R: Com base na simples disposição legal do Código Civil (art. 50), do Código de Defesa do Consumidor (art. 28), da Lei nº 9.605/98 (art. 4º) e da Lei nº 12.529/11 (art. 34), a desconsideração da personalidade jurídica é ato privativo do Poder Judiciário. Aliás, o Novo Código de Processo Civil a prevê como incidente (arts. 133/137).
Doutrina: “Em termos processuais, a desconsideração da pessoa jurídica é ato privativo do juiz, que também não age de ofício, dependendo da iniciativa da parte ou do MP quando lhe couber intervir no processo. A decisão fixará quais relações ou obrigações serão estendidas aos sócios ou administradores, de modo que a pessoa jurídica não se extingue, pois é apenas afastado o véu protetor para que os bens particulares daqueles respondam pelos atos abusivos ou fraudulentos.” (Nestor Duarte)
No entanto, como apontou o Ministro CELSO DE MELLO, diversos doutrinadores já defendem a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica no âmbito administrativo, sem atuação do Poder Judiciário:
Precedente: “Impõe-se registrar, por necessário, ainda que esta afirmação não envolva qualquer manifestação conclusiva sobre a presente controvérsia mandamental, que a possibilidade de aplicação da desconsideração da personalidade jurídica por órgãos administrativos, desde que utilizada como meio de coibir o abuso de direito e o desrespeito aos princípios que condicionam a atividade do Estado, tem sido reconhecida por autorizado magistério doutrinário (JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, “Manual de Direito Administrativo”, p 969, item n. 7.5, 25ª ed., 2012, Atlas; MARIANNA MONTE BELLO “Os Tribunais de Contas e a ‘Disregard Doctrine’”; FLAVIA ALBERTIN DE MORAES “A Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica e o Processo Administrativo Punitivo”, “in” RDA 252/45-55; SUZY ELIZABETH CAVALCANTEKOURY, “A Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica:aplicação no direito administrativo”; JESSÉ TORRES PEREIRA JUNIOR e MARINÊS RESTELATTO DOTTI, “A Desconsideração da Personalidade Jurídica em Face de Impedimentos para Participar de Licitações e Contratar com a Administração Pública: limites jurisprudenciais”; MARIANA ROCHA CORRÊA, “A Eficácia da Desconsideração Expansiva da Personalidade Jurídica no Sistema Jurídico Brasileiro”, 2011, EMERJ, v.g.) (…).” (STF, MS 32494 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, julgado em 11/11/2013, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-224 DIVULG 12/11/2013 PUBLIC 13/11/2013)
Nesse ponto, destaco MARÇAL JUSTEN FILHO:
Doutrina: “6) Desconsideração da pessoa jurídica. (…) Nada impede sua aplicação no âmbito do Direito Administrativo, desde que adotadas as cautelas cabíveis e adequadas. Não se admite que se pretenda ignorar a barreira da personalidade jurídica sempre que tal se revele inconveniente para a Administração. A desconsideração da personalidade societária pressupõe a utilização ilegal, abusiva e contrária às boas práticas da vida empresarial. E a desconsideração deve ser precedida de processo administrativo específico em que sejam assegurados a ampla defesa e o contraditório a todos os interessados.” (Marçal Justen Filho)
Ademais, já há um precedente nesse sentido no Colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
Precedente: “ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. SANÇÃO DE INIDONEIDADE PARA LICITAR. EXTENSÃO DE EFEITOS À SOCIEDADE COM O MESMO OBJETO SOCIAL, MESMOS SÓCIOS E MESMO ENDEREÇO. FRAUDE À LEI E ABUSO DE FORMA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA E DA INDISPONIBILIDADE DOS INTERESSES PÚBLICOS. – A constituição de nova sociedade, com o mesmo objeto social, com os mesmos sócios e com o mesmo endereço, em substituição a outra declarada inidônea para licitar com a Administração Pública Estadual, com o objetivo de burlar à aplicação da sanção administrativa, constitui abuso de forma e fraude à Lei de Licitações Lei n.º 8.666/93, de modo a possibilitar a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica para estenderem-se os efeitos da sanção administrativa à nova sociedade constituída. – A Administração Pública pode, em observância ao princípio da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos tutelados, desconsiderar a personalidade jurídica de sociedade constituída com abuso de forma e fraude à lei, desde que facultado ao administrado o contraditório e a ampla defesa em processo administrativo regular. – Recurso a que se nega provimento.” (STJ, RMS 15.166/BA, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/08/2003, DJ 08/09/2003).
