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Emendas Constitucionais: entenda como são produzidas

Dando sequência à série de artigos que visa democratizar o conhecimento sobre o Processo Legislativo Constitucional, continuaremos o estudo sobre o funcionamento da produção das Leis no país. Hoje, avançaremos no detalhamento dos Procedimentos Legislativos Especiais, tratando especificamente do procedimento de criação das Emendas Constitucionais.   

Procedimentos Legislativos Especiais  

No artigo Processo Legislativo Constitucional: como as Leis são produzidas, aprendemos que o objeto do Processo Legislativo é a produção dos atos normativos primários. Cada espécie normativa tem uma razão de ser, bem como um regramento diferente para sua produção e tramitação nas Casas Legislativas.  

Naquela oportunidade, foi dado um panorama sobre a configuração do Processo Legislativo, com enfoque no Procedimento Legislativo Comum, que rege a produção das Leis Ordinárias e Leis Complementares. Esse procedimento serve de base para a compreensão dos Procedimentos Legislativos Especiais, sendo recomendada a leitura do artigo, que está disponível neste link.  

Seguimos para o detalhamento dos Procedimentos Legislativos Especiais, que são cinco, e coincidem com o ato normativo que será produzido. São eles as Medidas Provisórias, as Emendas Constitucionais, as Leis Delegadas, as Resoluções e os Decretos Legislativos. No segundo artigo da série, foi explicado como as Medidas Provisórias são produzidas. Hoje esmiuçaremos o procedimento de criação de uma Emenda Constitucional. 

Emendas Constitucionais (ECs) 

A Emenda Constitucional é a forma prevista no art. 60 da Constituição Federal de 1988 para alteração de dispositivos do texto constitucionalTendo em vista que a Constituição brasileira é classificada como rígida, o procedimento para sua reforma tem regras mais complexas e laboriosas, se comparado ao procedimento de criação e alteração das demais espécies normativas. 

Vamos entender melhor esse procedimento! 

1- Fase introdutória/iniciativa  

A) Iniciativa:  

Há um rol taxativo e restrito de legitimados que podem realizar a apresentação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) ao Congresso Nacional, quais sejam: 

i) Um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; 

ii) Presidente da República;  

iii) Mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. 

Como se pode perceber, um membro do Congresso Nacional não pode, sozinho, apresentar uma PEC. Além disso, importante destacar que não há a possibilidade de iniciativa popular para a propositura de Emendas Constitucionais. 

B) Limitações:   

Circunstanciais: 

A Constituição estabelece que, em certos momentos de instabilidade política e institucional, o texto constitucional não poderá ser modificado. A ideia dessa limitação é impedir que a alteração de dispositivos da Lei Maior ocorra em um momento de crise. Essa limitação é imposta quando houver decretação de: 

i) Estado de sítio; 

ii) Estado de defesa; 

iii) Intervenção federal (decretada e executada pela União). 

Estando presente alguma dessas situações excepcionais, pode ocorrer toda a tramitação de uma PEC, ou seja, ela pode ser apresentada, discutida, votada e até aprovada. O único impedimento é que ela seja promulgada, porque a promulgação é o ato solene que atesta a existência da Emenda Constitucional no mundo jurídico. 

Materiais:  

A Constituição estabelece algumas matérias que não poderão ser abolidas do seu texto por meio de Emenda Constitucional. O legislador constituinte originário estabeleceu um núcleo essencial que não pode ser suprimido por ação do poder constituinte derivado, como forma de preservar os pontos estruturais da Constituição.

Essas limitações são as chamadas cláusulas pétreas, que estão dispostas no art. 60, 4º da Constituição Federal. São elas: 

i) A forma federativa de estado; 

ii) O voto secreto, direto e universal; 

iii) A separação dos poderes; 

iv) Os direitos e garantias individuais. 

Obs.: Limitações implícitas:

Além das cláusulas pétreas, que estão explicitamente elencadas na Constituição, existem outros limites materiais ao poder de reforma do texto constitucional. São as chamadas limitações implícitas, que decorrem da própria lógica sistêmica da Constituição Federal. São elas:

i) A titularidade do poder constituinte originário: o poder de elaborar uma nova Constituição, que pertence ao povo; 

ii) A titularidade do poder constituinte derivado: o poder de reformar a Constituição, que pertence ao Congresso Nacional (representante do povo); 

iii) O próprio procedimento de reforma constitucional: os limites circunstancias, materiais e procedimentais para a reforma da Constituição. 

Qualquer Proposta de Emenda tendente a abolir cláusula pétrea não pode sequer ser objeto de deliberação no Congresso Nacional, ou seja, não pode ser apresentado, discutido ou votado. Isso porque, nesse caso, o próprio Processo Legislativo representa desrespeito à Constituição Federal. 

2- Fase constitutiva   

A) Ausência de Casa Revisora 

Não há previsão na Constituição de Casa Iniciadora obrigatória para a apresentação de uma PEC. A tramitação de proposta de Emenda à Constituição pode ter início tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado Federal.  

A definição da Casa Iniciadora não tem nenhuma relevância na tramitação de uma PEC porque não há Casa Revisora. Isso ocorre porque a segunda Casa legislativa pela qual a PEC passa, não revisa o texto aprovado pela Casa Iniciadora, mas o aprecia como novo, podendo alterá-lo livremente.  

