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Informativo STF 987 Comentado

Galera, bora analisar o Informativo nº 987 do STF COMENTADO. Decisão importante sobre “dossiê anti-fascista”!

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Sumário

DIREITO CONSTITUCIONAL. 1

1.      Relatório de segurança e investigação sigilosa de servidores públicos. 2

1.1.        Situação FÁTICA. 2

1.2.        Análise ESTRATÉGICA. 2

DIREITO PENAL. 6

2.      Ação penal privada: difamação, vídeo com conteúdo fraudulento e divulgação em rede social de parlamentar. 6

2.1.        Situação FÁTICA. 6

2.2.        Análise ESTRATÉGICA. 6

DIREITO CONSTITUCIONAL

         Relatório de segurança e investigação sigilosa de servidores públicos

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL

É vedada a produção ou compartilhamento de informações (relatório de inteligência) sobre a vida pessoal, as escolhas pessoais e políticas, as práticas cívicas de cidadãos, servidores públicos federais, estaduais e municipais identificados como integrantes de movimento político antifascista, professores universitários e quaisquer outros que, atuando nos limites da legalidade, exerçam seus direitos de livremente expressar-se, reunir-se e associar-se.

ADPF 722 MC/DF, Plenário, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 19 e 20.8.2020, Info 987.

Situação FÁTICA.

A ADPF foi ajuizada contra ato do Ministério da Justiça e Segurança Pública – MJSP de promover investigação sigilosa sobre grupo de 579 servidores federais e estaduais de segurança identificados como integrantes do “movimento antifascismo” e professores universitários.

Segundo a inicial, houve a confecção de dossiê, que teria sido compartilhado com diversos órgãos, como Polícia Rodoviária Federal, Casa Civil da Presidência da República, Agência Brasileira de Inteligência, Força Nacional de Segurança e três centros de inteligência vinculados à Secretaria de Operações Integradas (Seopi), nas regiões Sul, Norte e Nordeste, o qual violaria os preceitos fundamentais da liberdade de expressão, reunião, associação, inviolabilidade de intimidade, vida privada e honra.

Análise ESTRATÉGICA.

             Questão JURÍDICA.

CF: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…) XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;”

CF: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…) IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; (…) X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (…) XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente; XVII – é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;”

             Essa matéria deve ser decidida pelo Judiciário?

R: NADA escapa do Judicário.

O STF afirmou que é inadmissível, no ordenamento jurídico vigente, que ato administrativo, norma legal ou mesmo emenda constitucional dificulte, impeça ou bloqueie o acesso à jurisdição sob qualquer pretexto. O Estado não está acima da lei e nem pode agir fora dela, menos ainda da Constituição.

Não há Estado de direito sem acesso à Justiça.

O serviço de inteligência do Estado é tema mais que sensível e não pode ser desempenhado fora de estritos limites constitucionais e legais, sob pena de comprometer a sociedade e a democracia em sua instância mais central, que é a de garantia dos direitos fundamentais.

Por isso, os órgãos de inteligência de qualquer nível hierárquico de qualquer dos Poderes do Estado submetem-se também ao crivo do Poder Judiciário, porque podem incorrer em desbordamentos legais. Até mesmo atos do Judiciário são examinados e decididos, em sua validade constitucional e legal, à luz do Direito.

Assim, é incompatível com o disposto no art. 5º, XXXV, da CF, SUBTRAIR do Poder Judiciário dados e informações objetivas que comprometam a função-dever de julgar os casos submetidos a seu exame.

Nem sequer a abertura de sindicância no MJSP, para a apuração de eventuais responsabilidades administrativas em relação aos fatos narrados nesta ADPF, e o comparecimento do ministro perante a Comissão Mista de Controle de Atividades de Inteligência do Congresso Nacional, para prestar esclarecimentos, podem substituir a jurisdição constitucional a cargo do Supremo Tribunal Federal nem minimizam o dever de atendimento à determinação judicial, inicialmente não cumprida com o rigor legalmente determinado.

             E quanto ao mérito?

São asseguradas, pela CF, as manifestações livres de expressão, de reunião e de associação, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada e da honra, conferindo-se a todos a garantia da liberdade para veicular ideias e opiniões e para se reunirem e também para se associarem (CF, art. 5º, IV, X, XVI e XVII) (2).

