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Imposto de Renda: Doutrina e Conceitos de Jurisprudência – Parte 3

Considerações Gerais

A ideia deste artigo é demonstrar o imposto de renda e como a jurisprudência tem aperfeiçoado a identificação de suas características. Aqui serão tratados casos que não compõem a jurisprudência sumulada. A diferença é que são casos em que são apresentadas algumas teses, conceitos, mas que ou não refletem muita judicialização (não há muitas ações sobre a mesma temática) ou ainda não refletem a visão das cortes superiores como um todo.

Sobre o Imposto de Renda, as normas gerais que o regem são a lei n. 5172/1966 – o Código Tributário Nacional (CTN), e a Constituição Federal de 1988 (CF/88). Conforme se verifica neste tipo de jurisprudência, a maior parte dos casos trata de incidências ou de isenções.

Como a economia nos últimos foi sendo gradativamente dinamizada, incorporando modalidades cada vez mais novas de incidência, surgiu uma miríade de situações não antes previstas, inclusive sendo potencializadas pelo advento da globalização.

O Imposto de Renda possui uma ampla incidência e sofre muitos questionamentos judiciais, que são fonte de farta jurisprudência

Jurisprudência do Imposto de Renda sobre bases de cálculo do STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) possui alguns casos no assunto incidência. O mais antigo deles existente é o artigo 74 da Medida Provisória MP n. 2158-35/2001, que previa que os lucros das empresas controladas e coligadas seriam considerados disponibilizados ainda no exercício de 2001. O problema avaliado pelo STF é que há uma diferença entre tratamento de lucros de empresas controladas (onde todo o resultado pertence à controladora) e coligadas (onde o resultado é no percentual da participação da sociedade investidora, que ainda possibilita deduções por outras operações que reduzem ou retardam a apuração do lucro – como por exemplo, venda de estoques da coligada para a investidora).

O Supremo, nesta jurisprudência, considerou a disposição da Medida Provisória uma retroatividade na apuração do Imposto de Renda (pois previa a tributação já no exercício de 2001), sendo o artigo que previa este tratamento inconstitucional.

Em jurisprudência posterior, o colegiado do tribunal constitucional viu-se na análise de um pleito de dedução da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) da base de cálculo do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas. A alegação era a de que o montante da CSLL não seria resultado, compondo um tributo, sendo que o resultado da base de cálculo estaria desta forma “poluído” com um tributo. O Supremo rechaçou esta tese, pois essa vedação vale somente para impostosnão sendo proibido, portanto, nesta jurisprudência, que a base de cálculo do Imposto de Renda seja composta com a presença de um outro tributo.

Houve outro julgado sobre uma outra lei do Imposto de Renda, a lei n. 7713/1988. Esta lei (que somente valeu para este exercício) previa a incidência do imposto no regime de caixa (não competência) e em alíquotas maiores (aplicando a progressividade) para rendimentos recebidos de uma só vez. O tribunal constitucional avaliou que, na forma prevista na lei, aqueles que recebessem indenizações trabalhistas ou benefícios previdenciários (o que às vezes acontece de uma vez só) seriam duplamente punidos. Desta forma, o artigo que preceituava esta cobrança foi declarado inconstitucional. O entendimento do STF, inclusive sobre esta incidência, é que ela deveria ser em regime de competência (quando os fatos deveriam ter ocorrido), mas não sobre caixa (quando o pagamento aconteceu) – tudo isso no sentido de não prejudicar ainda mais os contribuintes prejudicados com o atraso dos pagamentos.

Os Rendimentos Recebidos Acumuladamente (RRA) eram tributados de uma vez só – mas a jurisprudência mudou esse entendimento

Jurisprudência do Imposto de Renda sobre Princípios Tributários do STF

Houve uma questão também relacionada à aplicação da lei n. 7988/1989, que aumentava a alíquota sobre o lucro oriundo de operações incentivadas ocorridas no passado, ainda que no mesmo exercício. Referente a estas operações, a legislação então vigente já havia conferido tratamento fiscal destacado e mais favorável, com a finalidade de promover o aumento de sua exportação. A clara função extrafiscal das operações incentivadas de exportação afastou a aplicação da Súmula STF-584: “Ao Imposto de Renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no exercício financeiro em que deve ser apresentada a declaração.”