Em caso de alterações substanciais na segunda Casa, o texto retorna à primeira Casa para que ela faça sua apreciação integral, podendo, igualmente, modificá-lo livremente. A PEC vai de uma Casa para outra até que o mesmo texto seja aprovado por ambas as Casas. 

Isso é diferente do que ocorre no Procedimento Comum. Nele, uma vez que o Projeto de Lei sofre Emendas Parlamentares na Casa Revisora, o que volta para a apreciação da Casa Iniciadora são apenas as Emendas, e não o texto todo. Além disso, o procedimento acaba quando a Casa Iniciadora decide pela manutenção ou não das Emendas, não havendo nova apreciação a ser feita pela Casa Revisora. 

Se a PEC se iniciou na Câmara dos Deputados por exemplo, e não houve alteração substancial do seu texto pelo Senado Federal, ela não precisa voltar à Casa Iniciadora. 

B) Deliberação (discussão e votação) da EC: 

Comissões 

Se for apresentada na Câmara dos Deputados, a PEC será submetida à apreciação de duas Comissões, quais sejam:  

  • Comissão de Constituição e Justiça (CCJ): comissão permanente encarregada de avaliar aspectos referentes à admissibilidade constitucional da PEC.    
  • Comissão especial: formada para analisar aspectos relacionados à matéria de que trata a PEC. 

Plenário 

A Proposta de Emenda Constitucional tramita pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em dois turnos de votação. Sendo assim, a PEC que inicia na Câmara, tem que ser nela discutida e votada duas vezes, com um intervalo (interstício) de, pelo menos, cinco sessões entre cada votação.

Depois de ser aprovada em dois turnos, a PEC segue para o Senado, onde a CCJ emite seu parecer. No Senado, ela deve, igualmente, ser discutida e votada em dois turnos. 

O quórum para sua aprovação é o maior entre todos os procedimentos legislativos. É necessário o voto de três quintos dos membros de ambas as Casas (Senado Federal e Câmara dos Deputados), nos dois turnos de votação. 

Sendo assim, uma PEC será votada, no mínimo, quatro vezes, duas em cada Casa. Havendo alteração no projeto, todo o processo é repetido na outra Casa Legislativa, até que haja uma convergência no texto aprovado por ambas as Casas. 

C) Ausência de manifestação do Chefe do Executivo:  

Diferentemente do que ocorre no Procedimento Legislativo Comum, a Proposta de Emenda à Constituição não se submete a sanção ou veto do Chefe do Poder Executivo.  

O Presidente da República não exerce nenhuma interferência no procedimento de criação de uma Emenda Constitucional, dispondo de competência apenas para a sua iniciativa. Isso se justifica porque a alteração da Constituição representa o exercício do poder constituinte reformador, que pertence exclusivamente Congresso Nacional, como manifestação última da vontade do povo. 

3 – Fase complementar   

Promulgação da Emenda Constitucional:   

Pelos mesmos motivos que uma PEC não se submete à concordância do Presidente da República, este também não dispõe de competência para promulgação Emendas Constitucionais. A promulgação da EC é feita pelas Mesas da Câmara e do Senado, em sessão do Congresso Nacional, com o respectivo número de ordem. 

Princípio da Irrepetibilidade Absoluta:  

Uma Emenda Constitucional rejeitada ou havida por prejudicada pela Câmara ou pelo Senado, será arquivada e a matéria de que ela se trata não poderá ser objeto de nova Emenda Constitucional na mesma sessão legislativa.   

A sessão legislativa é o período de um ano de trabalhos parlamentares, que vai de 2 de fevereiro a 22 de dezembro.   

Esse princípio é absoluto em se tratando de Emendas Constitucionais. Isso significa que, sob nenhuma circunstância (nem mesmo por proposta da maioria absoluta dos membros das Casas Legislativas), as ECs poderão ser reeditadas ou reapresentadas na mesma sessão legislativa em que foram rejeitadas.   

Outras especificidades do procedimento de criação das ECs 

Os requisitos estabelecidos para a reforma da Constituição Federal seguem o princípio da simetria, sendo de observância obrigatória pelos Estados-membros quando da reforma de suas Constituições Estaduais. 

Demais Procedimentos Legislativos Especiais  

O procedimento de criação de uma Media Provisória foi detalhado neste artigo. Os demais Procedimentos Especiais serão objeto de estudo em uma próxima oportunidade.  

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Veja os comentários
  • Bom dia! Das pesquisas que fiz, você é a única que fala que no PEC a segunda casa que o recebe não e chamada de revisora. Pode mencionar a fonte legal que tem esse entendimento
    Sonia Campos em 22/10/20 às 13:07
  • Oi Janete. A Lei Complementar, para a maioria dos autores, faz parte do Procedimento Legislativo Comum, porque seu trâmite é praticamente igual ao das Leis Ordinárias, com alteração apenas do quórum. A diferença na classificação não é tão importante quanto entender seu funcionamento. Para tanto, recomendo a leitura do primeiro artigo da série: https://www.estrategiaconcursos.com.br/blog/processo-legislativo-constitucional-como-as-leis-sao-produzidas/
    Ana Luiza Tibúrcio Guimarães em 11/08/20 às 20:26
  • Ótimo texto. Gostaria de saber onde a lei complementar entra, qual tipo de procedimento legislativo ela sofre, de acordo com a CESPE. Aqui ela não contempla o procedimento legislativo especial, porém vi em outros locais q sim. Favor tirar minha dúvida. Obrigada.
    Janete em 10/08/20 às 11:25