O petismo e as Falácias Argumentativas

Olá, tudo bem?

Talvez você já ouviu alguém dizendo (ou você já disse) coisas do tipo:

“Não entendo porque você critica tanto o PT. É como se no PSDB só tivesse santo…”

ou

“Os grampos no Lula foram claramente ilegais. O famoso jurista XXX disse isso claramente em uma entrevista na TV!”

O que essas frases tem em comum? Ambas são argumentos falhos, equivocados, viciados por terem incorrido no que chamamos de Falácias Argumentativas. Vamos conhecer algumas delas melhor? Espero que, com isso, você consiga identificá-las em suas discussões e evite cair em argumentos que apelam para emoções, palavras vagas e informações pouco relevantes para defender algum ponto de vista.

Antes que alguém pergunte: sim, todos os exemplos que eu vou usar neste artigo referem-se ao petismo. Poderia ter escolhido outro tipo de fanatismo, mas o fato é que, no momento atual, a defesa cega do PT é um fenômeno extremamente presente em todos os ambientes que nós convivemos.

Vamos retomar a seguinte frase:

“Não entendo porque você critica tanto o PT. É como se no PSDB só tivesse santo…”

Quero começar por esta pois este é o caso mais comum. Aqui o autor do argumento quer rebater pessoas que criticam o PT, e ele embasa sua argumentação no fato de que o PSDB não é formado por políticos 100% honestos. Qual é a falha argumentativa aqui? Estamos diante da falácia da Falsa Dicotomia, ou Falso Dilema. Esta falácia ocorre quando o interlocutor procura reduzir uma situação complexa, que possui múltiplos caminhos e soluções, a apenas duas possibilidades (neste caso, PT ou PSDB). Ora, o fato de alguém criticar o PT não implica que esta pessoa defenda o PSDB. Não exitem apenas “dois lados”, PT ou PSDB. Não significa também que esta pessoa acredite que Eduardo Cunha é um político idôneo, ou qualquer coisa do gênero. Reduzir a discussão a apenas duas opções é uma falha grave! Outra frase comum é algo como:

“Ora, você é a favor da democracia ou vai mesmo ficar defendendo o impeachment?”

Aqui temos novamente uma redução de um problema a duas alternativas (se você é a favor da democracia, você precisa ser contra o impeachment; já se você é favorável ao impeachment, logo necessariamente você é contrário à democracia). Mais um caso de falsa dicotomia, afinal é possível que uma pessoa seja favorável ao impeachment e, mesmo assim, defensora da democracia.

Continuando, veja agora esta frase que eu li em um blog petista nos últimos dias:

“Ao devolver o processo de Lula para Curitiba, o ministro Gilmar Mendes pode estar iniciando uma guerra civil.”

Qual é a falha deste argumento? Repare que o autor da frase pretende atribuir uma consequência (início de uma guerra civil) a uma determinada causa (o ministro ter devolvido o processo para Curitiba). Será que isto está correto? Aqui estamos diante de um caso clássico da falácia da Falsa Causa. É até possível que se inicie uma guerra civil nos próximos dias / semanas (espero que não!!!), mas atribuir a culpa desta tragédia à devolução do processo à primeira instância é um grande exagero – cometido muitas vezes propositalmente com vistas a iludir aquele leitor menos crítico. Ora, se uma guerra civil realmente se iniciar, os culpados serão aqueles diretamente envolvidos e os que incitaram a sua ocorrência, não aqueles que, agindo de acordo com o papel constitucional a eles designado, toma uma decisão (que pode, sim, ser questionada, e ser inclusive objeto de recurso ao plenário do STF). Quer ver mais um exemplo de falsa causa? Leia:

“Está vendo no que dá realizarem uma operação como essa Lava Jato? A Petrobrás e as grandes empreiteiras do país já precisaram demitir milhares de pessoas! Vá em Macaé e constate o quanto a economia da cidade foi abalada!”

Aqui o erro é atribuir culpa à investigação criminal pelos problemas financeiros que a Petrobrás e as empreiteiras vêm enfrentando e as consequências disso (como o desemprego). O autor de argumentos como este pretende iludir o interlocutor, fazendo-o crer que a solução é a suspensão / modificação no curso da operação Lava Jato, e não a correção dos desmandos e ingerências políticas na Petrobrás e na conduta das empreiteiras.