É uma súmula no mínimo polêmica, pois dá a entender que o Imposto de Renda poderia ter uma retroatividade – ferindo assim o princípio da irretroatividade. Foi cancelada em 2021.

A Súmula STF-584 permitia situações que constituem violação ao princípio da anterioridade. Foi cancelada em 2021.

Uma última jurisprudência do Supremo sobre o Imposto de Renda diz respeito a uma contestação dos Municípios sobre concessões de incentivos fiscais relacionados ao IR e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que impactavam a composição do Fundo Participação dos Municípios (FPM). A CF/88 trata da formação do FPM com 22,5% da arrecadação tanto do IR quanto do IPI. A tese exposta pelos Municípios alegava que, se a União concede incentivos fiscais pelos dois impostos, ela arrecada menos, diminuindo o quantum tributário a ser dividido, com isso prejudicando os municípios no que eles possuem direito de receber.

O STF rechaçou as alegações dos Municípios, entendendo serem constitucionais essas concessões, pois é corolário do princípio da competência da União dispor de seus impostos, ainda que isso diminua o “bolo tributário” – desde que se mantenham as proporções nos termos constitucionais.

Jurisprudência do Imposto de Renda sobre bases de cálculo do STJ

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui, por sua vez, mais julgados do que o STF. O tribunal da cidadania já estabeleceu em jurisprudência que incide Imposto de Renda sobre juros moratórios decorrentes de benefícios previdenciários pagos em atraso. O STJ, em outra jurisprudência sobre Imposto de Renda já entendeu que é possível a dedução de despesas médicas feitas pelo contribuinte com profissional de saúde, mesmo que ele não seja regularmente inscrito no seu respectivo conselho profissional – aduzindo que mais importante é a essência da prestação do serviço médico, em detrimento da forma.

De forma análoga ao STF, o STJ também emitiu o mesmo entendimento em jurisprudência sobre verbas retroativas recebidas acumuladamente (RRA) o entendimento de que deve ser tributado pelo Imposto de Renda em regime de competência e não pelo montante global recebido de uma vez .

Outra questão foi trazida para a jurisprudência do Imposto de Renda pelo STJ. Em um acordo coletivo de trabalho entre uma empresa e seus funcionários, no qual foi ajustada a constituição de um fundo de aposentadoria e pensão e – alternativamente – o pagamento de determinado valor diretamente ao funcionário com esta finalidade, a empresa passou a pagar, posteriormente, aos próprios funcionários a importância que deveria ser destinada ao fundo.

A empresa era a responsável tributária da retenção do IR. Mesmo tendo por equívoco deixado de reter a importância, ainda tendo expedido comprovante de rendimentos que informava a importância como rendimento isento e não tributável, o sujeito passivo deverá arcar com o IR devido e não recolhido. Nesta situação, como a empresa induziu seus empregados declarantes do Imposto de Renda a preencherem com erro suas declarações, não são os empregados os responsáveis por recolher o Imposto de Renda, nesta jurisprudência, mas, sim, a própria empresa.

Outra ação tratava da incidência sobre a correção monetária do valor do IR e verbas recebidas acumuladamente em ações trabalhistas. O critério utilizado para esta atualização é o Fator de Atualização e Conversão de Débitos Trabalhistas (FACDT). Outra questão foi a incidência sobre importâncias pagas a título de compensações sobre diminuição da capacidade laborativa oriundas de decisões judiciais: como estes valores se assemelham à figura dos lucros cessantes, a jurisprudência do STJ decidiu que sobre eles incide o Imposto de Renda.

