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Questão FCC – Irretroatividade da lei tributaria (artigos 106, II, “c”, e 144 do CTN)

Olá, amigas e amigos concurseiros de todo o Brasil!

E os estudos, como estão? A todo vapor? Espero que sim. No post de hoje trago uma questão da FCC cobrada recentemente no concurso para o cargo de Auditor-Fiscal da SEFAZ/PE, realizado esse ano.

A questão versava sobre a aplicação retroativa da lei tributária no que diz respeito à cobrança de tributo e de multa pela administração fazendária. Se durante um procedimento de fiscalização uma lei superveniente altera as alíquotas de determinado tributo e os percentuais de multa por infração à legislação tributária, quais deverão ser utilizadas pela autoridade fiscal no momento do lançamento tributário: os antigos ou os novos percentuais/alíquotas? Depende. Vamos ver como isso funciona com uma questão novinha? Em frente.

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(FCC/SEFAZ-PE/AFTE/2014) O Estado de Pernambuco, em fevereiro de 2013, instaurou procedimento de fiscalização, em que se constatou que a Tomatinho, sociedade empresária que atua no comércio de molho de tomate em conserva, nos meses de novembro e dezembro de 2012, não escriturou as notas fiscais dos produtos adquiridos pela empresa no seu livro de registro de entrada, o que, nos termos da legislação vigente, no período apurado, presumia-se a realização de operações, com a saída de mercadoria, sem o recolhimento do ICMS.

A Lei Estadual no 2.648/2011, que vigorava durante o período fiscalizado, estabelecia a alíquota do ICMS sobre operações referentes a molhos de tomates em conserva em 17% e imputava uma multa de 100% sobre o valor da operação, nos casos de infrações relativas à falta de escrituração no livro fiscal dos documentos referentes à entrada de mercadorias.

Ocorre que o Estado de Pernambuco, em março de 2013, editou a Lei no 7.845/2013, além de ter concedido isenção de ICMS para as operações referentes a molho de tomate em conserva, reduziu a sanção fiscal para 50% na hipótese da infração verificada na ação fiscalizatória.

Nessa situação hipotética, quanto ao auto de infração, a Administração tributária:

(A) não deverá exigir qualquer valor a título de ICMS, pois aplica-se retroativamente lei posterior à data da ocorrência dos fatos que estabeleça benefício fiscal em favor do contribuinte; e imputar multa no valor correspondente a 100% da operação, pois as infrações cometidas devem ser reprimidas com base nas penalidades estabelecidas pela legislação vigente ao tempo da sua prática.

(B) não deverá lavrar o Auto de Infração, pois como aplica-se retroativamente a lei posterior à data da ocorrência dos fatos que desonerou o contribuinte do pagamento da obrigação principal, a obrigação acessória também não poderá ser exigida.

(C) deverá exigir o ICMS, aplicando-se a alíquota de 17% e imputar multa no valor correspondente a 100% da operação, percentual esse que deverá ser exigido ao final do contribuinte em eventual execução fiscal do respectivo crédito tributário, pois eram, respectivamente, a alíquota e a penalidade estabelecidas pela legislação vigente na data da ocorrência do fato gerador.

(D) deverá exigir o ICMS, aplicando-se a alíquota de 17%, pois era a prevista pela legislação vigente na data da ocorrência do fato gerador, e imputar multa no valor correspondente a 100% da operação. No curso de eventual processo administrativo, a multa deverá ser reduzida para 50%.

(E) não deverá exigir qualquer valor a título de ICMS e imputar multa no valor correspondente a 50% da operação, pois é aplicável retroativamente lei posterior à data da ocorrência dos fatos que estabeleça tratamento tributário menos severo que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática.

O texto da questão, embora bastante longo, exigiu apenas a aplicação de dois artigos do CTN: o 144, para a exigência do ICMS, e o 106, II, “c”, para a exigência da multa punitiva.

A fiscalização tributária empreendida pelo Estado de Pernambuco iniciou-se em fevereiro de 2013, enquanto que o período fiscalizado se refere aos meses de novembro a dezembro de 2012. Nesse período, a alíquota devida era de 17%, sendo esse o percentual previsto em lei também no momento da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. Após a ocorrência do fato gerador e ao início do procedimento de fiscalização, as operações referentes a molho de tomate em conserva foram isentas pelo Estado de Pernambuco em razão da edição da lei estadual nº 7.845/2013, o que importou, em março de 2013, em desoneração da tributação sobre essas operações. Essa desoneração ocorreu, também, antes da lavratura do auto de infração pela Administração Fazendária.

Não obstante a isenção concedida, ao tempo da ocorrência do fato gerador era devida a alíquota de 17%, conforme estabelecia a já revogada lei estadual nº 2.648/2011, devendo ser esse o percentual a ser utilizado na lavratura do auto de infração, tendo em vista o que dispõe o artigo 144 do CTN, o qual estabelece que o lançamento se reporta à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada. Assim, a Administração Tributária deverá exigir o ICMS sobre as operações constatadas pela fiscalização, aplicando-se a alíquota de 17%, pois essa era a prevista pela legislação vigente na data da ocorrência do fato gerador.

Para o caso da multa punitiva, a situação é diferente, devendo ser aplicada a legislação mais benéfica ao sujeito passivo, no caso de atos ainda não definitivamente julgados. Conforme o artigo 106, II, “c”, do CTN, a lei aplica-se a ato ou fato pretérito, tratando-se de ato não definitivamente julgado, quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática. Uma vez que a multa por infrações relativas à falta de escrituração no livro fiscal dos documentos referentes à entrada de mercadorias, ao tempo da fiscalização tributária, e antes mesmo do próprio lançamento tributário, foi reduzida de 100% para 50% sobre o valor da operação praticada, esse último percentual é que deve ser imputado ao contribuinte, muito embora o percentual de 100% fosse o vigente ao tempo do cometimento da infração.

Assim, quanto à multa a ser aplicada, essa deverá ser no valor correspondente a 100% da operação. No curso de eventual processo administrativo, a multa deverá ser reduzida para 50%, tendo em vista a legislação superveniente mais benéfica ao contribuinte.

Assim, resta como correta a alternativa “d”, gabarito da questão.

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Espero que tenha ficado bem clara a distinção entre os dois normativos e as suas aplicações práticas. Esse tipo de questão costuma ser bem solicitado em provas, já que envolve duas vertentes de pensamentos para situações aparentemente semelhantes.

Por hoje é só. Bons estudos a todos!

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Veja os comentários
  • Excelente!
    maria em 07/02/18 às 21:51
  • Boa tarde professor, Questãozinha pesada essa!! Desconhecia os 2 artigos e acabei acertando, por intuição, só a metade da questão. Como acertar a metade não dá ponto teria perdido essa. Mas ótima a tua explanação e que venham outras para deixar-nos expertos. abraço
    Rodrigo em 10/04/15 às 17:51
  • Questão muito bem formulada! Como seria bom se a ESAF formulasse questões assim, cobrando o raciocínio do candidato e não somente fazendo pegadinhas ou decorebas... Muito obrigado professor Aluisio por trazer esta questão para nós! E parabéns pelo ótimo comentário. Super elucidativo! Abraço!
    Igor em 09/04/15 às 08:56