Vamos prosseguir? Veja este argumento abaixo, que também costumo ler nas redes sociais:

“Como você pode ser favorável ao impeachment? A manutenção da democracia é essencial para o nosso país. É só em um ambiente democrático que conseguimos nos expressar livremente, levantar novas ideias, fiscalizar os nossos governantes, fazer valer os nossos direitos…”

Aqui estamos diante da Falácia do Espantalho! Isso mesmo rs… Neste tipo de erro argumentativo, ao invés do autor do argumento refutar a posição defendida por uma pessoa, ele atribui uma OUTRA POSIÇÃO àquela pessoa (mais fácil de ser refutada) e então apresenta argumentos contrários a ela. Deixe-me explicar melhor. Neste exemplo acima, vemos que o argumento é dirigido a uma pessoa que é favorável ao impeachment. Ao invés de combater este ponto, apresentando argumentos contrários ao impeachment, o autor atribui uma outra posição ao seu ouvinte: o ouvinte é tratado como alguém que é contrário à democracia. E, obviamente, é muito mais fácil defender a importância da democracia do que apresentar razões que invalidem a tese do impeachment. Ficou claro agora como funciona a Falácia do Espantalho? Fique esperto, ela é muito mais comum do que parece!

Veja ainda esta frase, outra coisa muito dita por aí:

“Não faz sentido você querer tirar o PT do poder. Você prefere que o nosso país seja governado por um representante da elite capitalista neoliberal?”

Aqui estamos diante de uma coisa chamada Apelo Popular. Por quê “apelo”? Porque este tipo de argumento busca apelar para a emoção das pessoas, pois uma vez que a emoção nos domina é normal que o nosso senso crítico fique prejudicado. Neste tipo específico (Apelo Popular), o autor busca usar termos vagos (“elite capitalista neoliberal”), que não necessariamente se referem a coisas ruins, mas que possuem conotação negativa para boa parte das pessoas em nossa sociedade. Em uma análise mais racional, ser governado por alguém da “elite” não é necessariamente ruim. O mesmo vale para a expressão completa (“elite capitalista neoliberal”). O mero fato de um futuro líder ser oriundo deste “grupo” não é ruim. E, mais do que isso, a maioria das pessoas sequer consegue precisar o que seria um membro da “elite capitalista neoliberal”. Mas o fato é que este termo “soa mal” para muita gente, e faz com que as pessoas “comprem” a ideia de que não deve ser bom ser governado por alguém da elite capitalista neoliberal – e, portanto, talvez seja melhor deixar o governo como está mesmo.

Voltemos agora a esta frase:

“Os grampos no Lula foram claramente ilegais. O famoso jurista XXX disse isso claramente em uma entrevista na TV!”

Aqui temos o chamado Argumento de Autoridade, ou Apelo à Autoridade. Ao invés do interlocutor apresentar motivos reais e objetivos para defender que os grampos são ilegais, ele prefere simplesmente citar alguma “autoridade” no assunto, sem sequer apresentar as razões pelas quais aquela autoridade defende tal posicionamento. Neste exemplo temos a citação de um jurista, mas muitas vezes a “autoridade” não tem reputação maior que um leigo qualquer sobre o tema – já vi pessoas citando um colunista da Folha de São Paulo, cantores da Música Popular Brasileira, e coisas do gênero…

Aproveitando, temos um tipo de falácia que é o contrário desta acima. Trata-se do Apelo contra o homem, ou Apelo Ad Hominemcomo este caso abaixo:

“As decisões do Moro na operação Lava Jato são claramente equivocadas. Trata-se apenas de um juiz de primeira instância se sentindo no direito de julgar um ex-presidente da república! E mais, o pai dele foi um dos fundadores do PSDB no Paraná!”

Veja que o autor do argumento pretende defender que as decisões do juiz são equivocadas, mas ao invés de usar argumentos jurídicos para apoiar este ponto de vista, ele prefere atacar a reputação do juiz, tentando reduzi-lo a apenas um “juiz de primeira instância” e citando ainda uma informação sobre o pai dele, novamente com objetivo de desvirtuar a discussão, fugindo do mérito…

Para finalizar, você já ouviu falar da Falácia do escocês de verdade? Para compreendê-la bem, veja se você nunca presenciou um diálogo assim:

Petista: essas manifestações pelo impeachment são uma vergonha. Só tem gente da elite batendo panela!

Você: ora, mas eu estava na manifestação e estou longe de ser “elite”, ganho apenas um salário mínimo para sustentar toda minha família. 

Petista: ah, mas você não é um verdadeiro representante das pessoas que estavam nas ruas… 

Percebeu o que aconteceu? O petista fez uma afirmação sobre um grupo (manifestantes são da elite), você apresentou um contra-exemplo (manifestante que não é da elite), e então o petista usa um critério arbitrário para simplesmente excluir você daquele grupo (“você não é um verdadeiro representante…”). Sim, ele te excluiu do grupo com base em algum critério “da cabeça dele”, pois ele já está previamente convencido de que todos os manifestantes são da elite. E se você apresentar outros contra-exemplos (um desempregado, um empregado doméstico etc.), pode ser que ainda assim o petista ainda encontre formas de excluir aquelas pessoas do grupo (“veja bem, esse desempregado só devia estar lá porque…”). Por motivos óbvios, esta falácia também é conhecida como Expulsão do grupo.