Em outra decisão interessante sobre bases de cálculo, o STJ entendeu em mais uma jurisprudência sobre o Imposto de Renda que o crédito presumido do ICMS não compõe a base de cálculo do IR, nem da CSLL. O crédito presumido do ICMS não possui natureza de receita, sendo assim afastada a incidência destes dois tributos.

O Imposto de Renda, como já exposto neste artigo, comporta sucessivas atualizações sobre sua incidência. Uma delas é o entendimento de que a remuneração recebida por atletas profissionais a título de “direito de arena” sujeita-se à incidência do Imposto de Renda sobre as Pessoas Físicas (IRPF), nesta jurisprudência do STJ.

O Imposto de Renda incide inclusive sobre o “direito de arena” recebido por atletas profissionais.

Uma questão sobre construção civil foi também colocada sob análise do tribunal da cidadania. Existe um índice das imobiliárias, chamado Índice Nacional do Custo de Construção (INCC), que é aplicado na correção de contratos de compra e venda de imóveis na planta, quando o imóvel não está totalmente construído, e ainda não totalmente quitado. Este INCC então atualiza os contratos de financiamento, representando um acréscimo nas receitas operacionais das imobiliárias, incorporadoras, ou construtoras de imóveis. A RFB tributava estas receitas como receitas financeiras, e os contribuintes questionaram judicialmente, ao que, na jurisprudência do Imposto de Renda, o STJ entendeu o INCC como uma parte da receita operacional das imobiliárias – não cabendo à RFB tributar o INCC como se receita financeira fosse.

Jurisprudência do Imposto de Renda sobre isenções do STJ

Uma questão interessante também foi trazida sobre a parcela de 1/3 de férias gozadas, normalmente paga juntamente com as férias. Qual seria a natureza desta parcela? Remuneratória ou indenizatória? De acordo com a jurisprudência do tribunal de cidadania, esta verba tem natureza remuneratória, incidindo sobre ela o Imposto de Renda.

Houve também uma questão curiosa sobre o abono de permanência. Em jurisprudência anterior sobre este tema do Imposto de Renda, o guardião do direito objetivo federal tinha a visão de que não incidia o IR, até o ano de 2010, quando ocorreu uma mudança radical desse entendimento – que a partir daquele momento passou a ser a de que, sim, incide IR sobre o abono de permanência. Quando ocorrem viradas nos entendimentos, a preocupação dos tribunais superiores é garantir um mínimo de segurança jurídica. Com esse propósito, foi modulada a jurisprudência, de que incide Imposto de Renda sobre o abono de permanência, mas a partir de 2010.

Algumas isenções do Imposto de Renda são bastante específicas, às vezes sendo de difícil operacionalização no mundo real. Uma delas é a isenção de valores recebidos decorrentes da venda de imóveis do contribuinte no valor de até R$ 440.000,00 – e que deve ser totalmente utilizada na compra de outro imóvel no prazo de até 180 dias. E se o contribuinte comprou imóvel antes disso? Ele não pode utilizar o valor recebido nesta venda para quitar a dívida, sendo enquadrado nesta isenção? A Receita Federal do Brasil (RFB) entendia que não, mas em jurisprudência sobre o Imposto de Renda, o STJ entende que cabe a isenção, sim.

A isenção sobre vendas de imóveis de até R$ 440.000,00 é muito específica – mas o STJ compreendeu as dificuldades do contribuinte.

Jurisprudência do Imposto de Renda sobre isenções decorrentes de enfermidades do STJ

As 3 próximas jurisprudências do tribunal da cidadania tratam de casos sobre isenções do Imposto de Renda relacionadas a enfermidades. A primeira delas é sobre a isenção do Imposto de Renda a portadores de cardiopatias graves – que na lei do IR possuem isenção sobre rendimentos que receberem a título de pensão, aposentadoria ou reforma.