A liberdade de expressão, assim como todos os direitos fundamentais, não tem caráter absoluto e nem constitui escudo para imunizar o autor de prática delituosa.

Por cautela, deve-se determinar, judicialmente, a cessação ou o impedimento de qualquer comportamento de investigação secreta da vida de quem quer que seja, fora dos suportes constitucionais e legais garantidores do devido processo legal e do direito ao contraditório, pelos órgãos competentes.

NÃO se demonstrou a legitimidade da atuação de órgão estatal de investigar e de compartilhar informações de participantes de movimento político antifascista a pretexto de se cuidar de atividade de inteligência, sem observância do devido processo legal e quanto a cidadãos que exercem o seu livre direito de se manifestar, sem incorrer em afronta ao sistema constitucional ou legal.

COMENTÁRIO: Não haveria aqui dois pesos e duas medidas? Afinal, o STF criou um Inquérito Policial Judicial Inquisitorial (ditatorial?) para perseguir pessoas por suas ideias…

NÃO é aceitável a assertiva de que os dados colhidos em atividade de inteligência não seriam utilizados para persecução penal, mas para o “tratamento de conhecimento sobre elementos que, imediata ou potencialmente, possam impactar o processo decisório e ação governamental, bem como a defesa e a segurança da sociedade e do Estado”.

               Divergência.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que indeferiu a cautelar.

Esclareceu que, em um Estado democrático de direito, o centro político é o parlamento. Mesmo assim, insiste-se em deslocar matéria estritamente política para o STF, provocando incrível desgaste em termos de Poder Judiciário.

Para o ministro, o relatório é, na verdade, um longo cadastro que envolve pessoas naturais e entidades com atuação privada e pública. Há, nesse documento, o acompanhamento de pessoas de diversos segmentos e ideologias. Portanto, são dados, mantidos em sigilo, necessários e indispensáveis à garantia da segurança pública.

             Resultado final.

O Plenário, por maioria, deferiu medida cautelar em arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) para suspender todo e qualquer ato do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) de produção ou compartilhamento de informações sobre a vida pessoal, as escolhas pessoais e políticas, as práticas cívicas de cidadãos, servidores públicos federais, estaduais e municipais identificados como integrantes de movimento político antifascista, professores universitários e quaisquer outros que, atuando nos limites da legalidade, exerçam seus direitos de livremente expressar-se, reunir-se e associar-se.

DIREITO PENAL

         Ação penal privada: difamação, vídeo com conteúdo fraudulento e divulgação em rede social de parlamentar

AÇÃO PENAL

A liberdade de opinião e manifestação do parlamentar, ratione muneris, impõe contornos à imunidade material, nos limites estritamente necessários à defesa do mandato contra o arbítrio, à luz do princípio republicano que norteia a Constituição Federal. A veiculação dolosa de vídeo com conteúdo fraudulento, para fins difamatórios, a conferir ampla divulgação pela rede social ao conteúdo sabidamente falso, não encontra abrigo na imunidade parlamentar.

AP 1021/DF, 1ª Turma, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 18.8.2020, Info 987.

Situação FÁTICA.

Joãozinho, parlamentar, publicou em seu perfil de rede social vídeo editado com cortes de trechos de discurso feitos por Nestor, colega seu, à época também deputado federal. Nestor alega que Joãozinho o fez a fim de difamá-lo (Informativo 876). Por isso, proveu ação penal privada.

Análise ESTRATÉGICA.

             Questão JURÍDICA.

CF: “Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.”

CP: “Art. 45. Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior, proceder-se-á na forma deste e dos arts. 46, 47 e 48. § 1º A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários.”

CP: “Art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:”

CP: “Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: (…) III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.”

             Não tem imunidade parlamentar no caso?

R: Para o STF, não.

A liberdade de opinião e manifestação do parlamentar, ratione muneris, impõe contornos à imunidade material, nos limites estritamente necessários à defesa do mandato contra o arbítrio, à luz do princípio republicano que norteia a Constituição Federal.

A veiculação dolosa de vídeo com conteúdo fraudulento, para fins difamatórios, a conferir ampla divulgação pela rede social ao conteúdo sabidamente falso, não encontra abrigo na imunidade parlamentar.

             Então tem crime?

R: Opa! Tem sim…

Foi assentada a comprovação da materialidade do delito.

Laudo de perícia criminal de instituto de criminalística da polícia civil concluiu que o vídeo foi editado e que o processo de edição resultou na modificação da informação, conduzindo à compreensão diversa da realidade factual.