E aí, conseguiu compreender essas 7 falhas argumentativas? Espero que sim. E espero que você passe a observá-las no seu dia-a-dia de agora em diante. Verá que elas são muito mais comuns do que parece! Da próxima vez que ouvir uma, que tal rebater explicitando qual a falácia incorrida pelo seu interlocutor? Acho que ele não vai gostar rs…

Vale dizer que este tema (“falácias argumentativas”) faz parte da Lógica de Argumentação, mais precisamente do ramo da Argumentação Indutiva, Raciocínio Crítico ou Raciocínio Analítico, tema cobrado nas últimas provas do ICMS/SP, TCU e FUNPRESP! Sim, as falácias são úteis no dia-a-dia, mas também têm sido cada vez mais presentes nas provas de concursos!

Coordenação

Ver comentários

  • Oi Arthur, vejo falhas argumentativas dos dois lados.

    Mas o pior pra mim são as pessoas julgando o Lula que é apenas um investigado. Julgam sem ler os depoimentos pra PF, sem ouvir a íntegra de todos os grampos (que da mais de 1h) ficam apenas pegando informações recortadas da grande mídia. Todos sabemos que algumas vezes juízos de primeira instância mesmo com páginas e páginas de processo erram no julgamento, havendo decisões diferentes em outras instâncias.

    O que diria então o grande público julgando com informações de Facebook, jornais e revistas? E a mídia que 10min depois de lançados os grampos já sugeriram o pior viés mesmo tendo duas interpretações.

    Espero que o pessoal do Direito concorde comigo de não defender ou acusar alguém a essa altura do campeonato.

  • Olá, professor Arthur.

    Adorei seu artigo. Exemplos contemporâneos são ainda mais eficazes para fixar os conceitos explanados sobre a matéria. Estou terminando seu curso de Raciocínio Lógico, e pela primeira vez, estou compreendendo esta matéria, que pra mim deixou de ser um bicho de sete cabeças.

    Embora não concorde com o Golpe de Estado que está sendo instaurado em nosso País, muito obrigado pelo texto.

    Um abraço. E não vai ter golpe...rsrsrsrsrs....

  • Muito bom, professor.
    Este artigo está irretocável!!! Tenho percebido mesmo uma falha de raciocínio lógico muito grave em quem defende o PT.
    Obrigada.

  • Gostei muito do seu artigo, Prof. Arthur, principalmente a Falácia do Espantalho (impeachment X democracia). Deve-se ressaltar ainda que o impeachment é um instrumento da democracia e ao optar pelo impeachment, exercer este instrumento, estamos exercendo também a DEMOCRACIA.

    Abraço.

  • Meus queridos, bom dia!

    Acredito que o site deva seguir focando na formação para concursos, pois, está "declaradamente" tomando um lado, só falta colocar um tucano ao lado coruja.
    Análise política eu faço de outras formas, meios, não é através da opinião de meia dúzia de ex-militar, que irão formar a minha opinião, tampouco mudá-la. A seletividade da indignação tá deixando vocês cegos!

    Foquem nos cursos, que estes sim, são excelentes.

    Abraço!

  • Olá professor Artur,
    Acho que no momento em que discussões políticas se transformam em conflitos de ambos os lados. Quando pessoas entram em choque-cheias de paixões- simplificando grosseiramente o cenário político atual, como se o Brasil estivesse dividido entre petistas e oposicionistas, o grupo A ou grupo B, brasileiros que se vestem de verde e amarelo e outros que se vestem de vermelho, afirmando que quem é de esquerda é comunista e quem é de direita é fascista, criando caricaturas e rótulos. Tudo isso nos faz pensar que não é razoável incendiar o debate, colocar pessoas em confronto, criar uma convulsão social. A história do Brasil nos mostra que em todos os momentos de crise a radicalização nunca foi o melhor caminho, pelo contrário, apenas serviu àqueles que queriam desestabilizar as instituições e politizarem a justiça para, no fundo, se blindarem e se protegerem do verdadeiro ideal de justiça. Acho que a instituições devem ser preservadas e não se contaminarem com a política. Pois, em momentos como esse, confuso, complexo e cheio de falácias de ambos os lados, é que esperamos que o Poder Judiciário seja sólido e independente. Quando vejo juízes federais se posicionando politicamente, fazendo ativismo dentro do judiciário, isso é muito grave. Não podemos fazer proselitismo político no Ministério público ou no Poder Judiciário. Devemos deixá-los exercer o seu papel constitucional, que sabemos e estudamos tanto aqui no estratégia. Como diria Rui Barbosa: "a pior a ditadura é a do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer".

  • Parabéns pelo artigo.
    ao Amigo Marcelo. a economia fala por si só. esse modelo político falhou. e os próprios petistas serão mais castigados..

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