Esta isenção foi pensada pelo legislador como um tratamento diferenciado a pessoas que precisam de remédios em geral de preços elevados, em que as fontes de seus rendimentos são normalmente baixas, e que tornam muito difícil a aquisição de tais medicamentos. Entretanto, também é comum situações nas quais algumas pessoas em idade de aposentadoria continuam trabalhando, sem se aposentarem. E pleitearam judicialmente essa isonomia de tratamento, que foi negada pelo STJ. Então, para desfrutarem da isenção – devem estar aposentados.

Algumas isenções para moléstias graves combinam a existência da moléstia e o contribuinte ser aposentado.

Uma segunda jurisprudência sobre esse tema delicado do Imposto de Renda, foi sobre a incidência de IR sobre proventos recebidos de fundo de previdência privada a título de complementação de aposentadoria, nas enfermidades previstas na lei do IR – o que o tribunal da cidadania compreendeu que a isenção abrange também esses rendimentos.

A última jurisprudência do STJ sobre isenções do Imposto de Renda é relacionada aos portadores de visão monocular, sobre rendimentos provenientes de aposentadoria ou reforma, problema da saúde que era somente previsto para deficientes físicos em uma lista de previsões na lei do IR que previa cegueira total.Todavia, os portadores de visão monocular (visão de um dos olhos somente) alegavam uma limitação de suas capacidades tal que, se não eram inteiramente cegos – também não poderiam ser considerados sem nenhuma deficiência visual. O tribunal da cidadania, compreendendo as limitações que a perda de no mínimo 50% da capacidade de visão aos acometidos pela cegueira monocular, então estendeu aos portadores de visão monocular a isenção prevista aos portadores de cegueira integral.

Visão monocular não era considerada deficiência visual – até o STJ confirmar isso em jurisprudência.

Conclusões

Com este último artigo, se encerra a série de três artigos sobre o imposto federal de maior importância para a União – o Imposto de Renda. Como se pode notar, trata-se de um imposto que foi pensado como uma ferramenta para graduar a importância paga pelo contribuinte de acordo com seu acréscimo de riqueza. Mas de forma a atuar como um mecanismo de justiça fiscal, de forma a não impor um ônus excessivo.

Se assim fosse, os efeitos perniciosos do imposto seriam irreparáveis. Como conceber um imposto que retirasse a maior parte da riqueza de alguém? Como não mandar a mensagem errada, indicando que o melhor é “não ganhar”, ou, de outra forma, sonegar o imposto? Como construir patrimônio ou investir em um ambiente em que o Estado reduz sua população à pobreza?

Por esses motivos, o Imposto de Renda se desdobra em duas vertentes: o Imposto de Renda sobre as Pessoas Físicas (IRPF) e o Imposto de Renda sobre as Pessoas Jurídicas (IRPJ). Entendendo as peculiaridades dessa classificação, observa-se que o objetivo do imposto continua sendo graduar as pessoas físicas em seu patrimônio – mas sem desconsiderar as despesas, os custos que estas pessoas incorreram para conseguir criar suas expressões de riqueza. O Imposto de Renda não pode ter caráter confiscatório – seja estático (quando o impacto é de uma vez só), ou dinâmico (quando reduz seus contribuintes à pobreza com suas sucessivas incidências).

No caso das empresas, não poderia haver a mesma graduação no IRPJ que existe no IRPF. Entidades como empresas buscam, sim, o lucro. Entretanto, seu papel na sociedade moderna é muito mais importante do que somente esta análise. Se o imposto fosse graduado como no caso das pessoas físicas, isso representaria um enorme empecilho para a atividade empresarial – necessária para criar empregos, possibilitar o desenvolvimento dos mercados, e que muitas vezes gera oportunidades não somente para empreendedores, mas também para desenvolver sociedades de investimento que muitas vezes contribuem com o desenvolvimento dos mercados globais.

Ricardo Pereira de Oliveira

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Até mais!!

Ricardo Pereira de Oliveira

Formado em Administração de Empresas pelo Mackenzie, pós-graduado em Marketing pela ESPM. Concurseiro desde 2014. Auditor Fiscal da Receita Municipal de Campo Grande/MS Ex-Fiscal de Rendas de Taboão da Serra/SP

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