No entanto, como bem apontado pelo leitor Helvecio Vieira, o art. 14 da Lei nº 12.846/13 autoriza a desconsideração no âmbito do processo administrativo:
Legislação: “Art. 14 da Lei nº 12.846/13.A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar confusão patrimonial, sendo estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de administração, observados o contraditório e a ampla defesa.”
A referida possibilidade, no entanto, não é imune de críticas como aponta SÉRGIO CAMPINHO:
Doutrina: “Por fim, o art. 14 da Lei n. 12.846/2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública nacional ou estrangeira, não foi bem nos conceitos, erigindo a prática de atos ilícitos (imputação direta) como autorizadora da desconsideração. Incorreu, assim, no mesmo defeito do caput do art. 28 da Lei n. 8.078/90 e do caput do art. 34 da Lei n. 12.529/2011. Não fora isso, a regra traduz lamentável equívoco: autoriza a desconsideração por autoridade administrativa, fora, portanto, do âmbito do Poder Judiciário. Tem-se, portanto, um notório conflito de interesse do Estado Administrativo sancionador, que não teria a necessária imparcialidade do Estado-Juiz.” (SÉRGIO CAMPINHO)
EM RESUMO:
(a) com base na disposição legal do Código Civil (art. 50), do Código de Defesa do Consumidor (art. 28), da Lei nº 9.605/98 (art. 4º) e da Lei nº 12.529/11 (art. 34), não é possível a desconsideração da personalidade jurídica extrajudicialmente; (b) no entanto, grande parte da doutrina do Direito Administrativo sempre a defendeu; (c) há inclusive um precedente antigo do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA que aceitou a desconsideração da personalidade jurídica promovida pela Administração Pública; (d) e, a partir da Lei 12.846/13, há previsão legal expressa autorizando a desconsideração da personalidade jurídica no campo do processo administrativo.
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Parabéns pela magistral aula!
Objetiva, profunda e esclarecedora.
Bom dia ! Gostei do artigo!
Quero saber quando vc fez parte do conselho de uma grande construtora só para ela se transformou-se em s/a ,não assinou outras atas que não a de saída que se deu em junho de 2012 !
A empresa sofreu quebra em outubro de 2017 e eu está como sócia da imobiliária que era fora do grupo , porque fiquei de carteira assinada por quase dez anos e para ser REsp técnico tinha que ser sócio , sai de lá em 05/12/14 junto com meu marido que entrou para me ajudar em outubro de 2009 e saiu antes de mim é oficialmente também 05/02/14, vendemos nossas cotas para majoritária , que também não era sócia da construtora de quem nunca fomos acionistas ! Agora o Adm judicial sem provas qier nos colocar no polo passivo de desconsideração da personalidade jurídica alegando que nos vendíamos imóveis da construtora na planta , sendo que NUNCA vendemos nada , só alugávamos imóveis de terceiros e fazíamos seguro de incêndio ,mais nada ! Eu fiquei estarrecida ! Somos corretíssimos ! Saímos da administradora porque a sócia majoritária nos convidou porque queria colocar os filhos dela conosco ! Agora ser acusada finque não fizemos ? Fiquei triste eu com câncer de mama e meu marido de próstata , não temos mais família e minha filha tem apenas 13 anos ! O Adm da massa falida nem leu e colocou no incidente de desconsideração da personalidade 51 pessoas , sem provas ! O que faço com ele ? Ele espertamente colocou essa parte em segredo de justiça ,zonas
Não quero que envolvam nosso nome em coisas que nunca fizemos ,o administrador está sendo irresponsável e pior , disse que éramos acionistas indiretos da construtora ! Vontade de ir atrás dele e falar para ele aprender a ler e provar as besteiras ué ele falou , to mais doente de raiva , gastando o que não tenho ! Agora pagar advogado nem sei de onde tirar !