A Turma realçou que o conteúdo original da manifestação sofreu vários cortes, após os quais passou a revelar conotação racista e preconceituosa. O fato de veicular trechos da fala do autor é elemento especioso, ardil empregado com o intuito de conferir-lhe verossimilhança.

Além disso, o dano à honra do querelante (Nestor) foi certificado em juízo por depoimentos prestados. Simultaneamente, há prova do impacto sobre a imagem do autor. A fraude revela nítido potencial de enganar os cidadãos que a visualizaram e de produzir discursos de ódio contra a fala indevidamente alterada, difamando o opositor político do réu.

A publicação em perfil de rede social é penalmente imputável ao agente que, DOLOSAMENTE, tem o intuito de difamar, injuriar ou caluniar terceiros, máxime quando demonstrado o conhecimento da falsidade do conteúdo. A criminalização da veiculação de conteúdo com essas finalidades NÃO colide com o direito fundamental à liberdade de expressão.

             E se João NÃO CRIOU o vídeo, apenas DIVULGOU?

R: Irrelevante…

O delito contra a honra é de ação múltipla, conglobando não apenas a criação do conteúdo criminoso como também a sua postagem e a disponibilização de perfil em rede social com fim de servir de plataforma à alavancagem da injúria, calúnia ou difamação.

A AUTORIA desses crimes praticados por meio da internet demanda: (i) demonstração de que o réu é o titular de página, blogue ou perfil pelo qual divulgado o material difamatório; (ii) demonstração do consentimento — prévio, concomitante ou sucessivo — com a veiculação em seu perfil; (iii) demonstração de que o réu tinha conhecimento do conteúdo fraudulento da postagem (animus injuriandi, caluniandi ou diffamandi).

A divulgação do conteúdo fraudado constitui etapa da execução do crime, a estabelecer a autoria criminosa do divulgador, que não exclui a do programador visual ou do editor responsável pela execução material da fraude, quando promovidas por outros agentes em coautoria.

Na circunstância de um ajudante postar vídeo fraudulento veiculador de difamação, a COAUTORIA criminosa do titular do perfil somente é afastada se ele desconhecer o uso de sua página para a divulgação e, portanto, NÃO consentir com o emprego de sua plataforma em rede social para alavancar a campanha difamatória.

             Mas não seria apenas animus NARRANDI?

R: Capaz!

A divulgação por mero animus narrandi se caracteriza quando há desconhecimento da natureza fraudulenta.

Na espécie, o réu detinha todas as informações necessárias para conhecer o descompasso entre o discurso proferido e o divulgado no vídeo com ADULTERAÇÕES aptas a inverter o sentido da fala e conferir-lhe teor racista.

Igualmente INVEROSSÍMIL a arguição de que os cortes realizados tiveram finalidade exclusivamente técnica, com o objetivo de REDUZIR o vídeo ao tamanho limite do suporte de mídia utilizado. Se essa fosse unicamente a intenção, os cortes não teriam deturpado a fala do querelante. Outros trechos poderiam ter sido excluídos para atender ao propósito técnico.

             Acabou em PIZZA?

R: Mais ou menos…

Em sede de dosimetria, a Turma considerou presentes QUATRO circunstâncias judiciais negativas. Cominou reprimenda de um ano de detenção, no regime inicial aberto, cumulada com pena de multa. E ainda substituiu a pena privativa de liberdade por prestação pecuniária, na forma do art. 45, § 1º, do Código Penal, consistente no pagamento de trinta salários mínimos à vítima, fixado como montante mínimo para reparação dos danos causados pela infração.

             Divergência.

Vencido o ministro Marco Aurélio quanto à fixação de regime aberto para cumprimento inicial da reprimenda e à substituição da pena privativa de liberdade.

Segundo o ministro, o regime Aberto é RESERVADO a situações em que as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP são favoráveis ao acusado e o relator apontou haver QUATRO situações contrárias ao réu. Além disso, o ministro compreendeu que o inciso III do art. 44 do CP AFASTA, considerado o objetivo da norma, a possibilidade de, ante circunstâncias judiciais negativas, proceder-se à substituição da pena por restritiva de direitos.

             Resultado final.

A Primeira Turma julgou procedente pedido formulado em ação penal para condenar deputado federal pela prática do crime de difamação agravada.

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