito em julgado para ambas as partes (acusação e defesa) como marco inicial da prescrição da pretensão executória estatal pela pena concretamente aplicada em sentença condenatória.

Conforme jurisprudência firmada no STF, o Estado não pode determinar a execução da pena contra condenado com base em título executivo não definitivo, dada a prevalência do princípio da não culpabilidade ou da presunção de inocência. Assim, a constituição definitiva do título judicial condenatório é condição de exercício da pretensão executória do Estado.

Nesse contexto, a prescrição da pretensão executória pressupõe a inércia do titular do direito de punir. Portanto, a única interpretação do inciso I do art. 112 do Código Penal compatível com esse entendimento é a que elimina do dispositivo a locução “para a acusação” e define como termo inicial o trânsito em julgado para ambas as partes, visto que é nesse momento que surge o título penal passível de ser executado pelo Estado.

Ademais, a aplicação da literalidade do dispositivo impugnado, além de contrária à ordem jurídico-normativa, apenas fomenta a interposição de recursos com fins meramente procrastinatórios, frustrando a efetividade da jurisdição penal.

12.2.3.                    Resultado final.

Com base nesse e outros entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 788 de repercussão geral, negou provimento ao agravo em recurso extraordinário interposto pelo MPDFT e declarou a não recepção pela Constituição Federal da locução “para a acusação”, contida art. 112, inciso I (primeira parte), do Código Penal, conferindo-lhe interpretação conforme a Constituição no sentido de que a prescrição começa a correr do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para ambas as partes. Esse entendimento se aplica aos casos em que (i) a pena não foi declarada extinta pela prescrição; e (ii) cujo trânsito em julgado para a acusação tenha ocorrido após 12.11.2020.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

13.  Cabimento de ação rescisória e efeitos do empate em julgamento de processo de extradição

AÇÃO RESCISÓRIA

É cabível o ajuizamento de ação rescisória em face de acórdão proferido pelo STF em processo de extradição, pois este possui cunho predominantemente administrativo, não havendo que se falar na hipótese de julgamento de natureza penal.

AR 2.921/DF, relator Ministro Alexandre de Moraes, julgamento finalizado em 30.3.2023 (Info 1089)

13.1.                   Situação FÁTICA.

Em 1993, um colombiano matou a namorada e fugiu para o Brasil, onde foi encontrado em 2017. A segunda turma do STF, em razão de empate, negou a extradição do cidadão colombiano, decisão que transitou em julgado em 2021. Algum tempo depois, o pai da vítima ajuizou ação rescisória sob a alegação de que o pedido de extradição não teria natureza penal (o que afastaria a tese do resultado mais benéfico ao réu diante do empate), mas de instrumento de cooperação jurídica internacional.

13.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

13.2.1.                    Cabível a ação rescisória?

R: Yeaph!!!!

A extradição constitui instrumento de cooperação jurídica internacional e possui natureza jurídica de ato administrativo, diplomático e jurídico.

Na espécie, trata-se de ação rescisória ajuizada contra acórdão da Segunda Turma do STF que, diante do empate na votação decorrente da ausência de ministro por motivo de licença médica, concluiu pela prevalência do voto mais favorável ao réu e julgou improcedente o pedido extradicional (Ext 1.560/DF). Como o objeto em discussão é justamente a verificação da validade da prevalência desse voto em caso de empate, atrai-se a hipótese de cabimento da rescisória referente à manifesta violação a literal dispositivo de norma jurídica (CPC/2015, art. 966, V).

Verificada a ocorrência de empate em julgamento de processo de extradição, é necessário o seu adiamento para que a decisão seja tomada somente depois do voto de desempate, visto que a aplicação de solução mais favorável ao réu se restringe aos casos expressamente previstos na legislação.

A partir da leitura SISTEMÁTICA de dispositivos regimentais e na linha da jurisprudência do STF vê-se que há preferência pela votação majoritária em julgamentos colegiados, com a obtenção do voto de desempate, especialmente quando o empate se deve a situação totalmente solucionável, como no caso concreto (licença médica). Nesse contexto, o Código de Processo Penal (CPP/1941, arts. 615, § 1º, e 664, parágrafo único) dispõe sobre a necessidade de colheita do voto do presidente do Tribunal, da Câmara ou da Turma, se não tiver votado, oportunidade em que proferirá, então, o voto de desempate, conhecido como “voto de qualidade”.

A solução favorável ao réu, no caso de empate em habeas corpus ou recurso criminal, configura situação EXCEPCIONALÍSSIMA, que não pode ser estendida a casos distintos dos estabelecidos na lei.

13.2.2.                    Resultado final.

Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação para (i) afastar a proclamação do resultado prolatada no mencionado processo de extradição; e (ii) determinar a remessa dos autos à Segunda Turma para fins de aplicação do art. 150, §§ 1º e 2º, do RISTF, com a tomada do voto do ministro ausente para a conclusão do julgamento.

Jean Vilbert

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